“Eles imaginavam que haviam tomado o poder”

Rui Leitão é jornalista, historiador e membro da Academia Paraibana de Letras. Foto: Reprodução

Com o título “Eles imaginavam que haviam tomado o poder”, eis artigo de Rui Leitão, jornalista, historiador, escritor e membro da Academia Paraibana de Letras. “O 8 de janeiro não pode ser visto como um ato isolado. Ele expressa o sentimento antidemocrático que orienta o ativismo da extrema direita em nosso país”, expõe o articulista.

Confira:

Não há outra explicação para o clima de euforia dos vândalos que atacaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro de 2023: eles imaginavam ter tomado o poder. A certeza era tanta que decidiram gravar vídeos, produzindo provas dos próprios crimes. Acreditavam na impunidade porque julgavam que o golpe estava deflagrado. As mensagens propagadas nas redes sociais explicitavam essa convicção. O episódio representava o lance final, decisivo, de um movimento que articulava um golpe de Estado desde a derrota da direita na eleição presidencial de 2022. O nefasto ataque causou graves danos materiais aos três Palácios, incluindo vidros quebrados, obras de arte destruídas, móveis danificados e até incêndios.

Ao atacar os símbolos da República, os golpistas evocavam uma ditadura militar, com o objetivo de desencadear uma revolta popular que justificasse a assinatura de uma GLO – Garantia da Lei e da Ordem –, permitindo a ocupação das ruas pelo Exército. Na prática, isso representaria a destituição do governo legitimamente eleito e empossado em 1º de janeiro. Aquela massa, em estado de exaltação extrema, assumiu a missão que lhe foi atribuída nos acampamentos em frente aos quartéis das principais cidades do país: profanar os símbolos da nossa democracia e promover um espetáculo deprimente que inviabilizasse o governo Lula.

Aqueles que se autodenominavam “patriotas” foram incentivados a repetir a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos. Felizmente, o tiro saiu pela culatra. O assalto a Brasília foi rechaçado pelas instituições republicanas, garantindo a governabilidade do presidente recém-empossado e consolidando uma vitória da democracia brasileira. É essencial que essa data seja sempre lembrada como uma tentativa de ruptura institucional para pretextar uma intervenção militar e instaurar um Estado de Exceção.

O 8 de janeiro não pode ser visto como um ato isolado. Ele expressa o sentimento antidemocrático que orienta o ativismo da extrema direita em nosso país. Fotografias, vídeos e trocas de mensagens entre extremistas comprovam que tudo foi premeditado e organizado. Não se tratou, portanto, de uma ação espontânea. A mobilização golpista está evidenciada em uma convocação feita por Ana Priscila Azevedo, uma das lideranças do movimento, durante uma live em frente ao Quartel-General de Brasília, na qual declarou: “Nós vamos colapsar o sistema, nós vamos sitiar Brasília, nós vamos tomar o poder de assalto, o poder que nos pertence”. Outra manifestante, Aline Magalhães, tomada pelo clima de arrebatamento, publicou nas redes sociais um vídeo em que dizia: “Não tem Dubai, não tem Paris, não tem viagem que eu tenha feito na vida que seja melhor do que esse dia que eu sonhei tanto, que a gente ia tomar isso aqui”.

A denunciada Débora Rodrigues, a quem estão atribuindo o único crime de ter pichado a estátua da Justiça, também gravou um vídeo em frente ao Congresso, gritando: “Acabou a palhaçada. A gente só sai daqui com o Exército. E intervenção militar é o que a gente pede. Pronto. Não tem recuar. A gente não vai sair daqui”. Eles acreditavam, verdadeiramente, que isso pudesse acontecer.

*Rui Leitão

Jornalista, historiador, escritor e membro da Academia Paraibana de Letras.

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