O equipamento cultural mais antigo do estado, a Biblioteca Pública do Ceará, BECE, recebeu Itamar Vieira Júnior e Nina Rizzi, que mediou o bate papo com o vencedor do Prêmio Leya, Prêmio Jabuti, Prêmio Oceanos, Prix Montluc e Nominated International Booker Prize. O escritor veio à Fortaleza para o lançamento de “Coração sem Medo”, que completa a “Trilogia da terra” com as obras “Torto Arado” e “Salvar o Fogo”.
“Os lançamentos de livros já fazem parte de programação consolidada da Biblioteca Pública Estadual do Ceará e que, a cada ano, ampliamos a participação de escritores de outros estados e países. A presença do Itamar Vieira Junior na Bece foi muito gratificante e simbólica, tanto pela sua relevância na literatura brasileira, cuja obra retrata um Brasil profundo e real, mas também pela oportunidade da escuta de sua fala inspiradora e de trocas afetivas com o público. Itamar, além de grande escritor, é um ser humano extraordinário”, destaca Suzete Nunes, superintendente da Bece.

Nina Rizzi iniciou a mediação fazendo referência à chacina do Curió, que completou dez anos. “A Rita Preta são todas as mulheres que lutam pela melhor vida dos seus filhos e por sua memória de verdade. Itamar, a gente tá fazendo a leitura do mundo ao ler sua obra”, desabafou, às lágrimas a pesquisadora.
No meio da conversa, Itamar Vieira Júnior nos faz pensar: “Não ter um passado é como não ter um pai. A literatura restitui a humanidade”. Essa fala surge no contexto em que o autor e a mediadora refletem sobre como relatos de mães que perderam seus filhos são retratados na mídia. “Essas histórias aparecem de forma desumanizada, sem muito cuidado, não há espaço para que se tenha cuidado. A Rita é a união de muitas mulheres. Ela representa muitas que aparecem nos noticiários. A Rita erra muito e celebra a vida. Adora viver, dançar, ela não desistiu da vida, gosta de celebrar”, explica o escritor.

Em “Coração sem Medo”, há mais espaço para sonhos e um pouco mais de leveza do que nas duas obras anteriores.
Os momentos em itálico na obra são baseados em histórias reais que emocionam os milhares de leitores que respeitam e celebram a vida e a obra de Itamar. Na última sexta-feira, centenas de cearenses lotaram o auditório da BECE que não deu conta de tanta gente que queria ver de perto o baiano falar. A fila deu volta na biblioteca, mas todos conseguiram uma foto e um autógrafo nos livros. “Ele veio no ano passado, eu não consegui vir, mas hoje tenho a oportunidade de agradecer àquele que me ensinou a devorar livros. Eu li Torto Arado pra minha avó e foi uma experiência inesquecível de descoberta mútua de nossa ancestralidade. A literatura une as pessoas”, celebra Talita de Moura.

A escrevivência é como uma arma contra o apagamento. “Eu faço dessas ausências o que chamamos de literatura. Comecei a escrever a primeira versão há um tempo, quando eu tinha uns dezessete anos, então o livro nasceu primeiro de uma memória falada, eu não gosto da expressão regionalista, eu conto por outra perspectiva. A literatura restitui a história e o leitor também é ativo nesse processo”, explica Itamar Vieira Júnior.
O evento começou às sete da noite e Erandir Barros chegou uma e meia da tarde para garantir que iria ouvir e ver Itamar. “Ele me inspira, principalmente pela representatividade. Sou um escritor iniciante, escrevo contos há três anos, que falam sobre a periferia de Fortaleza, mais especificamente, no bairro Jardim Guanabara. Sei que a literatura pode mudar vidas. Já recebi convite da assistente social do meu bairro para realizar algo na área da literatura para as crianças e, de certa forma, a vida e obra dele me impulsionam a trilhar esse caminho”, alegra-se Erandir Barros.

“A imaginação é um atributo humano. Todos nós somos capazes de sonhar. Os sonhos aparecem com frequência em coração sem medo. Essa experiência transcendente é libertadora. Caim se vale da mente livre imaginando histórias e assim eu também faço um exercício na produção das histórias. A imaginação é uma arma que eu tenho assim como a caneta e a literatura”, inspira Itamar.
Luiza Farias conta que passou um ano e meio para terminar “Torto Arado”. Como historiadora, pesquisa territorialidade. “A leitura me emocionou bastante, daí a demora para concluir, pois senti bastante, o livro me tocou de uma forma que não consigo explicar. Comecei a ler por causa da música Torto Arado (part. Liniker e Luedji Luna) e a obra me arrebatou”, desabafa a historiadora.

“Eu penso a literatura como um terreno de liberdade. O que nos toca e o que pode ser diferente do que pensamos”, reflete Itamar Vieira Júnior.
“O lançamento de Coração sem Medo, de Itamar Vieira Jr., na BECE, foi uma celebração linda da força da literatura e de seus territórios. O livro renova a reflexão sobre o direito à terra no espaço urbano, conectando sua protagonista a ecos de “Torto arado” de forma muito poética. A conversa entre Itamar e Nina Rizzi foi sensível e instigante, revelando camadas do processo criativo e do enredo do livro, sendo um ótimo convite à leitura”, conta Rayana Vasconcelos.

Eu iria dizer algo a ele também, mas a Nina Rizzi, descalça e despida na alma pelas palavras e escrita de Itamar, falou por mim, ao concluir a roda de conversa do lançamento do livro “Coração sem Medo”:
– Itamar, o Ceará sempre vai te tratar bem.

A professora e pesquisadora Antônia Sales lançou na última terça, 9, seu livro Clarice Lispector em língua inglesa – Uma história contada pela tradução, na Universidade Federal do Ceará.

Para a autora, ler Clarice é válido porque é algo atemporal. No entanto, alerta que se comecem pelos contos e crônicas, mais fáceis de se compreender. “A Clarice se tornou um clássico, um cânone literário, alcançou o mundo. E é um clássico porque tem sempre algo a dizer, é atemporal. A maioria de suas personagens são femininos. É a dona de casa que de repente se descobre presa em uma rotina, a mulher casada que se percebe alienada no casamento, a menina que se vê como adulta, a filha que busca entender seu relacionamento com a mãe, e tantas outras mulheres pensantes”, destaca.
