Com o título “Pauta digital: fora das agendas … e das cabeças!”, eis artigo de Mauro Oliveira, professor IFCE e PhD em Informática (Sorbonne Université). Ele cobra: “O Ceará precisa de um novo Pecém, um novo porto – um CAIS: Ceará Artificial Intelligence and Sustainability”.
Confira:
Quebrei minha promessa de não mais participar de solenidades onde minha presença é dispensável – uma recomendação para quem deseja respeitar melhor o deus Cronos, priorizando amigos e netos. Recentemente, estive em uma dessas ocasiões, onde “gregos e troianos” da política e da economia cearenses homenagearam um de seus raros arautos em comum.
Ao final, encontrei-me com João Teixeira, um dos maiores defensores da pauta digital no Ceará. Lá estava ele, bem ali, mas com a cabeça lá acolá, dobrando a esquina do século de Alan Turing em direção ao futuro incerto de Bill Gates – que hoje dedica seu tempo mais à África do que a solenidades. O sorriso do João correu ao meu encalço, já telegrafando em criptografia telepática o que me diria no abraço fraterno segundos depois:
“Necas de digital nessas cabeças, né Maurin?”
E, de fato, “necas”. Pra não dizer que não falei de flores – e de bytes –, a única inovação naquela noite, além de um maravilhoso consomê, foi a presença de Joaquim Caracas, engenheiro cearense medalhista de ouro nas “Olimpíadas Brasileiras de Patentes em Construção Civil”. Caracas sorriu farto e cúmplice, como de costume, e disparou preocupado:
“Necas de digital, né?”
Provocado por João e Joaquim, decidi revisitar alguns relatórios recentes do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE). Consultei o “Desempenho do Mercado de Trabalho Formal Cearense no 2º Trimestre de 2024”. Busquei pelos termos “digital”, “informática”, “computação”, “inteligência artificial”. Nenhuma menção.
Fiz o mesmo exercício com documentos da Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco (CONDEPE/FIDEM) e da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados de São Paulo (SEADE). Convido-os a fazerem o mesmo e encontrarem resultados diferentes dos nossos. Poupei-me de consultar o Piauí, onde o governador criou uma Secretaria de Inteligência Artificial.
“Nada a ver com o IPECE”, diria Lia, minha brilhante jovem estudante de Eletrotécnica do IFCE (que um dia vai ser orientada do Cláudio Lenz). Os Institutos de Pesquisa apenas refletem a prioridade – ou a falta dela – de nossas lideranças, que ainda não entenderam o novo tempo. Como esperar que compreendam o impacto revolucionário da recente Inteligência Artificial (IA) Generativa, quando sequer “caiu a ficha” do que já vem acontecendo no mundo, desde o início do século, com a IA Preditiva/Cognitiva, um conceito hoje banalizado até em propagandas que tentam vender qualquer coisa.
De volta ao meu casulo, assisti Kai-Fu Lee, cientista formado na Columbia University e na Carnegie Mellon, empresário bilionário, autor de best-sellers sobre IA e ex-presidente do Google China. Ele falava sobre “o futuro da IA após o ChatGPT”. Suas previsões realistas me trouxeram à mente os sorrisos de João Teixeira e Joaquim Caracas, inquietamente preocupados com o futuro de nossos netos na terra de Casimiro Montenegro (o visionário do CTA, da Embraer, do ITA etc) e de Fernando de Mendonça (único sul-americano a receber uma pedra lunar das mãos de Neil Armstrong, festejando 100 anos em seu castelo em SJC).
Fiquei a conversar com os botões do meu pijama listrado (pareço um presidiário… rsrs) que minha sogra me deu no niver dos 70. Eles me disseram: estamos perdendo o bonde da IA! Não é apenas uma questão de ferramentas, mas de visão. Continuamos engasgados no digital, com políticas públicas da revolução industrial ocupando todas as agendas … “e cabeças”.
O Ceará precisa de um novo Pecém, um novo porto – um CAIS: Ceará Artificial Intelligence and Sustainability. Essa é a ponte que devemos construir, se quisermos embarcar no trem da história e não sermos apenas espectadores da revolução que está nos atravessando … garganta e mente!
Precisamos de um Ceará moderno pra chamar de nosso, um Ceará que precisa vir … mais inteligente, humano e sustentável!
Precisamos de um líder!
*Mauro Oliveira,
Professor do IFCE e PhD em Informática (Sorbonne Université).
