“O chamado espirito natalino, aquele sentimento de amor, união e fraternidade, senti mesmo quando participei da entrega de donativos para as pessoas em situação de rua”, aponta o jornalista Paulo Rogério
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Tento começar a escrever essa crônica semanal de uma forma séria, concentrado nos temas do cotidiano da cidade, nos problemas e soluções. Mas essa música de Natal tocando em algum rádio ligado ao longe não deixa. Busco focar na página em branco à minha frente, assobio algo diferente. É inútil, logo estou cantarolando na mesma harmonia: “Eu pensei que todo mundo fosse filho de paaapaaaiii noooeeeel!”
Então é Natal! Desculpe, não aguentei evitar a frase. As casas já estão cheias de luzes pisca-pisca, os prédios enfeitados e imensas árvores natalinas iluminam as praças. Aquelas feitas por redes como a da Praça Portugal e da Praça do Ferreira chamam a atenção, como sempre, pela originalidade bem cearense. Fico perguntando o que acontece com essas redes depois das festas de dezembro? Será que, pelo menos, viram cama para as dezenas de sem-teto? Árvores, luzes e natais!
Nunca gostei muito do Natal. Nada contra o bom velhinho, fique bem claro. Muito menos contra o aniversariante do dia, Jesus, muitas vezes esquecido pelas pessoas. Acho a data um momento triste, não sei o porquê. Quem sabe um dia tenha coragem de ir a um psicólogo e descobrir o motivo desse sentimento. Não lembro de traumas na infância.
Não tinha noites de grandes festas, é verdade. Era dormir e ver o presente embaixo da cama na manhã do dia seguinte. E a velha história de que o Papai Noel veio deixar ali na madrugada e eu estava dormindo. Versão que meu irmão mais velho sempre fazia questão de desmascarar. E eu de sair no murro com ele, defendendo a tradição. Anos depois, estava eu me vestindo de velhinho para meu filho.
Nem quando descobri que havia ceia na noite do dia 24 fiquei encantado. Eram momentos de reunião de familiares estranhos, de primos que nem conhecia e tias e tios que apareciam de repente. Gente de sorriso amarelo que passou o ano inteiro sem lembrar que você existia e que agora vem lhe estender a mão, dar dois beijinhos no rosto, lhe desejar Jesus no coração e sair correndo para fazer o seu pratinho da janta.
E o tal do amigo secreto? Ah, o temível presente do tal “amigo invisível”. Dizem que é invenção americana – só podia ser – e que surgiu na crise de 1929. Por aqui, “abrasileiraram” a criação e o secreto virou o manjado conjunto de sabonete, cinto, meia, gravata. Ruim para quem vai comprar, pior para quem ganha que nem sempre é o que se quer. Defendo aqui, para quem vai participar, um amigo secreto só de livros, de preferência de autores cearenses.
O chamado espirito natalino, aquele sentimento de amor, união e fraternidade, senti mesmo quando participei da entrega de donativos para as pessoas em situação de rua no Centro de Fortaleza. Fomos cantando, todos de coração aberto, entregando roupas e brinquedos, e recebidos com emoção. Parecia que uma luz nos acompanhava pelas ruas desertas e escuras. Um brilho que arrepiava, um sentimento de entrega, sem interesses, sem conceitos. Só o de levar um pouco de esperança ao próximo, talvez, isso o que o próprio Jesus gostaria de ver com mais frequência.
Paulo Rogério (paulorogerio42@gmail.com) é jornalista