“As missões do aparelho policial em nosso estado patrimonialista” é o título da Coluna “Foradas QuaatroLinhas”, assainda pelo jornalista Luiz Henrique Campos.
Confira:
Há alguns anos entrevistei o coronel aposentado da Polícia Militar de São Paulo e ex-secretário Nacional de Segurança Pública do governo FHC, José Vicente da Silva Filho. Depois da entrevista, feita em um sábado à tarde, tiramos mais alguns minutos para aprofundar a discussão em tom mais informal. Crítico da visão progressista da criminalidade urbana, José Vicente fez abordagem interessante sobre a esquizofrenia que demarca a função das polícias em um estado patrimonialista como o nosso.
O patrimonialismo foi implantado no Brasil pelo Estado colonial português e nos legou uma prática em que o público e o privado se confundem a favor de uns, excluindo outros. No caso policial, na conversa com Zé Vicente, a mim ficou claro, que o entendimento da função desse aparato de estado pela elite, é de que sua missão é protegê-la contra os transgressores da lei que a ameaçam. Transgressão, e aqui é grifo meu, que se caracteriza por ser cometida por quem está fora do raio que circunscreve essa elite. Dessa forma, sempre será aceito o jeitinho de uma parcela da sociedade, não cabendo a polícia perder tempo com coisas menores, pois praticadas por quem se sente o principal beneficiário desse aparelho estatal.
Do outro lado, os que não fazem parte da elite, que em tese também deveriam ser protegidos constitucionalmente pelas polícias, nem se vêm, nem são vistos assim. Não vou delimitar quem sejam, pois não se faz necessário. Mas alguém tem dúvida se estes são abordados da mesma forma que os da elite? Assim, não surpreende o fato de que um “zé ninguém” venha a ser jogado de uma ponte como se fosse lixo, ou asfixiado em uma viatura policial; enquanto motoristas que atropelam e matam em Porsches, ou doutores cometendo atos delituosos, recebem tratamentos educados e a complacência dos homens da lei.
Nesse sentido, não choca, por exemplo, que a Polícia de São Paulo contabilize o salto de 355 para 702 mortes cometidas por agentes entre 2022 e 2024. Bem como também parte da sociedade não se escandalize com PMs fazendo bico para pessoas envolvidas com o PCC. Diante desses fatos simbólicos, talvez até alguns venham a usar como mote para futuras campanhas eleitorais, a máxima de que bandido deve ser mesmo jogado da ponte para que não venham a incomodar as pessoas de bem.
*Luiz Henrique Campos
Jornalista.