“No auge do poder, não passa pela mente de nenhum déspota esta máxima que muitos deles já comprovaram no passado: quem com ferre, com ferro será ferido”, aponta o jurista Djalma Pinto
Confira:
Duas características são marcantes nos ditadores: a incapacidade de se colocar no lugar do outro e a volúpia em se apropriar do dinheiro e dos bens da população sob o seu jugo. São corrompidos pelo poder porque, como explica Stuart Mill, vendo-se o tirano adorado pelos cidadãos subjugados, “torna-se adorado de si mesmo, considerando-se no direito de ter o próprio valor contado cem vezes mais do que o valor de outras pessoas”. Imagina-se superior a todos, esquecendo-se que, como ele, os demais indivíduos sentem fome, sede e sofrem com o rigor do frio.
Por sentir-se acima das leis e dos seus aplicadores, todo tirano se considera liberado para apoderar-se dos valores pagos pelo povo a título de tributo. O caso, do ditador Bashar al-Assad demonstra a profunda distorção do caráter e o egocentrismo patológico desses psicopatas. Amealhou ele com sua esposa entre 1 bilhão e 2 bilhões de dólares, segundo levantamento do Departamento de Estado dos EUA feito em 2022. Destituído do cargo, nada mais justo do que o povo sírio rever todo o produto do assalto do qual foi vítima.
No auge do poder, não passa pela mente de nenhum déspota esta máxima que muitos deles já comprovaram no passado: “quem com ferre, com ferro será ferido”. O enforcamento, na rua, com auxílio de um guindaste, sem direito de defesa, de pessoa acusada de vinculação com o regime do ditador fugitivo, demonstra a intensidade do ódio extravasado por aqueles que sofreram ou tiveram parentes martirizados com suas atrocidades.
Esclarece a escritora francesa Véronique Chalmet que as autoridades despóticas, que matam e prendem quem lhes contraria, não se preocupavam com o que é certo ou errado − embora saibam perfeitamente a diferença. Ela considera isso “uma característica dos criminosos psicopatas”, concluindo que “ninguém nasce sendo um assassino. Esses ditadores cresceram em um ambiente coercitivo e quando alcançaram o poder, liberaram todo o ódio acumulado”.
A infância, com seus traumas e frustrações, tem um impacto relevante na deformação do caráter dos déspotas, por impedir-lhes a assimilação dos valores éticos. Por isso, não sentem eles constrangimento algum com o sofrimento de suas vítimas. Matam e se apropriam dos bens de seu povo com a maior naturalidade.
Aliás, sem qualquer respeito aos princípios constitucionais da probidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, muitos governantes desviam dinheiro público. Esse desapreço pelos bens da população decorre, no caso de muitos municípios brasileiros, dos exemplos legados por gestores do passado, que cultivaram a prática da corrupção. Estimularam essa distorção em familiares próximos e nos jovens, que neles se moldaram, por constatarem a ausência de qualquer sanção pelas ilicitudes praticadas.
Testemunharam seus seguidores, ao longo do tempo, a ausência de repressão sobre os indecorosos que enriqueceram, ilicitamente, na governança da Administração Pública. Passaram a conviver com a certeza da impunidade. Consolidou-se, por isso, a cultura do desvio das verbas. Na verdade, a grande responsável pelo atraso e pela pobreza de um povo, agraciado com a dádiva de viver em um país com invejável riqueza.
Djalma Pinto é advogado e autor de diversos livros, entre os quais, Ética na Política, Infratores no Poder, A Cidade da Juventude e outros