Com o título “Cenário Desafiador 2 – Prefeitura de Fortaleza”, Marcos C. Holanda, professor titular da Universidade Federal do Ceará, ex-presidente do Banco do Nordeste e fundador do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), dá continuidade ao artigo que veiculou, na última semana, no BlogdoEliomar, agora sobre a Prefeitura de Fortaleza.
Confira:
Os números da execução orçamentaria de Fortaleza em 2024 também mostram um cenário desafiador. A evolução segue o mesmo roteiro das contas estaduais. Retrato e filme não são bons.
Considerando os últimos dois anos as receitas correntes subiram 28%, mas as despesas correntes cresceram 35% indicando o mesmo problema estadual de dinâmica insustentável. Nas despesas correntes chama atenção o aumento de despesas de custeio que cresceram 39%, provavelmente muito influenciadas por gastos com saúde e subsídios ao sistema de transporte urbano. As despesas com pessoal evoluíram menos, 22%, mas ainda assim bem acima da inflação do período. Os investimentos subiram de forma significativa, passando de 780 milhões para 1,3
bilhões, um avanço de 66%. Aqui o alerta de sempre, importante não é investir muito, mas investir bem.
O resultado das dinâmicas de receitas e despesas é uma forte piora do saldo do orçamento que passa de um superávit de 108 milhões para um déficit de 818 milhões. Déficit significa aumento de dívida e essa passa de 2,9 bilhões para 4,6 bilhões. Prefeitura segue o mesmo roteiro do estado aumentando investimento via contratação de mais dívida. Na verdade, essa estratégia foi facilitada e mesmo incentivada pelo governo federal que facilitou critérios para contratação principalmente via bancos públicos. O problema é que faltou uma análise mais competente do cenário macro, já
que esse indicava juros mais elevados, desvalorização cambial e aumento de incertezas com redução de prazos. O resultado é um aumento dos gastos com juros e amortizações de 162%, que passaram de 283 milhões para 743 milhões. Ressalto uma observação que já fiz que é incorreto qualificar de rombo fluxo futuro de pagamento de dívida. Estado, por exemplo, tem um fluxo programado até 2027 de 10 bilhões e isso não significa um rombo dessa magnitude.
O que fazer? Não é desejável, nem a população aceita o caminho de aumento de impostos. O caminho é pelo lado das despesas. Primeiro, cuidado com a solução fácil de contratar dívida nova para pagar dívida antiga. Em um cenário de juros altos no mundo e Brasil isso é possível? A opção por empréstimos externos é realmente mais barata, considerando a volatilidade do câmbio e altos custos de hedge no Brasil? Segundo, entender que a evolução de gastos de custeio é insustentável. Aqui um problema a ser enfrentado é a distorção do IJF está dentro da estrutura de gastos da prefeitura. Terceiro, tem que fazer uma reforma administrativa relevante que aceite a realidade de uma estrutura inchada e ineficiente. Preocupa notícia nos jornais que um
primeiro movimento da atual administração seria a criação de mais três nova secretarias. O caminho é exatamente o inverso. Quarto, antes de investir fazer uma análise rigorosa de custo/benefício. Quinto, antes de contratar novos servidores melhorar a produtividade dos atuais. Sexto, embarcar na onda de governo digital e uso da IA. A economia mais rica do mundo está
criando um ministério de eficiência do governo. Por que estado e prefeitura não fazem o mesmo?
Um aprendizado que tenho é que no governo fazer o obvio é um grande desafio. Ajustar as contas públicas que estão em trajetória insustentável é inadiável e o caminho é pelo lado das despesas. Esse é o obvio a ser enfrentado.
*Marcos C. Holanda
Professor titular da Universidade Federal do Ceará, ex-presidente do Banco do Nordeste e fundador do Instituto de Pesquisas e restratégias Econômicas do Ceará (IPECE).