Com o título “Psicologia das massas e a bigorna da realidade”, eis o título da coluna “Fora das 4 Linhas”, assinada pelo jornalista Luiz Henrique Campos. Ele aborda a obra “Psicologia das massas e análise do eu”, publicado em 1921, de Sigmund Freud. Poderia ilustrar o cenário atual do mundo?
Confira:
No texto “Psicologia das massas e análise do eu”, publicado em 1921, Sigmund Freud trata do interessante aspecto da coesão das massas. O tema sempre foi inquietante para ele, que na obra utiliza como conceitos, identificação, regressão, idealização, libido e recalque, para tentar compreender os mecanismos inconscientes que podem levar um grupo de indivíduos a terem sua individualidade suprimida pela força do coletivo. O texto foi construído sob os efeitos da primeira guerra e no período em que o nazifacismo começava a botar às mangas de fora.
Não necessariamente complementar ao texto de Freud, mas igualmente interessante, sugiro o livro A mente de Adolf Hitler como leitura a quem deseja se aprofundar nessa temática. Considerado documento confidencial por um quarto de século, a obra do psicanalista Walter Langer, elaborada com o Furher ainda em vida, revela-se como uma das mais extraordinárias pesquisas em relação aos conflitos inconscientes por trás da ascensão e queda do líder alemão e nos deve servir de lição para compreendermos como surgem mentes e movimentos de massa ou de seguidores para usarmos termos de nossa época.
Época, ressalte-se, que mesmo distante há mais de um século da obra de Freud, nos atualiza em relação aos conceitos propostos, a partir de elementos como a intolerância religiosa, o efeito manada das redes sociais, a relativização do bem e do mal, da liberdade de expressão, enfim, da polarização que ganha cada vez mais corpo nos quatro cantos do planeta. Se há 104 anos Freu trazia como centralidade do seu texto a despersonalização do indivíduo ao assumir seu papel na composição de uma horda, vivemos hoje a repetição cruel dessa realidade com a submissão de pessoas a figuras mitológicas, verdadeiras esfinges a funcionar mais como chefes, do que propriamente líderes a guiá-los por estradas seguras.
Em seu texto, Freud ressalta que a necessidade da identificação com o líder explicita muito mais a verdade deste, do que propriamente a do indivíduo que o segue. Assim, a massa se encanta com a mágica das palavras, dos discursos, que podem, ao mesmo tempo, atormentar como produzir em efeito de alivio em sua alma. As massas, na perspectiva freudiana, nunca tiveram a sede da verdade. “Requerem ilusões, às quais não podem renunciar. Nelas o irreal tem primazia sobre o real, o que não é verdadeiro as influencia quase tão fortemente quanto o verdadeiro. Elas têm a visível tendência de não fazer distinção entre os dois”.
A questão nisso tudo, é quando nos deparamos com a angústia de saber que não somos massa, mas pessoas, fato, infelizmente, que tem levado muitos seres humanos a encher as clínicas de psicologia, pois como bem diz a letra do grupo de rap brasileiro, Realidade Cruel: “Não importam suas crenças; a realidade não se curva perante a sua vontade; ela se impõem sobre todos nós; e não há nada maior que a bigorna da realidade.
*Luiz Henrique Campos
Jornalista e titular da coluna “Fora das 4 Linhas” do Blogdoeliomar.