Com o título “No caos, sejamos resistência com lucidez”, eis mais uma crônica de Suzete Nocrato, jornalista e mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará. “O Brasil de hoje nos convida para o amanhã que se avizinha. É um prenúncio e um alerta para 2026. Este é o tempo de afiar o olhar, cultivar o senso crítico e assumir, de forma consciente, a escolha de nossos representantes no Congresso”, expõe a articulista.
Confira:
Há quase uma década, o Brasil atravessa janeiros sombrios. Desde as primeiras movimentações acerca do impeachment da presidente Dilma Rousseff, vivemos uma polarização político-ideológica que nos mantém em constante sobressalto. Esse clima de tensão é continuamente alimentado pela direita e extrema-direita, que fabricam novos episódios com o claro objetivo de romper os pilares institucionais para retomar o comando do país.
Foi nesse terreno envenenado que, na última semana, os ventos do golpismo voltaram a soprar com força. Senadores e deputados federais bolsonaristas se amotinaram nos plenários da Câmara e do Senado, num grave ataque à democracia. O ato arbitrário e violento tinha como estratégia instaurar o caos, intimidar e chantagear as duas Casas Legislativas, para impor, à força, a anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro — personagem nefasto ao país, que deixou um rasto de retrocessos, perdas de direitos, destruição de programas sociais e do meio ambiente, sob a sombra de 700 mil mortes na pandemia da Covid-19.
Neste momento de turbulência, proponho o caminho da lucidez. Defendo a temperança — não a passividade, a omissão ou o silêncio cúmplice, mas a firmeza serena. Penso que a democracia brasileira clama por um pacto de amorosidade, escuta, cuidado com o outro e, sobretudo, pela negociação consciente. No auge dos acontecimentos, ouvi uma sugestão — ainda que em tom de
brincadeira — que jogassem “ovos corados” (expressão cearense para ovos podres) contra aquelas figuras caricatas que hoje ocupam cadeiras no parlamento. Não podemos, por mais justa que seja nossa indignação, nos tornar reflexo do extremismo e da brutalidade.
Não se trata de aceitar, tolerar ou silenciar diante da ameaça. Trata-se de reagir com inteligência, coragem e civilidade. Saíamos às ruas em defesa do Estado de Direito e da proteção das instituições democráticas; ocupemos praças e parques das cidades com música, risos, leitura e partilha. Enquanto eles procuram a escuridão, sejamos a luz, sejamos solares. Sejamos resistência, mas com humanidade e sensibilidade.
O Brasil de hoje nos convida para o amanhã que se avizinha. É um prenúncio e um alerta para 2026. Este é o tempo de afiar o olhar, cultivar o senso crítico e assumir, de forma consciente, a escolha de nossos representantes no Congresso. Não devemos aceitar que persista essa crise de qualidade da representação na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, que é vexatória, assustadora e deplorável. Grande parte dos parlamentares está mais empenhada em promover desinformação e defender seus interesses próprios do que em debater projetos para o povo brasileiro. Claro que há exceções e são elas que nos mantêm viva a esperança.
É, portanto, urgente reescrevermos os rumos do Legislativo brasileiro, nas próximas eleições. Não podemos continuar reféns de facções políticas nocivas, de figuras despreparadas, inconsequentes e de viés fascista, que alimentam a desordem e o retrocesso. Não custa lembrar que a democracia exige vigilância constante. E cabe a cada um de nós, cidadãs e cidadãos, escolher com consciência e responsabilidade quem nos representará em todas as esferas do parlamento. Não nos deixemos seduzir pelo “canto da sereia” do oportunismo e da antidemocrática.
*Suzete Nocrato
Jornalista e Mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará.