“Naurício foi colocado junto com mais quatro prisioneiros de costas para um muro no pátio interno do presídio Maria Zélia e sumariamente fuzilado, em 1936. Tinha 22 anos e era cabo do Exército”, aponta o defensor de direitos humanos Mário Miranda de Albuquerque
Confira:
Vez ou outra sou bafejado pela pauta de julgamento da Comissão de Anistia com processos que estendem a minha função precípua de Conselheiro, me fazendo adentrar o campo da memória. Como quando descobri que o ex jogador Nando (Fernando Coimbra, irmão de Zico e Edu), reconhecido como anistiado político, jogara no Ceará Sporting no emblemático ano de 1968, fato que o fez receber diversas homenagens do Vovô e da Assembléia Legislativa estadual e ensejou a publicação do primeiro livro em âmbito nacional abordando a relação Ditadura & Futebol, sob os auspícios do Centro Cultural alvinegro.
Recentemente tive outra surpresa, com a especificidade de envolver minha família.
Ao ler o processo 2013.01.72578, que o sistema de sorteio me atribuiu a relatoria e em que uma filha requer pelo seu falecido pai por prisão, perseguição e tortura decorrente de sua participação na ANL e no PCB, me deparo com um documento de presos políticos do Presídio Maria Zélia (SP), denunciando a brutal repressão que se abateu sobre um grupo de 26 presos, frustrados em sua tentativa de fuga e, esse o destaque, o fuzilamento sumário de cinco dentre eles, dentro da própria penitenciária, no ano de 1936. Entre os fuzilados, um nome me fez saltar instintivamente da cadeira: NAURÍCIO MENDES MACIEL. Explico.
Meu pai homenageou dois membros da família cearense Mendes Maciel, ao registrar o sétimo dos onze filhos que teve com minha mãe (uma natimorta e outro falecido no primeiro ano de idade), com o nome de Wilson Naurício.
Quanto ao primeiro não havia nenhuma dúvida. Desde sempre sabíamos tratar-se de Pedro Wilson Mendes, advogado assassinado à luz do dia em pleno centro de Fortaleza por um outro advogado e seu filho, em rumoroso caso em que o morto figurava como defensor de uma viúva espoliada numa disputa por terras pelos assassinos. O mesmo não ocorria em relação ao segundo nome, de quem pouco se sabia, salvo que havia sido morto em São Paulo na década de trinta. Tratando-se de nome não muito comum, muitos atribuíam a erro de cartório, o M trocado pelo N.
Naurício foi colocado junto com mais quatro prisioneiros de costas para um muro no pátio interno do presídio Maria Zélia e sumariamente fuzilado, em 1936. Tinha 22 anos e era cabo do Exército. É só o que consta do mencionado documento. Se houve processo e qual seu desfecho, e outras pertinentes informações, estão à espera de maiores pesquisas. Quem sabe o assunto desperte o interesse de alguém ligado à área de História das nossas universidades.
Mário Miranda de Albuquerque é conselheiro da Comissão Nacional de Anistia