“Ao legitimar a matança policial como estratégia eleitoral, governadores como Castro corroem as bases da democracia liberal”, aponta o jornalista Eduardo Guimarães
Confira:
Em 29 de julho de 2019, o então vice-governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, visitou o empresário Flávio Chadud, dono da Servlog, empresa com contratos milionários junto à Fundação Leão XIII, ligada ao governo estadual.
Imagens de câmeras de segurança do Shopping Downtown, na Barra da Tijuca, capturaram o momento. Castro chega às 9h14 com uma mochila nas costas. Sobe ao escritório da empresa com Chadud às 9h26. Após cerca de uma hora, às 10h33, sai carregando a mesma mochila na mão esquerda.
O gesto de despedida parece casual, mas, no dia seguinte, 30 de julho de 2019, Chadud foi preso na Operação Catarata. A operação investigou desvios de até R$ 32 milhões na fundação.
Um delator, Bruno Selem, ex-funcionário da Servlog, revelou ao Ministério Público do Rio que a mochila continha R$ 100 mil em propina em espécie.
O valor faltou no cofre da empresa após o encontro. Castro negou veementemente; alegou que o conteúdo era chocolate para um amigo. E processou o delator por calúnia.
As imagens mostram o elevador e a saída com a mochila. As investigações avançaram nos anos seguintes. Em setembro de 2020, reportagens detalharam a delação de Selem, que apontava propinas recorrentes a Castro desde sua época de vereador.
Em 2022, novas revelações surgiram. Castro teria recebido propinas como vereador e vice-governador. A Polícia Federal entrou em cena em 2023 e 2024. Relatórios indicavam que o governador embolsou R$ 326 mil e US$ 20 mil em propina via Servlog.
O indiciamento de Castro por corrupção foi noticiado. O processo foi trancado no STF, mas o “fantasma da mochila” persiste.
Castro, porém, conseguiu virar o jogo com a megaoperação Contenção. Pesquisas de novembro registram sua aprovação em 40%, o maior índice desde 2021.
Com 57% dos cariocas apoiando a operação, Castro surfou na onda de truculência. Agora, está sendo comparado a Pablo Marçal — o outsider bolsonarista quase chegou ao segundo turno em São Paulo em 2024. Marçal atraía o eleitorado sedento por “lei e ordem”.
Foi nesse contexto de euforia que, em 6 de novembro de 2025, Castro se declarou “emancipado” do clã Bolsonaro. Afirmou a aliados que agora teria “luz própria” e poderia “voar solo” sem depender do ex-presidente ou do bolsonarismo.
Essa “independência” veio em meio a reviravoltas no Tribunal Superior Eleitoral. Em 5 de novembro, pedido de vista concedeu 30 dias a Castro para reavaliar sua defesa, o suficiente para empurrar o julgamento para 2026.
Mas essa emancipação de Castro não é libertadora. É o ovo da serpente chocando. Ao legitimar a matança policial como estratégia eleitoral, governadores como Castro corroem as bases da democracia liberal.
A igualdade perante a lei e a moderação estatal são as vítimas. Cláudio Castro virou “herói” após sua polícia matar geral. Há risco de virar novo Pablo Marçal; talvez a mochila da propina possa impedi-lo.
Castro é o mais novo candidato a Nayib Bukele, autocrata de El Salvador. O Crime da Mochila pode ajudar a parar outro corrupto truculento, ao melhor estilo Jair Bolsonaro, antes que rasteje até a Presidência da República no ano que vem.
Eduardo Guimarães é responsável pelo Blog da Cidadania