Categorias: Artigo

Emoções na Serra da Capivara e na Serra das Confusões, no Piauí

Flamínio Araripe é jornalista

Com o título “Emoções na Serra da Capivara e na Serra das Confusões, no Piauí”, eis um relato da viagem feita pelo jornalista Flamínio Araripea este estado nordestino. Sem dúvida, uma boa opção para quem quer desfrutar da natureza.

Confira:

O que pensar ao ver pela primeira vez, gravada na rocha, a beleza das pinturas de 6 mil a
12 mil anos e até 34 mil anos, preservados no Parque Nacional Serra da Capivara, no
Piauí? Examino os traços dos artistas da pré-história enquanto percorro uma das
passarelas de madeira construídas diante dos paredões de arenito, que conservam
sequências de imagens da caça, cervos, peixes, capivara, dança, árvores, sexo, a cena do
primeiro beijo. Não consigo conter a emoção.

Sinto com os olhos marejados de lágrimas a força da arte criada pelos povos anteriores aos
indígenas que os portugueses encontraram no Brasil de 1.500. Imagino a vida na sociedade
remota. Há muitas perguntas endereçadas à imensidão do tempo pré-histórico. As
respostas são dadas por estes sítios de inscrições rupestres, portais para o diálogo da
ciência com o passado remoto e o nosso tempo.

Respostas sobre esta fase da história da humanidade vieram dos estudos arqueológicos de
Niède Guidon. Esta cientista visionária revolucionou o conhecimento sobre a presença do
homem com inteligência na América. Evidências científicas de achados arqueológicos
encontradas no Piauí datam de cerca de 33 mil anos, 58 mil anos e 100 mil anos. Antes
disso, estudos de cientistas norte-americanos sustentavam que o homem veio da Ásia para
a América há cerca de 13 mil anos, pelo estreito de Bering.

Patrimônio Cultural da Humanidade

O Parque Nacional Serra da Capivara, com 129.140 hectares, é Patrimônio Cultural da
Humanidade (Unesco, 1991). Constitui uma unidade de conservação federal desde 1979,
gerida pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Ministério
do Meio Ambiente e Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham).
Niède Guidon iniciou as pesquisas nesta região do Piauí em 1973. Em mais de 40 anos de
pesquisas foram catalogados quase 750 sítios arqueológicos. Foram encontrados artefatos
líticos, esqueletos humanos e mais de 30 mil pinturas rupestres.

Para mostrar o resultado das pesquisas, Niède liderou a construção do Museu do Homem
Americano, inaugurado em 1998, em São Raimundo Nonato, parceria franco-brasileira,
criado para divulgar a importância do patrimônio cultural deixado pelos povos pré-históricos
nos sítios da Serra da Capivara .Este Museu é agenda obrigatória para visitar, sem pressa,
para entender a parte da história da humanidade. Outro Museu importante é o Museu da
Natureza, inaugurado em 2018 em Coronel José Dias, que conta a evolução da natureza e
a história da região.

Condutores treinados

Andar no Parque Nacional Serra da Capivara só se faz acompanhado por guia. Foram
treinados 70 guias, demandados na íntegra em época de férias escolares. Visitamos o local
em agosto, fora do pico da temporada turística, em plena seca, paisagem da caatinga do
semiárido nordestino. Que tem sua beleza.

O Parque é cortado por 400 km de estradas internas. A infraestrutura viária, embora na
piçarra e areia, mantém boa condição de tráfego e conservação por eficiente serviço de
drenagem de águas pluviais e base de cimento nas ladeiras. Caminhos que levam a
desfrutar paisagens de grandes belezas naturais, contempladas ao escalar rochas a pé ou
por escada de ferro com mais de 300 degraus. As inscrições rupestres são uma pequena
parte da grandeza que é o cenário natural.

Choro e soluço depois da escalada

Chorei duas vezes ao contemplar do alto da rocha que escalei, sem expectativa de
encontrar aquela paisagem única. Um horizonte de rochas multicoloridas. Colada ao
paredão, cresce a vegetação de grandes árvores, sempre verdes. A mata é resquício
conservado do clima úmido tropical existente em outras eras. O verde permanente foi
substituído pelo surgimento da caatinga cinzenta. É também chamada mata branca nesta
fase seca, que se observa de cima a emendar no resquício de Mata Atlântica como um
prolongamento da faixa úmida, já com outra cor. Sob o silêncio do espetáculo de milhares
de anos de transformação da natureza, o canto de pássaros.
As pinturas rupestres são a tela enquadrada na grande moldura da natureza. Muitas vezes
o guia nos levava a sítios arqueológicos onde passo a vista nas pinturas e sigo para
fotografar o entorno, a placidez dos mocós, pequenos roedores que observam os visitantes,
ângulos de rochas e detalhes da vegetação, a paisagem fantástica sob o sol. No Parque, há
diversas opções de trilhas à escolha, fáceis e difíceis. Um bom guia sabe dosar os
percursos de acordo com o perfil dos visitantes.

  • Capadócia, que nada! – disse a historiadora Áurea Gil, minha cunhada, ao avistar o
    horizonte de morros de arenito e maciço verde contido pelo paredão. Ela comparou a
    paisagem da Serra da Capivara com o famoso atrativo turístico da Turquia. Residente em
    São Paulo, escolheu a região do Piauí para comemorar aniversário, no vizinho Parque
    Nacional Serra das Confusões, em Caracol, a 100 km de Coronel José Dias. Por
    coincidência, o município também comemorava aniversário na mesma data.
    Serra das Confusões
    Os tropeiros que conduziam mercadorias e produtos locais em tropas de burros pelas
    veredas do Piauí deram o nome de Serra das Confusões àquele trecho elevado em que as
    pedras mudavam de cor de acordo com a hora do dia e as variações da incidência de luz
    solar. Ficavam confusos na travessia sobre o chão de pedra, que não deixava rastro e pela
    paisagem mutante. Daí ficou com este nome, agora um Parque Nacional do Ibama, hoje
    ICMBio, criado em 1998.
    Com 823.854 hectares, o Parque Nacional Serra das Confusões é rústico. Estradas
    esburacadas levam a locais encantadores, como os Cânions do Viana, duas horas para ir,
    duas para voltar. Acesso apenas por carro com tração nas quatro rodas, que pinota através
    de ladeira com areia solta e muito desnível.
    O passeio na Serra das Confusões começou pela trilha de 2 km até o local conhecido como
    Cores da Caatinga, seguido pela visão panorâmica chamada Janelas de Sertão. Depois de
    caminhar nas pedras e descer por um escada de ferro, se chega à Gruta do Boi, uma fenda

entre duas rochas altas com vegetação no topo, penetrada por esparsos raios de sol, chão
de areia e pedras.
Um trecho requer lanternas para prosseguir. Os paredões de arenito desenhados por
líquens, fungos e samambaias se unem no teto e formam gigantesca catedral construída
pela ação do tempo. Andamos até o trecho de escuro desafiador – mais de um quilômetro
de caverna, sem qualquer luminosidade.
Em entrevista à revista Pesquisa Fapesp, Niède Guidon informou que pesquisadores da
Fumdham em 15 dias encontraram 120 sítios arqueológicos na Serra das Confusões. Este
parque tem, junto com o da Serra da Capivara, mais de 1.300 sítios arqueológicos.


SERVIÇO

No trecho da Serra da Capivara fomos acompanhados por sete dias pelo guia Iderlan de
Souza Santana (89) 981088615. Graduado em Arqueologia e Preservação Patrimonial, com
dissertação sobre a mesofauna, pesquisa nas áreas de Arqueozoologia e Paleontologia e
conhece bem a ciência relacionada ao Parque e sua história. Além de coordenar o projeto
Museu Zabelê. Uma boa opção de hospedagem em Coronel José Dias é o Hotel Baixão do
Ouro.

Nos dois dias do trecho da Serra das Confusões andamos com o guia Jadiel Dias (89)
98103-6819. Presença amiga, excelente na tomada de iniciativa, sempre de prontidão,
criativo, rápido em encontrar soluções para as demandas dos visitantes. Em Caracol, a
parte de hospedagem não foi feliz. Os guias organizam também a agenda gastronômica
com opções de comida regional e restaurantes self service para não se perder tempo.

Com minha mulher, Dulcinea Gil, rodamos 2.560 km na ida e volta de Fortaleza a Coronel
José Dias, e depois São Raimundo Nonato e Caracol, incluindo os trechos internos nos dois
parques. Como a viagem Fortaleza-Coronel José Dias é muito longs, quase 12 horas de
carro, desdobramos o percurso em dois trechos, com pernoite em uma fazenda de Pio IX na
ida e na volta, cerca de metade do caminho. A estrada de asfalto BR-020 está em péssimas
condições no estado do Ceará. Atravessada a fronteira, encontramos no Piauí boa estrada
de asfalto, a mesma BR-020, pavimento excelente e três pedaços curtos na piçarra, mas
sem buracos, entre Simplício Mendes e Itainópolis.

*Flamínio Araripe

Jornalista.

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

Esse website utiliza cookies.

Leia mais