“São João Paulo, futebol e a literatura de cordel” – Por Barros Alves

Barros Alves é jornalista e poeta

“João Paulo II era um homem de extraordinário carisma e, consequentemente, dotado de expressivo talento comunicacional, que sabia explorar a serviço do Reino de Deus e da Igreja”, aponta o jornalista e poeta Barros Alves

Confira:

O nordestino, como de resto todo brasileiro, é aficionado por futebol, conserva grande religiosidade, uma grande parte ainda fiel ao Catolicismo romano, e, portanto, senão seguidores, pelo menos admiradores do Sumo Pontífice que governa a Igreja Católica Apostólica Romana. Incluo-me com devoção aos dois últimos itens e abdico totalmente do primeiro como a parecer não ser brasileiro. De fato, não aprecio nenhum tipo de jogo, incluso nessa ojeriza o futebol. Igualmente ao poeta Paulo Leminsky com sua indefectível causticidade, para mim trata-se de “fútil bol, alegoria do povo”. O tema me faz lembrar uma historiazinha cujo protagonista teria sido o grande sábio grego Aristóteles. Certa vez ao adentrar na Academia de Atenas viu alguns dos discípulos jogando. Repreendeu-lhes, ao que um deles retorquiu: – “Mestre estamos jogando sem apostar bens ou dinheiro.” Então, o filósofo lecionou: -“Vocês estão perdendo o que há de mais importante na vida: o tempo.” Como o dístico que ainda hoje deve estar escrito em uma parede interna do Colégio 7 de Setembro, Centro: “Quem perde o tempo, eterna perda chora.”

O arrazoado acima surgiu a proposito da data de hoje, 9 de julho, que registra 45 anos da presença do então Papa João Paulo II à Fortaleza. O hoje São João Paulo II veio às plagas cearenses participar do X Congresso Eucarística Nacional, atendendo convite do respeitável pastor Cardeal Dom Aloísio Lorscheider, Arcebispo Metropolitano de Fortaleza. Naquele 9 de julho de 1980, por feliz coincidência também data do meu aniversário, foi a única vez que compareci ao Estádio Castelão. Fi-lo com o fito único de assistir à Santa Missa de abertura do Congresso Eucarístico, celebrada pelo Santo Padre e concelebrada por dezenas de bispos e padres. Daquele a esta parte, jamais pus os pés naquele ou em qualquer outro lugar de jogos. Aliás, rarissimamente assisto algum jogo via televisão ou qualquer outro meio de comunicação visual. Prefiro os documentários, os filmes e similares.

O Papa João Paulo II era um homem de extraordinário carisma e, consequentemente, dotado de expressivo talento comunicacional, que sabia explorar a serviço do Reino de Deus e da Igreja. Era um “globe trotter da fé.” Em todos os países que visitou recebeu cobertura total dos órgãos midiáticos e foi objeto comentários, análises e críticas de jornalistas e escritores. No Brasil nao faltou a escritura dos poetas populares, cantadores e poetas de cordel. Eu mesmo, em face de uma iniciativa “sui generis” de um entusiasmado admirador do Papa, escrevi um folheto intutulado A HISTÓRIA DE DAMIÃO GALDINO, O PARAIBANO QUE QUERIA DAR UM JUMENTO AO PAPA. Foi um sucesso, menos pelos versos, do que pela história do ineditismo de tão abstruso presente.

Centenas de poetas populares escreveram sobre a visita do Papa ao Brasil. Afonso Nunes Batista, poeta de grande estro, narrou em dezenas versos escorreitos a passagem do Papa por entre nós, entre os quais trabscrevo os que seguem:

“Agora João Paulo Segundo,
Que saiu peregrinando,
Passou no nosso Brasil
A lei de Deus ensinando,
Porque os dogmas cristãos
Ele veio semeando.”

“No dia 9 de julho
Chegou Sua Santidade,
Seu avião pousou firme
Aqui em nossa cidade,
O sonho dos cearenses
Tornou-se realidade.”

“O povo todo exaltava
Porque ver a vez primeira
O Papa era ver um anjo
Sentado numa cadeira
Ante o símbolo de Cristo
Na grande cruz de madeira.”

Os irmãos Arievaldo e Klévisson Viana, xilogravuristas e poetas de cordel talentosos, escreveram um livreto para homenagear João Paulo II “post mortem”. Ali se lê:

“Depois visita a Polônia,
A sua terra natal
E em julho de 80
Veio ao Brasil, afinal;
Sendo bastante aclamado
Recebeu em cada Estado
Um abraço fraternal.”

………………

Foi ao Rio de Janeiro
Depois foi a Salvador,
Chegando a Fortaleza
O nosso santo pastor
Celebrou no Castelão
E abraçou o Gonzagão
Nosso maior cantador.

O Padre Gotardo Lemos
Fez uma bela canção
Que Luiz Gonzaga gravou
Com beleza e emoção.
O estádio delirou
E o povo todo cantou
Ao lado de Gonzagão.

A dupla José Caetano da Silva e Raimundo Cassiano Filho, cantadores com tive o prazer de ter profícua convivência poética, escreveram VISITA FO PAPA AO BRASIL, um folheto que enfatiza o caráter evangelizador da primeira visita do Santo Padre ao Brasil e lembram a peregrinação em Fortaleza:

“Vem gente da Paraíba,
Piauí e Maranhão,
Pernambuco e Alagoas
E muitos vêm de avião
Visitar o Santo Papa
E ver nosso Castelão.”

Elias A. de Carvalho, poeta popular pernambucano de larga produção escreveu “O ROTEIRO DO PAPA NO BRASIL”, no qual se lê:

“Em Fortaleza foi lindo!
O povo da região
Recebeu o Peregrino
Com danças típicas, baião
E aplauso dos presentes
No campo do Castelão.

O poeta Francisco Melchíades Araújo lembra a recepção feita ao Papa no Castelão, na qual o cantador Pedro Bandeira saudou o Papa e deste recebeu um conselho:

“Celebrou no Castelão
Missa para seus fiéis
E disse a Pedro Bandeira,
Um dos grandes menestréis:
— Cante, cante até morrer
Seus repentes e cordéis.”

O grande vate repentista Otacílio Batista também foi bafejado pelas musas para a exaltação de João Paulo II e preocupou-se com denunciar ao líder dos católicos as mazelas sociais de nosso país. Encerra seu APELO AO PAPA com uma bem elaborada décima:

“Fiz da sants Poesia a mensageira
Da pobreza mais pobre do País.
É pequeno o poeta que não diz
Quanto sofre a criança brasileira.
Ninguém pode viver dessa maneira
Sem um teto, sem lar, sem pão, sem nome.
Quem é filho de rico bebe e come,
Quem é filho de pobre não escapa.
As crianças sem papa pedem ao Papa:
— “Santo Papa dê papa a quem tem fome”.

Eis, portanto, um átimo da presença dos poetas de cordel no registro da primeira visita do Papa João Paulo II ao Brasil, especialmente em Fortaleza. Na data do meu aniversário, repito.

Barros Alves é jornalista e poeta

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