Com o título “Alencar e ALECE: 190 anos. E o antes?”, eis artigo de Luiz Carlos Diógenes de Oliveira, diretor de Cultura e Cidadania da Fundação SINTAF de Pesquisa e Ensino.
Confira:
A ALECE comemora 190 anos de funcionamento institucional regular, possibilitado pelo Ato Adicional de 1834, o qual reformou a Constituição centralizadora de 1824, imposta por D. Pedro I. A abdicação do imperador em 7 de abril de 1832 ensejou reformas
descentralizadoras da Constituição vigente. Desta forma, em 7 de abril de 1835, data escolhida adrede, no governo do senador José Martiniano de Alencar, nasce a “Assembléia Legislativa Provincial”, no âmbito do Estado do Ceará. Importa saber do antes.
Alencar, antes de ser senador e presidente da Província, já fora deputado constituinte, representando o Ceará, nas Cortes de Lisboa – em 1821, antes da Independência do Brasil, e, logo após esta, nas Cortes constituintes no Rio de Janeiro – em 1823, dissolvidas pela vontade autocrática de D Pedro I, em 12 de novembro daquele ano. Ainda em 1824, no Ceará Confederado, republicano, fora eleito o deputado mais votado para a formação da Confederação do Equador, em Recife. Em 28 de agosto de 1824, data que não pode ser desmemoriada, 405 eleitores representantes de todo o Ceará, assembleados em Fortaleza, elegeram os deputados do novo Estado revolucionário que irrompia, fora do circuito nacional unificado.
Para além de ser mais uma formal representação do Ceará nas Cortes, como foram as escolhas de deputados provinciais até então, o Ceará ensaiava poderes soberanos. Francisco Miguel Pereira Ibiapina também se elegera, e, junto a outros, marchou para o Recife a fim de consolidar, confederativamente, o movimento revolucionário. A covardia pusilânime e traiçoeira já se amoitara no mesmo berço de nascimento.
Daqueles deputados, Alencar escapou do arcabuzamento, graças à fuga tempestiva e a influência de uma batina de bispo. Deputado Ibiapina foi imolado, a tiros, como os outros mártires famosos, sem deputação legiferante. Resta imortalizado no Passeio Público de Fortaleza, com sangue imiscuído no lençol freático da cidade.
Por ironia da história, este mesmo Alencar, que viveu o que viveu, abriu os trabalhos inaugurais da “Assembléia Provincial” de 1835, com discurso que, talvez, ouvidos covardes, dissimulados, tiveram que engolir, a seco, em silêncio ensurdecedor. Apresentava-se ali, permitido e esperançado no Ato Adicional à Constituição de 1824, os germes do federalismo brasileiro, ao qual muitos cearenses valorosos
desassombradamente lutaram pela liberdade nordestina, sobretudo, nas revoluções de 1817 e 1824.
O discurso do Presidente da província do Ceará veio marcado pela dor recente de tantos dissabores: “Permiti que vos signifique o prazer que sinto por me haver a fortuna deparado a glória de abrir os trabalhos desta primeira assembléia, tendo conseguido o sistema que fui eu o primeiro a proclamar em nossa província , há 18 anos (1817), e pelo qual tenho sacrificado os melhores anos da minha vida, todo o sossego dela, quase toda minha pequena fortuna, parte do meu sangue, a vida dos meus mais conjuntos e melhores parentes, enfim, tudo que possuía de mais precioso”.( Revista do Instituto do Ceará – Vol. XV – Paulino Nogueira).
Ibiapina, deputado do Ceará republicano e soberano, foi imolado em praça pública. Alencar continuou na luta política, antes e depois da consolidação da Independência do Brasil. Deputado pelo Ceará e Minas, optou pela representação do seu berço de nascimento, caririense nativista, tendo sido alçado à presidência da Câmara dos Deputados, em 1831, quando ainda não havia “Assembléia Legislativa” provincial. Seria, talvez, de reparo justo e honestidade histórica, nos 190 anos da Alece, em festa,
os dois deputados de antes serem, lembrados pelos de depois.
*Luiz Carlos Diógenes de Oliveira
Diretor de Cultura e Cidadania da Fundação SINTAF de Pesquisa e Ensino.
lucadiogenes@hotmail.com