“Aprendi com o avô que o respeito pelos caprichos divinos da fé é parte do nosso equipamento civilizatório”, aponta o cientista político Paulo Elpídio de Menezes Neto
Confira:
De algumas lembranças dissimuladas por mera conveniência.
Faltou-me, devo confessar, a reserva de fé e contrição de que as pessoas geralmente se servem.
Esse descaso imperdoável não me levou, entretanto, ao desrespeito pela fé alheia. Aprendi com o avô que o respeito pelos caprichos divinos da fé é parte do nosso equipamento civilizatório. Religião é cultura, dir-se-ia, “bon gré, mauvais gré”…
Noivo de moça católica, com quem construí nosso mundo de esperanças, acompanhava-a à missa do domingo, para dar-lhe alegria e demonstrar-lhe quão tolerante era.
Certa feita, no momento da elevação, guardei o que de mais respeito poderia mostrar – permaneci respeitosamente de pé. O ministro celebrante, dominado pelos apelos de uma catequese antiquada, interrompe o ritual e ordena, com os olhos cravados em mim:
“Ajoelhe-se!”
Sustentamos o olhar diante de tantos fiéis, durante o tempo que lhe pareceu suficiente para retomar o gestual e a fala do ato de consagração.
Zuleide apertou-me o braço em íntima solidariedade, com a cumplicidade que não nos tem faltado por todos esses anos bem contados.
Paulo Elpídio de Menezes Neto é cientista político, professor, escritor e ex-reitor da UFC