“Jogar toda a culpa sobre essas plataformas ignora o papel central das instituições públicas no combate ao crime”, aponta o ex-superintendente da Polícia Civil do Ceará, César Wagner
Confira:
Nos últimos meses, parte significativa da mídia “oficial” tem promovido uma narrativa alarmista, retratando as redes sociais como “territórios livres” para práticas criminosas como tráfico de drogas, armas, abusos contra crianças e disseminação de preconceitos. Embora seja inegável que essas plataformas possam ser usadas para fins ilícitos, é equivocado e até perigoso tratá-las como as principais culpadas por problemas que, na verdade, têm raízes mais profundas na sociedade.
Em primeiro lugar, é importante considerar que as redes sociais são reflexos das interações humanas. O mesmo espaço que permite a comunicação global, o debate de ideias e a educação, infelizmente, também pode ser utilizado para práticas condenáveis. Contudo, jogar toda a culpa sobre essas plataformas ignora o papel central das instituições públicas no combate ao crime. Problemas como tráfico de drogas e abusos contra crianças são, antes de mais nada, questões que exigem ações efetivas de inteligência policial, fortalecimento do sistema jurídico e campanhas de conscientização.
Além disso, uma narrativa que aponta as redes sociais como vilãs desconsidera os esforços que muitas dessas plataformas já vêm fazendo para combater atividades ilegais. Empresas como Meta, Google e outras têm investido bilhões em tecnologias de inteligência artificial e equipes de moderação para identificar conteúdos contratados, colaborar com autoridades e proteger usuários. Há falhas, claro, mas a responsabilidade é unilateralmente injusta e contraproducente.
Outro aspecto preocupante é que essa retórica pode servir como justificativa para censura e controle excessivo do discurso online. Ao invés de promover uma internet mais segura, medidas arbitrárias podem sufocar a liberdade de expressão, prejudicando vozes que usam essas plataformas para denunciar abusos e promover mudanças sociais. O equilíbrio entre regulação e liberdade é crucial e não pode ser sacrificado em nome de um combate mal planejado ao crime.
A solução para os problemas apontados não passa por demonizar as redes sociais, mas sim por uma abordagem mais integrada. Isso inclui parcerias entre empresas de tecnologia, governos, organizações não governamentais e sociedade civil, fortalecendo ações de prevenção, denúncia e responsabilização. Além disso, é fundamental que a mídia trate o tema com mais profundidade, evitando discursos simplistas que apenas desviam o foco das verdadeiras causas desses crimes.
As redes sociais são ferramentas poderosas e, como qualquer tecnologia, precisam ser usadas com responsabilidade. Contudo, colocá-las como bodes expiatórios para problemas sociais apenas mascara a ineficácia das políticas públicas e reforça a desinformação. É hora de enfrentar essas questões com maturidade e estratégia, sem recorrer a narrativas simples que só agravam a polarização e a desconfiança entre cidadãos e instituições.
César Wagner é ex-superintendente da Polícia Civil do Ceará, ex-coordenador-geral da Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (CIOPS), ex-diretor do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), ex-diretor do Departamento de Polícia do Interior (DPI) e ex-delegado Titular da Delegacia de Combate ao Narcotráfico. Ex-secretário de Segurança de Aracati. Formado em Direito (Unifor) e especialista em Direito Processual Penal (Unifor). Comunicador, radialista, palestrante e consultor de empresas na área de prevenção de comportamentos irregulares