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“Dunas da Sabiaguaba: mais um desmonte da Prefeitura”

Rafadel Tomyama é ambientalista. Foto: Arquivo Pessoal

Com o título “Dunas da Sabiaguaba: mais um desmonte da Prefeitura”, eis artigo de Rafael Tomyama, membro titular, representando a Fundação Cultural Educacional Popular em Defesa do Meio Ambiente (Cepema), no Conselho das Unidades de Conservação da Sabiaguaba, em Fortaleza.

Confira:

É véspera de mais uma reunião do Conselho das Unidades de Conservação (UC) da Sabiaguaba que não vai acontecer. A terceira consecutiva.

A exemplo das duas anteriores, as que deveriam ter ocorrido em agosto e outubro – esta última marcada entre o primeiro e o segundo turno da eleição – a reunião que seria amanhã, sequer foi convocada. Tampouco houve qualquer comunicado ou explicação da Secretaria do Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma) sobre as suas não convocações.

O esvaziamento do Conselho reflete não só o abandono da pasta no final de gestão, mas o ocaso da política ambiental de mais de uma década de desconstrução pela prefeitura de
Fortaleza.

Este é, portanto, mais um entre outros tantos descasos que padecemos na cidade, destacados ultimamente pela imprensa, que afetam a saúde e qualidade de vida do povo fortalezense.

Mas qual a importância de uma reunião, diante de um mar de problemas que estamos atravessando? Talvez nenhuma. Ou talvez toda.

O Conselho tem funcionamento definido em regulamento por decreto e estabelece um calendário de reuniões bimensais no início de cada ano, proposto pelo próprio órgão ambiental da cidade.

As reuniões têm sido virtuais desde a pandemia, apesar do nosso questionamento de porque não voltam a ser presenciais e, de preferência, na própria Sabiaguaba.

Conforme a previsão legal, o conselho de composição paritária é formado por metade de órgãos da própria prefeitura e a outra banda por representantes da sociedade, como: associações locais, entidades ambientais, universidades e empresas privadas.

Sua função é consultiva quanto à preservação do Parque das dunas (não-edificável) e deliberativa quanto a implantações físicas na Área de Proteção Ambiental (Apa) ao redor, que é de uso sustentável. Ou seja, tem restrições construtivas legais para amortecer os impactos na zona de proteção integral (Parque).

Quando há algum "assunto de interesse" da prefeitura em pauta, notadamente licenciamentos de obras públicas ou privadas na região, há um “esforço” redobrado para se obter o quórum e a “bancada da gestão” vota praticamente em bloco para aprovar o que possivelmente desejaria impor automaticamente.

Assim, a atuação patrimonialista (apropriada pelo privado) da administração pública (que significa: “todos”) converte a instância num lobby ou intermediário dos interesses imobiliários nos arredores, aprovados “a toque de caixa”, desconsiderando visitas in loco e atropelando usualmente os argumentos técnicos ponderados por conselheiros(as) das instituições presentes, quanto a impactos na biodiversidade e ecossistemas ou lacunas nos projetos apresentados.

E assim, o Conselho deixa de ser um canal da participação popular, por meio das representações das organizações sociais que têm atuação na área e são reconhecidas por notórios saberes, e passa a ser um mero validador de chancela do uso e ocupação indiscriminada do solo, águas, fluxos e paisagens, comprometendo os objetivos dos decretos originais da então prefeita Luizianne Lins (PT), ao resguardar os serviços ecossistêmicos e os
achados arqueológicos ali identificados.

A avidez do galope da carruagem devastadora só se refreia quando há uma maior repercussão social e política, como no caso do condomínio de luxo que fizeram aprovar em 2020. Depois da denúncia pública do desmatamento e privatização de uma área de 50 hectares de mata na Apa, acabaram desistindo. Por ora, pelo menos.

Tal caso guarda paralelo com o que aconteceu nas reuniões de fevereiro e junho (em abril não houve quórum), instada pela repercussão de matéria na imprensa sobre caminhões desmontando as dunas móveis no Parque, a Seuma teve que convocar – a contragosto – a Secretaria de Obras Públicas (Sop) do governo do estado, para explicar as frequentes retiradas de areia que, pasmem, insistem em cair sobre a pista da CE-010, construída no sopé da duna (no local onde nunca deveria ter sido implantada).

Mesmo assim, desta vez não houve resposta por parte dos órgãos à maioria dos questionamentos formalizados por escrito. Por exemplo, quanto ao licenciamento da extração da areia ou quanto ao descumprimento do acordo com o Ministério Público, relativo aos estudos de solução definitiva para evitar o desmonte do cordão de dunas.

Nem mesmo o grupo de trabalho formado para elaborar um Plano de Monitoramento das UCs parece ter chegado a termo de forma consistente, efetiva e sistemática, para além das ações pontuais de fiscalização a partir de denúncias de munícipes, que a prefeitura insiste em fantasiar como se fossem perenes.

Apesar da importância do assunto, e de outros que afetam as questões sócio-ambientais na Sabiaguaba, com impactos no entorno do Cocó e de toda cidade, a Secretaria desgovernada não considera oportuno concluir a última reunião do ano, por exemplo, apresentando um balanço da gestão quanto à preservação da área. Ou discutindo o lugar da Sabiaguaba no tal “Plano de Adaptação Climática”; que a então titular da pasta afirmou pela imprensa existir.

É tão insólita a situação que a governança climática em meio à emergência global é resumida a um plano desconhecido da população. Enquanto isso, o Plano Diretor e a legislação ambiental da capital seguem na toada da revogação de proteções, com iniciativas de matérias de lei permissivas oriundas do próprio Executivo, com a conivência cúmplice da Seuma.

Ao povo fortalezense só resta agora aguentar a passagem dos poucos dias que restam para o fim dessa (indi)gestão na prefeitura. Mesmo com a reduzida celebração do Réveillon, torcer para que venha uma nova administração, trazendo a boa nova de uma guinada nas prioridades da participação popular e da preservação do patrimônio ambiental de Fortaleza.

*Rafael Tomyama

Membro titular, representando a Fundação Cultural Educacional Popular em Defesa do Meio Ambiente (Cepema), no Conselho das Unidades de Conservação da
Sabiaguaba, em Fortaleza.

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