“O que importa para muitos hoje é abraçar qualquer oportunidade de oferecer o que possa parecer, a rigor, uma ‘derrota’ ao governo. Mesmo que, na prática, isso represente uma derrota ao próprio País”, aponta o jornalista Valdélio Muniz
Confira:
Fazer oposição a determinados governos é um direito próprio da democracia e, por vezes, até mesmo necessidade. Quando feita com responsabilidade e sincera preocupação com o País, a oposição se torna digna de todo respeito e admiração. Pode ser salutar e útil ao próprio detentor do poder pelo olhar atento, divergente e diferenciado que oferece às suas ações. Mas, nada pior do que uma oposição que age movida exclusivamente pelo anseio de poder, que subestima a inteligência dos cidadãos e que se move em tudo com preocupação em atender aos próprios interesses e daqueles que os financiam e apenas travestem suas opções em pseudocompromisso com a nação. Mais honesto seria, logo, admitir suas reais motivações, o que não fazem, por óbvio, por temer as consequências eleitorais.
É o que temos visto repetidamente com a bancada oposicionista da atual composição da Câmara dos Deputados, indiscutivelmente, uma das piores da sua história. O nível de despreparo e de cinismo de alguns dos seus líderes é tamanho que não demonstram sequer o mínimo cuidado com a coerência entre seus atos. O que importa para muitos hoje é abraçar qualquer oportunidade de oferecer o que possa parecer, a rigor, uma “derrota” ao governo. Mesmo que, na prática, isso represente uma derrota ao próprio País. Dudu bananinha é apenas um dos vários exemplos.
A lição das ruas no caso recente da PEC da Bandidagem, embora tenha sido assimilada claramente pelo Senado, parece não ter provocado o eco necessário aos ouvidos da bancada na Câmara, talvez porque já se tornou, de fato, imune a qualquer barulho que não seja o próprio. Ao final, é apenas isso que a ela importa. Como diria um certo personagem de um antigo programa humorístico, “o povo é só um detalhe”, o que vale também, na visão deles, para a tal opinião pública.
Um certo líder, que, assim como o outro inominável-mor, não merece sequer ter seu nome promovido (escrito ou pronunciado), mas que está constantemente se aproveitando dos holofotes, tem dito repetidamente que o governo não faz seu dever de casa de conter gasto. Certamente, considerando a experiência do governo anterior ao qual esteve e permanece alinhado, tudo que é aplicado em programas e políticas sociais, para ele, há de ser visto apenas e tão somente como gasto, e não como investimento em pessoas vulneráveis ou restituição de um mínimo de dignidade, afinal, para essa corrente de oposição, somente são merecedoras de dignidade as instituições financeiras, as big techs, as pretensas igrejas, a indústria bélica, o agronegócio e as casas de apostas eletrônicas.
Fala em corte de gastos, mas não se dispõe, para reduzir os gastos, a abrir mão, como exemplo, das emendas parlamentares a que fazem jus os integrantes de sua bancada. Ou seja, cortem os “gastos” dos outros, mas preservem os que interessam aos nobres “colegas”. Faça o que digo, mas não naquilo que o Parlamento exige que lhe seja garantido.
Não há sequer um registro de discurso ou mesmo de entrevista destes tais líderes em que se veja o reconhecimento da melhoria do posicionamento do País no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), nem da redução expressiva do número de miseráveis, tampouco dos recordes na queda do desemprego. É pecado ou honestidade reconhecer o que há de bom? Ah, vão dizer, isso cabe à bancada da situação. Mas divirjo: antes de qualquer posicionamento político, há de se exercer um papel de cidadão. Para a crítica ser justa, é conveniente que seja pelo menos fundamentada, que se apontem erros, mas se aplaudam os eventuais acertos.
Se o governo resolver insistir, por desespero ou necessidade para fechar as contas, na ideia de elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), como já tem cogitado, com possibilidade de atingimento de uma parcela maior de contribuintes, a mesma oposição se fará de boazinha e protetora dos “pobres”, apresentando novamente o governo como vilão ou algoz, pouco importando se ela, no Legislativo, teve oportunidade de transferir a conta a quem de fato poderia pagar, mas preferiu poupá-los com dó e piedade injustificáveis.
Cada oportunidade de “passar vergonha” é recebida com empolgação verbal. Ou vista como forma de tirar vantagem, ainda que o custo de tudo isso se dê não apenas para o governo, mas para o País, nele incluídos até mesmo os simpatizantes e eleitores que os puseram em seus respectivos mandatos.
Valdélio Muniz é jornalista, analista judiciário, Mestre em Direito Privado, professor da Fadat e membro do Grupo de Estudos em Direito do Trabalho (GRUPE) da UFC