Com o título “O trabalho com direito “in natura”, eis artigo de Irapuan Diniz de Aguiar, advogado e professor.
Ao Delegado de Polícia de carreira, para o exercício de suas atribuições de autoridade policial consignadas no Código de Processo Penal e de várias outras leis, exige-se o diploma superior de bacharel em Direito e o concurso público de provas e títulos a exemplo do que ocorre com juízes, promotores de justiça, procuradores e defensores públicos, porque o Estado não poderia confiar a vida, a liberdade, a honra, o patrimônio e a segurança dos cidadãos a uma autoridade pública sem os conhecimentos jurídicos. Além disso, para o Delegado de Polícia, ainda é exigido um curso próprio de formação técnica e profissional na Academia de Polícia Civil, hoje AESP.
Seria uma experiência salutar para o Estado, se as demais autoridades públicas – de todos os Poderes -, para melhor avaliar o trabalho da Polícia Judiciária, diante da falha do policiamento preventivo, corressem uma escala de rodízio num plantão policial, noite e dia, sábado, domingo e feriados, por vezes presidindo um auto de prisão em flagrante em plena madrugada ou na noite de
Natal e de Ano Novo.
Na sistemática jurídica brasileira, uma vez praticada a infração penal, em regra, a autoridade policial começa a trabalhar com o Direito ‘in natura’, pois, não raramente, dispõe, só e tão somente, da notícia verbal do fato, e transforma tudo em atos formais, no Inquérito Policial. Esse procedimento, talvez por representar mais de 80% do conteúdo probatório do processo criminal, uma vez
que o restante compõe-se do contraditório e julgamento, parece estar sendo alvo, por vias diretas e indiretas, de intromissões externas de alguns membros de certas carreiras que, “sem sujar as mãos”, querem mandar no que não sabem executar, ao arrepio da Constituição e em prejuízo da sociedade. E, o que é pior, até mesmo algumas autoridades policiais, talvez desavisadas ou
desconhecedoras da importância jurídica do Inquérito Policial, parecem fazer coro ao inimigos da Polícia Judiciária.
Diante de tudo isto, uma verdade deve ser registrada: o delegado de polícia pode saber de tudo em sua área de atuação, mas, se não conhecer profundamente o Inquérito Policial, será uma autoridade policial incompleta, quando não seja quase inútil à Polícia Judiciária. Infelizmente, por descabido temor reverencial, há alguns poucos delegados de polícia que, silenciando sobre
o artigo 144, §4o, da CF, e os artigos 4o e seguintes do CPP, parecem abdicar da presidência do IPL, permitindo que integrantes de outros órgãos dirijam as investigações do procedimento sob apuração na Delegacia ou na equipe de plantão.
Se algum Delegado de Polícia não acredita na sua instituição e no principal procedimento formal dos atos de polícia judiciária – o Inquérito Policial – até augurando o seu fim e o da própria autoridade policial, por que continuar na polícia, aspirando a promoções, inclusive pretendendo dirigir a instituição policial civil?
Tendo por base que a própria Universidade ainda não estuda a polícia e o seus atos, de modo assentado, é de se desconfiar daqueles “juristas” que, por ignorância ou qualquer outro motivo inconfessável, proponham o fim do inquérito policial, sem estudar, em profundidade, o seu verdadeiro papel.
*Irapun Diniz de Aguiar
Advogado e professor.