“Hoje, leio com os olhos impassíveis da grande mídia comemorações de mortes, com anúncios de CPF’s cancelados e outros atos como se tudo fosse natural”, aponta o advogado Fabrício Moreira
Confira:
Todos sabem que sou um amante da liberdade, regozijo que me impulsionou a ingressar nas fileiras do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), no início dos anos 1990.
Iniciei cedo a militância jurídica e, ainda acadêmico, percorri por anos as salas de audiência do imponente Fórum Clóvis Beviláqua, encravado no centro antigo da Capital da Luz de José de Alencar, Iracema dos lábios de mel e de todos os cearenses.
Fui estagiário do Dr. Antônio Vieira de Almeida, no Fórum Clóvis Beviláqua e no IPPS (Instituto Penal Paulo Sarasate), participando das audiências e dos intermináveis Júris populares no belo salão preto forense.
Na primeira vara do júri, presidida pelo notável magistrado e hoje desembargador aposentado Dr. Francisco Darival Bezerra Primo, compreendi que a liberdade pode estar “até mesmo acima da própria Pátria, por ser a condição da Pátria”, como definia Rui Barbosa.
Gostaria de observar, porém, que nos crimes dolosos ou culposos contra a vida de um semelhante, não se comemora resultado positivo; não se vibra após o julgamento, cujo foco reside na discussão de pontos essenciais: “liberdade, morte e vida”.
Em Icó, também na década de 1990, assumi um caso de grande repercussão local e regional. Consegui que a tese apresentada fosse acolhida e, por conseguinte, o acusado posto em liberdade.
Três dias depois, recebi em nosso singelo, mas animado escritório, o convite do cliente para degustar três gostosos carneiros em sua fazenda, em comemoração à sua liberdade.
Convenci-o de que sua liberdade deveria ser celebrada em silêncio, pois estava eternamente ligada ao amadurecimento que os fatos lhe custaram. Expliquei que, naquele momento, festejar não seria adequado, pois do outro lado restava uma família enlutada e sofrida, mesmo diante do evento plenamente amparado pelas regras mais comezinhas do direito e pelo péssimo comportamento social daquele que partiu da vida terrena.
O cliente, habituado apenas às rudezas da vida, com mãos calejadas e pouco domínio das letras gramaticais, mas sábio por natureza, acolheu a sugestão. Naquele período, nada de festa. Apenas a convicção de que o tempo seria o Senhor da razão. E foi!
Hoje, leio com os olhos impassíveis da grande mídia comemorações de mortes, com anúncios de CPF’s cancelados e outros atos como se tudo fosse natural.
Como disse certa vez o jornalista Cláudio Teran:
“Até a próxima bala, no país que continuará comemorando a morte de um bandido hoje e enterrando as vítimas da violência perene amanhã, em nossa normal brutalidade”.
Eis o Brasil.
Fabrício Moreira da Costa é advogado e contista