Com o título “Ano novo, vida nova!”, eis o artigo do historiador Affonso Taboza, sobre o sentimento de mudança para melhor. Mas nem sempre é assim… Confira:
Fim de ano é tempo de otimismo. Discreta onda de euforia invade o planeta a partir de meados de novembro, aumenta de amplitude nas primeiras semanas de dezembro e se torna avassaladora nos dias que precedem o Natal e o Ano Novo.
Profusão de luzes em árvores e fachadas, músicas natalinas envolventes, lojas decoradas com motivos festivos, tudo concorre pra montar o clima. No ar um quê de magia, uma aura de bem-estar. Sente-se gosto e cheiro de felicidade, como se a vida, daí pra frente tivesse fatalmente que mudar, deixando para trás transtornos e frustrações do tempo que passou. Uma quadra de bonança, onde é proibido falar de problemas e complicações. Negócios maiores são postergados até por empresários de postura austera, como se proibido fosse queimar neurônios e “esquentar” num tempo que foi feito pra curtir.
Natal, festa religiosa, e Ano Novo, festa profana, se irmanam. Uma humaniza as pessoas, desperta sentimentos de solidariedade, de fraternidade. A outra nos faz ver o futuro com as lentes do otimismo. O tilintar de taças envolvido pelo ruído festivo e pela beleza dos fogos fecham o período.
Razões pra tal comportamento coletivo? Não me arrisco a opinar. É ciência que não domino. No entanto, não custa arriscar um palpite, sob a forma de singela comparação.
Imaginem reação e sentimento de quem atravessa um deserto dia após dia, semana após semana, sol escaldante, areia frouxa e quente sob os pés, e de repente chega a um oásis. O frescor da água, a sombra das palmas e tamareiras, o vento ameno… A sensação de bem-estar é tal que o andarilho, se pudesse, ali se plantaria para sempre. Pois bem. Podemos comparar o deserto com o ano que fica para trás, de travessia sofrida, enervante, e as festas de fim de ano com o oásis. Tempo de retempero, de recarga de baterias. Tempo de cabeça fria.
Que as pessoas são influenciadas pela fantasia, não há dúvida. Que são movidas por forte comportamento de manada, é inquestionável. Isso, porém, não invalida o resultado: a sensação de bem-estar coletivo. As festas de fim de ano têm valor inestimável para a estabilidade emocional das pessoas, e em escala maior, da sociedade. Alguém já disse que o mês de dezembro é o sábado do ano. Mês das bermudas, do pé no chinelo, do traje casual. E ninguém se intrometa. Deixem as pessoas relaxar. Elas precisam. Até porque essas “férias” são curtas e logo, logo, ao raiar do 2 de janeiro, elas terão de deixar o oásis e cair novamente na aridez do deserto. Sem vida nova. Tudo como no ano anterior, sem refrigérios, sem enfeites, sem louçainhas. Com uma pequena diferença: Mente descansada, energias renovadas, mais confiança no futuro. Só isso.
É uma pena… A simples mudança do calendário não faz milagre.
Affonso Taboza é historiador