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“O médico necessário para o povo”

Manoel Fonsêca é médico e escritor. Foto: Arquivo Pessoal

“A utopia de uma sociedade humanista, solidária e fraterna deve ser renovada a cada dia e sua chama deve ser avivada com nossas vontades, ações e decisões coletivas”, aponta o médico Manoel Fonseca.

Confira:

Para mim, como humanista e militante da Saúde Pública, é uma honra escrever em Defesa da Democracia e do SUS.

Nestes tempos de agonia política é sempre bom relembrar Toquinho e Vinicius: “E no entanto é preciso cantar, mais que nunca é preciso cantar e alegrar a cidade”. Devemos entoar um canto de luta, de resistência e de esperança ao expressar nossa opinião sobre uma questão fundamental para a medicina e a sociedade: qual a médica ou o médico necessário para o povo brasileiro neste tempo atual de extremo risco de retrocesso social, econômico e cultural?

Em primeiro lugar, a médica ou médico necessário deve ter três características:

1- Competência técnica ao praticar seu oficio baseado em evidências científicas;
2 – Competência humana ao exercitar o acolhimento, o diálogo e o cuidado com as pessoas/pacientes;
3 – Competência ética ao exercer a arte médica para fazer o bem e jamais praticar o mal por ações e procedimentos ineficazes e prejudiciais. Favorecer, sempre, a autonomia das pessoas.

Em segundo lugar, a médica ou médico necessário deve se constituir num elo de paz.

1 – A paz consigo mesmo, ao guardar a tranquilidade emocional e espiritual nas relações humanas, neste tempo de ódio, intolerância, violência e desrespeito para com a pessoa humana e sua diversidade de identidade;
2 – A paz com a natureza, ao preservá-la sempre, conservar seus santuários naturais, não polui-la e fazer uso científico de sua biodiversidade, de seus frutos e dádivas, protegendo-os da destruição por fogo e da contaminação por agrotóxico, na perspectiva de uma agricultura saudável e sustentável;
3 – A paz com a sociedade, ao praticar a solidariedade e o espirito coletivo e ao combater radicalmente o fascismo, a tortura e os torturadores, a misoginia, o racismo e a xenofobia, defendendo a integração com os povos irmãos e a soberania de todas as nações;

Em terceiro lugar, a médica ou médico necessário tem que engajar-se politicamente na defesa do SUS e do Estado Democrático de Direito.

1 – Na defesa do SUS se faz necessário lutar contra atos que visem torná-lo ineficaz, seletivo e discriminatório, com o intuito de desacreditá-lo e favorecer o complexo mercadológico da saúde. Saúde não é uma mercadoria, mas um direito social e humano.
Queremos um SUS universal, integral, resolutivo e de qualidade, na perspectiva de ações preventivas e de promoção da saúde, associadas a ações reparadoras, diante de doenças, lesões e agravos e ações reabilitadoras das capacidades físicas, psíquicas e espirituais, que propiciem uma melhor qualidade de vida.
2 – A médica ou médico necessário deve propor-se a defender, intransigentemente, a liberdade e o Estado Democrático de Direito, para que o povo possa fazer suas escolhas livremente, tenha seus direitos essenciais reconhecidos, viva uma vida digna e segura e cresça culturalmente;
3 – A médica ou médico necessário deve, finalmente, lutar por uma nova sociedade em que, segundo Rosa Luxemburgo, sejamos “socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”.

A utopia de uma sociedade humanista, solidária e fraterna deve ser renovada a cada dia e sua chama deve ser avivada com nossas vontades, ações e decisões coletivas.

Como diz o poeta gaúcho Mario Quintana:

Das utopias
Se as coisas são inatingíveis…ora!
Não é motivo para não querê-las…
Que tristes os caminhos se não fora
A presença distante das estrelas!

Manoel Fonseca é médico epidemiologista e escritor do Ceará

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