“Vivemos um tempo complexo em que o modelo de ‘governo de coalizão’ do passado não vigora para os tempos atuais”, aponta o professor Marconi Moura de Lima Burum
Confira:
Considerações iniciais. 1) O texto nem de longe advoga em favor da “tese” jurídica do “Mensalão”; e tão pouco advoga em favor de que se crie um modus operandi de “toma lá, dá cá” ao que se cunhou por “Mensalão”; e 2) Não se trata de reeleição pela reeleição; ou de avocar uma vaidade para o presidente Lula que, sabemos, ele não tem, isto é, aquela do poder pelo poder. Contudo, preocupar-se com a reeleição de um projeto democrático, emancipatório, progressista, de cidadania e de direitos humanos. É sobre isso!
Feitas as ressalvas, volvemos à provocação do título do texto.
Vivemos um tempo complexo em que o modelo de “governo de coalizão” do passado não vigora para os tempos atuais. Se outrora um governante era “obrigado” a entregar cargos (especialmente ministérios) para os partidos políticos que formam o conjunto do Congresso Nacional a fim de obter o mínimo razoável de governabilidade, isto hoje se mostra (quase completamente) infrutífero. Cada votação é uma nova negociação com os partidos, mesmo os “da base”, para se conquistar os direitos ao povo, à classe trabalhadora e mesmo à classe média. E frequentemente passamos pelo risco de os projetos serem rejeitos. Também quase sempre é a traição que se mostra a tônica da próxima ameaça [em votação].
E por que isto acontece? Por que não funciona mais dar cargos aos partidos em troca de fidelidade nas votações que interessam ao Governo e à sociedade? Porque cada vez mais o TRATO É INDIVIDUAL. Assim o fez Rodrigo Maia, Davi Alcolumbre, Rodrigo Pacheco, Arthur Lira e outros presidentes das Casas do Congresso Nacional, em especial este último mencionado, o mais despudorado de todos; o que não tinha vergonha de ser chamado de chefe do Orçamento Secreto. Portanto, para que se conquiste os votos no parlamento, deve-se diminuir o diálogo com o partido e intensificar o referente com cada representante. E sim: é o dinheiro quem manda no voto da maioria de Suas Excelências. E não estamos nem querendo acusar, afirmando que se trata de dinheiro sujo; do dinheiro desviado; todavia, do dinheiro em potencial a ser usado como queiram os deputados e senadores brasileiros. Falamos, por conseguinte, do dinheiro das Emendas Parlamentares.
Destarte, deve-se trocar de mãos quem determina o dia e a hora do recurso das Emendas que chegarão nas bases eleitorais destes sujeitos. Sair do poder dos presidentes das Casas, dos relatores e dos líderes partidários e ir para o lugar correto: o Poder Executivo. E ter este instrumento como a “ferramenta” da fidelidade à agenda do Governo [e do povo].
Pois bem! Chegamos ao ponto que brota da provocação do título deste texto, entretanto, que carrega um pragmatismo (mesmo de debate moral) possível à governabilidade dos tempos atuais: o presidente Lula necessita suspender o expediente de se convidar os partidos políticos para compor o Ministério “A” ou a Diretoria de Estatal “B”. É evidente que estes cargos serão ocupados por políticos. No entanto, que os sejam pelo gosto e escolha pessoal e tática eleitoral do próprio Lula.
Quanto à obtenção de votos no Congresso Nacional para se aprovar as medidas necessárias à sociedade brasileira, Lula precisa convidar, mesmo que cansativamente, cada deputado e cada senador e assim dizer: “o Sr. precisa de quanto de liberação daquela Emenda; e para qual município vai?”. Apertar a mão do camarada e dizer: “Assim seja: vote com lealdade ao interesse do povo; no projeto de isenção do imposto de renda (por exemplo), e sua emenda será liberada no dia seguinte!”. E repetir o mesmo processo com cada sujeito que o eleitor enviou para aquela Casa de Leis.
Infelizmente, este é o jogo. Parece um pouco amoral? Não! São os tempos de hoje; em que o poder está entregue ao fascismo neoliberal, às fake news formadoras de opinião de massa e à irresponsabilidade pública do Orçamento na modalidade secreta. Não foi o Lula quem estimulou este modelo de Governo. É o que está dado. E precisa ser percebido de uma vez por todas pelo Fernando Haddad (o chefe da grana pública); pela Gleisi Hoffmann (a chefe da negociação governamental); pelo Rui Costa (o chefe da burocracia estatal); e por todas as lideranças saudosas de um tempo em que a justiça social e a política sentavam à mesa da aristocracia com algum respeito desta última. Porém, essa estrutura social não é mais (apenas) aquela que cooptava agentes para pleitear fatias do Orçamento público; é ela mesma um Cérbero sentado sobre o erário, impedindo que o dinheiro público de fato chegue à sociedade; para as suas políticas públicas.
Lula foi perseguido em seu primeiro e segundo mandatos por algo que não fez: a prática do “Mensalão”. Entretanto, parte daquelas premissas, no irônico da vida e da política, são a única forma de Lula salvar o Brasil do retorno da extrema direita ao poder e ter um pouco de paz para governar. Porque pior que ter a direita liberal (a aristocracia moderna) dividindo o poder na tal da antiga “conciliação de classes”; é ter esta mesma elite podre agora adornada à fétida fumaça do bolsonarismo que encobre parte da sociedade e o todo das torres do Congresso Nacional ordenando todos os rumos do País… e com reais chances de volta em 2026, mas já governando – por dentro do Congresso – o 2025, o 2024, o 2023…
Marconi Moura de Lima Burum é Mestre em Direitos Humanos e Cidadania pela UnB, abraçado às epistemologias do Direito Achado na Rua; pós-graduado em Direito Público e graduado em Letras. Foi Secretário de Educação e Cultura em Cidade Ocidental. No Brasil 247, inscreve questões ao debate de uma nova estética civilizatória
Uma resposta
O autor faz a ressalva (que transcrevo abaixo) antes, mas fiquei com a impressão contrária.
O texto nem de longe advoga em favor da “tese” jurídica do “Mensalão”; e tão pouco advoga em favor de que se crie um modus operandi de “toma lá, dá cá” ao que se cunhou por “Mensalão”.