Em relatório recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os dados da Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílios (PNAD) de 2023, mostram o Estado do Ceará como o terceiro estado da Federação com maior percentual da sua população vivendo abaixo da linha da pobreza. Aqui, quase metade da população, mais precisamente 48,7% de toda a nossa gente, está tristemente vivendo abaixo da linha da pobreza. Nesse quesito, ganhamos apenas dos estados do Acre e do Maranhão.
Um outro relatório, publicado na última semana pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/IBRE) identifica que, após a pandemia, tem acontecido uma progressiva redução da extrema pobreza em todos os estados do Brasil. Resultado da própria retomada da economia que ficou comprometida durante a pandemia, como também pelo aumento do valor do auxílio emergencial.
Entretanto e lamentavelmente, de todos os estados do Nordeste brasileiro, foi o Ceará que teve a menor redução da extrema pobreza, demonstrando a fragilidade das nossas políticas de proteção social. Aqui, tanto a pobreza como as desigualdades regionais tem se aprofundado em relação a outras regiões do País.
Nosso Estado que já se viu ser exemplo pela força vigorosa de políticas públicas bem construídas e implantadas, pela coragem de lideranças políticas que tinham o Ceará e tendo a nossa gente como a sua maior causa, agora se surpreende, de novo, com os retrocessos.
O Ceara que já foi farol para o Brasil de governança e austeridade, como também de luta pela superação da pobreza rural, da mortalidade infantil e do analfabetismo, assiste agora a uma piora profunda de todos os nossos indicadores sociais e econômicos.
Mas o mais grave, de longe, é assistir o retorno do Ceará à “zona de rebaixamento” da pobreza dentre todos os estados brasileiros, sem que haja uma profunda mudança de atitude por parte do Governo do Estado.
A gestão do FECOP (FUNDO ESTADUAL DE COMBATE À POBREZA) é só mais um exemplo. Durante a última campanha para o Governo do Estado, denunciei a politização e o desvio de finalidade do uso desses recursos. Muitas vezes usado para complementar o orçamento de políticas de outras secretarias sem qualquer repercussão no enfrentamento à pobreza ou mesmo, o que é pior, para fazer clientelismo político.
A consequência direta disso é o agravamento das condições de pobreza e desigualdade no Ceará, comparado ao Brasil.
Mas tem uma outra coisa que merece destaque. A queda das receitas do FECOP que acontecem sem que o Governo do Estado reaja para aumentar, ou pelo menos reaver, os já limitados valores arrecadados pelo fundo.
É preciso registrar, entretanto, que esses recursos são vinculados a arrecadação do ICMS.
Mesmo assim, nada impede que o Governo do Estado aumente seus gastos próprios nessas ações de enfrentamento a pobreza.
Pois bem, olhem os seguintes números de recursos disponíveis no FECOP, ano a ano, ao longo dos últimos períodos:
ANO RECEITA
2021 R$ 565.262.331
2022 R$ 616.519.689
2023 R$ 570.703.543
2024 (previsão LOA) R$ 340.000.000
(com a previsão de R$ 60 milhões de redução, chegará a R$ 280 milhões)
Isso mesmo, exatamente durante esse atual governo do Partido dos Trabalhadores (PT), em que foi prometido que o alinhamento partidário entre Governo Federal e Governo Estadual renderiam “supostamente” uma maior assistência a quem mais precisa, é que o FECOP vê cair, significativamente, sua dotação orçamentária sem que haja recomposição de recursos por parte do Governo do Estado para enfrentar a pobreza crescente em nosso Estado.
Tem mais, já há um indicativo oficial do Governo do Estado que haverá uma redução de mais R$ 60 milhões na previsão original do orçamento deste ano, que já é, de longe, o mais baixo dos últimos anos.
O orçamento do FECOP ficaria assim em R$ 280 milhões em 2024, menos da metade do valor do ano passado. Se os indicadores de pobreza do Ceará já indicam que o volume de recursos e a natureza das políticas públicas não tem sido capazes de mudar essa realidade, o que dizer agora?
É preciso não só que o Governo do Estado garanta a recomposição dos recursos do FECOP e das ações de enfrentamento à pobreza, como também, que crie mecanismos legais para o seu crescimento orçamentário ano a ano, independente das variações de arrecadação vinculadas para o fundo. Além disso, é necessário um olhar mais crítico e bem fundamentado sobre o impacto dessas políticas e ações para a redução efetiva da pobreza. É imprescindível que estejamos vigilantes para que não haja espaço para a politicagem e para o clientelismo em uma ação tão nobre e tão necessária quanto é essa do combate à pobreza para o povo cearense!
Roberto Cláudio é médico e ex-prefeito de Fortaleza