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“Datacenters de IA no Ceará: estratégia para negociação, governança e desenvolvimento sustentável” – Por Mauro Oliveira

Mauro Oliveira é PhD em Informática por Sorbonne. Foto: Arquivo Pessoal

Com o título “Datacenters de IA no Ceará: estratégia para negociação, governança e desenvolvimento sustentável”, eis artigo de Mauro Oliveira, doutor em Informática pela Universidade de Sorbonne. Foi Secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações em 2003. “O Ceará reúne credenciais únicas para se projetar como referência nacional em IA, alinhado ao PBIA e apoiado em inovação, educação e energia limpa. Negociar bem é a chave para transformar infraestrutura em protagonismo tecnológico e desenvolvimento territorial permitindo que o Estado deixe de ser apenas receptor de infraestrutura e se torne protagonista da soberania digital brasileira”, expõe o articulista.

Confira:

A chegada de datacenters de Inteligência Artificial (IA) ao Ceará pode representar uma oportunidade singular para ampliar a base econômica, científica e social do Estado, acelerar sua transformação digital e fortalecer a soberania tecnológica brasileira.

Essa oportunidade se apoia em ativos distintivos que posicionam o Ceará como Estado competitivo: matriz energética renovável, centralidade atlântica estratégica, entrada internacional de cabos submarinos, universidades e centros de PD&I de excelência, e um ecossistema de inovação em expansão.

Investimentos intensivos em capital têm historicamente catalisado desenvolvimento quando integrados a estratégias claras de sustentabilidade, formação de talentos, inovação e inclusão social. Por isso, a questão central é como garantir que datacenters de IA produza benefícios concretos para o povo cearense.

Atrair datacenters estrategicamente exige, portanto, negociar sua implantação com visão econômica, ambição social e inteligência coletiva, assegurando que sua presença se converta em importantes contrapartidas: conhecimento científico e tecnológico, qualificação profissional e desenvolvimento social e econômico regional.

Este documento propõe diretrizes para apoiar políticas públicas capazes de fazer da IA um vetor de desenvolvimento econômico, educação científica e tecnológica, impacto social, preservação ambiental e autonomia digital no Ceará.

A seguir, dez diretrizes para negociação, governança e desenvolvimento sustentável na instalação de datacenters no Ceará:

1. Datacenters como vetores de futuro e desenvolvimento sustentável

Datacenters de IA demandam muita energia e água. A matriz energética limpa e renovável do Ceará pode permitir transformar essa infraestrutura em desenvolvimento: modernização das redes elétricas, expansão de renováveis, criação de um polo de Ciência Aplicada e Tecnológico em IA (CATIA), qualificação profissional e dinamização de cadeias produtivas locais.

2. A oportunidade global e o papel estratégico do Ceará

A economia digital reposiciona regiões dotadas de energia limpa e conectividade internacional. O Ceará pode evoluir de simples base física de hub de processamento para um polo de Ciência Aplicada Tecnologia e inovação em IA (CATIA), convertendo vantagens comparativas em competitivas: aumentando sua capacidade computacional instalada, pesquisa local, empregos qualificados e retenção de valor no território a partir de contrapartidas negociadas.

3. Incentivos fiscais como alavanca, não como fim

O REDATA cria forte atratividade para grandes players internacionais. O PBIA preconiza uma “IA para o bem de Todos”. O desafio estratégico é transformar essa atratividade em contrapartidas que assegurem efeitos sociais, educacionais e tecnológicos amplos. Incentivos atraem; políticas bem negociadas transformam.

4. Indução industrial e tecnológica: o valor da contrapartida

Embora parte relevante do CAPEX seja composta por equipamentos importados, contrapartidas podem converter infraestrutura em desenvolvimento em IA, por meio da:

– criação de um polo de Ciência Aplicada Tecnologia e Inovação em IA (CATIA)
– ampliação de programas de P&D com universidades, IFCE e Sistema S
– aumento da formação técnica e superior especializada no Estado;
– fortalecimento de fornecedores e serviços locais;
– apoio a startups e parques tecnológicos existentes e em construção;
– garantia jurídica da infraestrutura energética, digital e social duradoura nas comunidades do entorno, bem como no trato das questões ambientais acordadas.

A combinação equilibrada entre atração de investimentos e qualidade da contrapartida define o legado.

5. Datacenters como ativos geoeconômicos

Datacenters já compõem agendas diplomáticas e estratégias internacionais. O Ceará deve atuar com protagonismo nessa arena, usando esses investimentos como plataforma para acordos científicos, tecnológicos e ambientais, integração às cadeias globais de inovação e ampliação de sua influência geoeconômica.

Infraestrutura é ponto de partida; negociação inteligente é o diferencial que gera protagonismo regional.

6. Empregabilidade qualificada e formação de talentos locais

Além do exposto nos itens 4 e 5, acima, que tratam de uma política geral, cada implantação de datacenter deve estar vinculada a contrapartidas locais:

– cessão local de bolsas de residência tecnológica para jovens do ensino médio e universitários;
– criação de programas de formação em IA, cibersegurança e computação avançada, vinculados ao CATIA;
– idem para certificações e intercâmbios internacionais com jovens da comunidade envolvida;
– promoções sociais, culturais e ambientais que envolvam a participação direta de universidades, Institutos Federais e Sistema S.

Essas ações consolidam o Ceará também como protagonista da política nacional de IA.

7. Transparência, governança e inovação aberta

A confiança pública e a maximização de benefícios exigem mecanismos claros de transparência e governança, tais como:

– indicadores públicos de impacto energético e hídrico;
– auditorias periódicas independentes;
– divulgação transparente das contrapartidas e metas;
– participação ativa de universidades, entidades de TIC e sociedade civil.

Transparência não é detalhe, é condição estruturante para que investimento privado gere bem público.

8. Planejamento energético e ambiental de longo prazo

Datacenters de IA exigem severo planejamento energético, hídrico e ambiental. Este planejamento representa avanço da economia azul e conta com apoio de plataformas digitais de monitoramento ambiental, como gêmeos digitais do oceano e do território.

Negociar com visão de futuro significa conectar infraestrutura à ciência, sustentabilidade e inovação aplicada.

9. Sobre a questão Ambiental

Assim como no item 6, cada instalação de datacenter de IA deve estar vinculado a metas ambientais objetivas, assegurando que o uso intensivo de energia e, quando aplicável, de água, resulte em retornos socioambientais reais para o território.

Recomenda-se:

– metas verificáveis de eficiência e reuso hídrico, reduzindo dependência de água potável;
– compensação ambiental proporcional ao impacto local;
– investimento adicional em geração renovável no Estado, ampliando capacidade instalada;
– apoio a pesquisas ambientais e monitoramento ecossistêmico contínuo;
– criação de observatório ambiental digital com dados públicos, incluindo consumo, emissões e reaproveitamento energético.

Assim, datacenters de IA deixam de ser apenas consumidores e se tornam vetores de sustentabilidade e inovação verde.

10. Soberania digital e protagonismo regional

O Ceará reúne credenciais únicas para se projetar como referência nacional em IA, alinhado ao PBIA e apoiado em inovação, educação e energia limpa. Negociar bem é a chave para transformar infraestrutura em protagonismo tecnológico e desenvolvimento territorial permitindo que o Estado deixe de ser apenas receptor de infraestrutura e se torne protagonista da soberania digital brasileira. Para tanto, é fundamental a participação, em todas as etapas, da academia e de entidades representativas.

Neste contexto a criação de um polo de Ciência Aplicada Tecnologia e Inovação em IA (CATIA) funcionaria também como um observatório das estratégias aqui propostas.

Síntese final

O Ceará precisa atrair capital, tecnologia e conhecimento mas, sobretudo, transformá-los em valor social, científico e ambiental. Datacenters de IA não devem ser apenas infraestrutura; podem ser uma oportunidade histórica para inaugurar um novo ciclo econômico, capaz de posicionar o Estado na vanguarda da Inteligência Artificial nacional.

Com estratégia, transparência e contrapartidas bem negociadas, e com a participação ativa de universidades, entidades representativas e sociedade civil, este movimento pode tornar um plano de governo em um projeto de Estado com um futuro diferenciado para o Ceará: estruturante, duradouro e ancorado em inovação, ciência, tecnologia e bem estar social.

*Mauro Oliveira

Doutor em Informática pela Universidade de Sorbonne. Foi Secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações em 2003.

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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