Há alguns dias caiu-me nas mãos um exemplar de um “Album Illustrado da Parochia de Canindé”, em razoáveis condições de manuseio, apesar da idade. Publicado pela Tipografia da Casa de São Francisco, em 1927, a obra coletiva é uma “homenagem de justa gratidão e respeito da Parochia de Canindé ao seu milagroso padroeiro São Francisco das Chagas, por ocasião do jubileu do VII centenário da sua gloriosa morte em Assis.” Com apresentação feita pelo Frei Pedro Sinzig, contém informações centradas na ação da Igreja em Canindé, mas os redatores do Álbum não se eximem de registrar a situação da cidade, de vilas e distritos, de detalhes sobre infraestrutura, situação da mobilidade nas vias de acesso à cidade e ao santuário já então reconhecido no Brasil e em outros países como um local de peregrinação. A referência a essa obra se faz necessária para duas observações. Uma é a constatação de que a gráfica da Paróquia era qualificada para época, uma vez que o livro é bem estruturado, bem encadernado, bem composto. Em segundo lugar, nota-se com clareza o fato de que o “poverello” de Assis perdeu a qualificação gentílica da cidade onde nascera, para a cidade encravada nos nossos sertões. As camadas humildes e devotas da população quase não conhecem São Francisco de Assis. O santo milagroso que lhes atende as preces é São Francisco das Chagas de Canindé, em torno de cuja capela surgiu e cresceu a urbe que hoje é local de romaria, o segundo maior santuário franciscano do mundo, para o qual acorrem romeiros de todo o mundo.
Canindé é, sem dúvida, uma cidade privilegiada. Grávida de religiosidade, tem também uma história em que assoma o viés intelectual de alguns de seus filhos, entre os quais destaco o poeta Cruz Filho, que foi o segundo Príncipe dos Poetas Cearenses; o historiador Hélio Pinto Vieira, que foi meu confrade na Sociedade Cearense de Geografia e História-SCGH. Por agora, ainda militantes do trabalho intelectual e da pesquisa histórica, registre-se os nomes do Padre Neri Feitosa, filho adotivo do município e fundador do Instituo Memória de Canindé; e do historiador Augusto César Magalhães Pinto, que recentemente fez publicar uma segunda edição ampliada de obra pujante pela abrangência do conteúdo, subordinada ao título “Viagem Pela História de Canindé – um ensaio cronológico e iconográfico dos primórdios aos dias atuais.” Com efeito, trata-se de um trabalho enciclopédico resultante de aprofundada pesquisa, que está enfeixado em mais de 800 páginas ilustradas com rica iconografia. César Magalhães conhece como poucos a história de Canindé. Os fatos passados ele os conhece mercê da garimpagem que realiza com espírito beneditino; os contemporâneos, porque é ele próprio observador e testemunha ocular de uns e mesmo protagonista de outros. Essa alentada obra, de inestimável valor para estudantes, estudiosos e pesquisadores da história de nossas glebas interioranas, situa-se em lugar de destaque entre as muitas que conheço. Canindé está ali por inteiro: a política, a economia, a sociedade, a religião, e mesmo aspectos fungíveis do cotidiano ganham seu registro no conjunto da obra. “Viagem Pela História de Canindé” honra o autor e, indiscutivelmente, constitui jóia da historiografia cearense que não deve faltar em mãos de bibliófilo que se preze.
Barros Alves é jornalista, poeta e assessor parlamentar