Com o título “Crise do PDT: Por que Cid entrou na briga?”, eis artigo de Ricardo Alcântara, escritor e publicitário. Ele aborda personagens envolvidos no conflito interno do pedetismo do Ceará, que virou uma novela cheia de emoções e surpresas. Confira:
Cid Gomes estava com o burro na sombra: senador da República, líder de seu partido na casa, depois de cumprir dois mandatos consecutivos como governador para, em seguida , fazer seu sucessor. De repente, decidiu morder a isca da discórdia e entrou numa briga feia – Sim, aquilo não é luta, é briga mesmo, e com roupa doméstica lavada na calçada.
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Seu objetivo declarado, o controle do diretório estadual do PDT e a consequente formalização de apoio ao governo estadual como meio de se preservar como bloco e, por consequência, manter a força política que o partido tem. Logo ele, que já coleciona um rosário de siglas em sua biografia.
Por essa paixão tardia, o senador se expôs a um desgaste emocional muito alto, obrigado que foi a ver seu próprio irmão, Ciro Gomes, pegar o microfone diante da audiência ampla de um encontro nacional para pedir sua cabeça e, logo em seguida, acusar o governo de seus aliados de não comprar sequer um prego sem pegar propina. É osso.
Quem já vem de longe é levado a se perguntar: tudo isso por amor à camisa do trabalhismo? Não, né? A resposta talvez possa ser mapeada a partir de dois momentos recentes, relacionados com a sucessão turbulenta da sua cria política e aliada, a governadora Izolda Cela.
No primeiro momento, para não agravar um conflito familiar que já se anuncia pesado, Cid se omite quase por completo no curso turbulento de uma sucessão estadual. No momento seguinte, o grupo político com que se articula obteve, a despeito de sua ausência no campo de disputa, uma vitória esmagadora logo no primeiro turno.
A combinação de ambos – ele recua, o projeto avança – colocou seus pés na direção do poente e consolidou, com grande centralidade, a liderança, hoje bem maior, de outro senador, o agora ministro da Educação Camilo Santana. Em suma, um sucesso eloquente foi obtido com seu apoio, mas sem a sua colaboração ostensiva.
O nome desse velho filme é “O Tempo Não Para”. Quando busca ter a pulso as rédeas de um partido minado, o que Cid deseja, de fato, é estancar o declínio de seu protagonismo e a um custo, repito, absurdo para quem já foi general da banda por tanto tempo. A crua verdade é que nem ele, nem ninguém, lidera, no sentido genuíno do termo, essas dezenas de prefeitos do PDT.
O que essa turma é mesmo é governista – porque os governos mudam, mas o governismo não se desloca. Os inquilinos mudam, mas os gatos de casa são os mesmos. São adeptos do Poder do qual Cid participa, mas já não mais controla. Camilo e Elmano já os teriam cooptado para o abrigo de suas legendas de sustentação – PT e PSB – e se não o fazem é por razão objetiva: Ora, por que tomar o que já se tem? Melhor fazer o que proclama o frevo: “deixa sangrar”.
Mesmo esses ¾ de governistas da bancada estadual do PDT, à exceção de sua irmã Lia Gomes e algum outro, estão hoje embarcados sem volta na fragata de Camilo e Elmano. É o poder. Cid o teve e conhece muito bem a potência dessa máquina de conquistar simpatias.
Ontem mesmo, alguém próximo a eles, os Ferreira Gomes, observou: “Cid sempre venceu pelo pragmatismo. Nunca fez apostas de alto risco. Tudo que ganhou, ganhou bem. A aventura de agora não é de seu estilo”. Cabe completar: atuando fora de seu estilo, qualquer um de nós é um ser indefeso ou, na melhor hipótese, vulnerável.
Esse Cid que agora sai no tapa para impor seu espaço não é o Cid que até aqui levou todas. Mas a pergunta persiste: levará mais essa? A resposta não virá tão imediatamente. A disputa é jogo de ida e volta. 2024 dirá.
*Ricardo Alcântara,
Escritor e publicitário.
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O relato mais honesto e exato sobre o episódio.Ricardo Alcântara é um craque.