“Sem dados consistentes, com informações fragmentadas, com dados sem validação, análises imprecisas; a subnotificação, a falta de padronização, a volatilidade estatística torna inviável a criação de um ranking confiável”, aponta o jornalista Norton Lima Jr
Confira:
São João do Jaguaribe foi a cidade mais violenta do Brasil no Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2021. E Maranguape é a cidade mais violenta do Brasil no Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2025.
Eu digo é valha, porque esse bang-bang nas pacatas São João do Jaguaribe e Maranguape, só existe na instabilidade estatística do sociólogo Renato Sérgio de Lima — dono da ONG Fórum Brasileiro de Segurança Pública (CNPJ 08.011.968/0001-25; CNAES 94.30-8-00).
No Brasil, a modernidade sempre foi uma publicidade aplaudida por todos, mas que apenas existiu na hiper-realidade. Não à toa, Jean Baudrillard (em 1989, no auditório Castelo Branco da UFC) disse ser o Brasil um país dos simulacros, paradoxos e ironias — depois de ouvir uma série de perguntas sem questões válidas.
Pós-irônico, como numa festa onde todos dançam a náusea, a depressão e a melancolia do significado da insignificância. Rankings que misturam metrópoles com cidades pequenas são enganosos ou feitos para enganar.
Em 2021, alertei os FBSP da inaplicabilidade da equação /100 mil habitantes em cidades com menos de 100 mil habitantes — porque em censos, vale o número absoluto, nunca o ponderado.
Para você dimensionar a furada dessa taxa Renato Sérgio — em uma cidade de 20 mil habitantes com 2 homicídios/ano, teríamos 10 mortes por 100 mil habitantes; e em casos de 4 homicídios, 20 mortes por 100 mil.
Não tente entender. Só o Chacrinha explica. É como os mapas sem território de Baudrillard. Feitos para seduzir e complicar. Ou Alberto Roberto mandando uma índia receber o seu merecido Oscar. Maranguape transformada em Chico City.
Nesse Anuário, a única coisa sem volatilidade é a solidez da conta bancária do sociólogo.
Há problemas na coleta, na classificação e na análise dos dados.
Primeiro. Falta transparência. O produto final depende de dados registrados pelas secretarias de segurança pública estaduais. E a subnotificação é problema recorrente.
Segundo. Falta auditoria, falta checagem. Os dados são tabulados sem filtro. E o FBSP ainda não desenvolveu um sistema paralelo de apuração com dados validados.
Terceiro. Falta padronização. Não há um padrão consolidado para o preenchimento de dados nos sistemas de registros estaduais. A classificação varia de estado para estado por falta de protocolos uniformes. Na classificação de mortes violentas, por exemplo, homicídios dolosos são registrados como homicídios de causa indeterminada — porque falta recursos tecnológicos e humanos para a investigação policial.
Quarto. Falta integração. Os sistemas de registro não estão 100% informatizados. Estados e municípios não se comunicam. A mudança da plataforma SinespJC (de 2004) para o SINESP (de 2012) foi desastrosa, além de muito cara.
Olha, dá pra montar uma apuração paralela. Conversava muito sobre isso com o querido jornalista Fernando Ribeiro — que durante anos prestou um grande serviço ao Ceará com o seu HOMICIDÔMETRO, com atualizações semanais.
Fernando, in memoriam, morreu de COVID, foi demitido após pressão do governo do Ceará. Foi socorrido no portal independente do jornalista Donizete Arruda.
Sem dados consistentes, com informações fragmentadas, com dados sem validação, análises imprecisas; a subnotificação, a falta de padronização, a volatilidade estatística torna inviável a criação de um ranking confiável.
Esse ranking nacional do FBSP é desonestidade ou (sendo bonzinho) masturbação intelectual.
Essa ONG foi apadrinhada pelo ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardoso. A intenção era boa. É sempre oportuno aproximar o mundo real à Academia, e vice-versa. Mas o matusquelagem intelectual do Renato Sérgio dá urticária no cadáver do policial Perpétuo de Freitas. E pior do que isso, só mesmo os contratos robustos para “melhorar a governança e os indicadores de segurança”.
Diz Renato Sérgio que sua “missão de promover a segurança pública como direito social, articulando policiais, gestores e pesquisadores”. Diz ele que seu “trabalho busca enfrentar questões sistêmicas” — como a baixa eficácia na investigação de crimes (apenas 5% dos homicídios são investigados); e a politização das polícias.
Diz ele que não oferece “soluções cosméticas para melhorar a imagem de governantes em rankings”, mas que consegue “melhorar a qualidade e transparência dos dados criminais”; que sabe “capacitar gestores e policiais”; e que sabe “avaliar políticas públicas para reduzir a violência”.
Bem, Renato Sérgio por R$ 2,8 milhões criou o programa Ceará Pacífico, lançado em 2015 pelo Camilo Santana, que trocou o cemitério das Hilux pelo túmulo das Duxter.
Renato Sérgio prometeu em contrato reduzir a violência no Ceará, promovendo ações integradas de segurança pública, prevenção social e fortalecimento institucional. Comédia. Entregou três apostilas que qualquer ChatGPT hoje escreveria melhor.
Diz ele que o seu treinamento oferece subsídios pedagógicos para a formação policial. E que treina policiais em vários estados desde 2016. E ele gosta de dar nomes complicados para esses treinamentos, como Framework da Governança Multinível do Sistema Único de Segurança Pública.
Mandei esse artigo para vários colegas policiais. Pediram o endereço desse bosta para mandar flores.
Norton Lima Jr é jornalista