“Estratégia bolsonarista transforma a destruição da tornozeleira em ato calculado para reacender mobilização política e tensionar as instituições”, aponta o jornalista Florestan Fernandes Júnior
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Ao tentar se desvincular da tornozeleira eletrônica, o aparelho responsável por emitir o sinal de monitoramento da sua localização, Jair Bolsonaro cometeu um ato extremamente grave. Não há a menor possibilidade de alegar desconhecimento. Utilizar um ferro de solda para danificar o equipamento poderia causar ferimentos sérios na própria perna, o que ele evitou com precisão calculada. Bolsonaro sabia exatamente o que fazia, assim como sabia que perderia o direito de permanecer em prisão preventiva domiciliar.
A questão central agora é entender qual era o objetivo político do ex-presidente ao orientar seu filho, Flávio Bolsonaro, a convocar uma vigília em frente ao condomínio onde vive. A Polícia Federal trabalha com a hipótese de uma tentativa de fuga para uma das embaixadas localizadas próximo à residência. Mas não se pode descartar um componente mais amplo: uma ação coordenada pelos estrategistas da extrema-direita norte-americana, que há anos atuam de forma sistemática nas campanhas e na manipulação da opinião pública em governos ultraconservadores da América Latina.
Não seria surpreendente se Steve Bannon, reconhecido como o “guru” da comunicação da extrema-direita global e influência constante sobre o bolsonarismo, estivesse por trás dessas ações articuladas pela família Bolsonaro. Em outubro e novembro, Flávio Bolsonaro se encontrou duas vezes com o irmão Eduardo, uma nos Estados Unidos e outra em El Salvador. São justamente eles os principais articuladores da estratégia para livrar o pai da condenação por tentativa de golpe de Estado contra a democracia brasileira.
O que foi discutido nesses encontros? Tudo indica que a convocação da vigília e a tentativa de destruição da tornozeleira integram um plano de mobilização dos bolsonaristas mais fiéis. Nos últimos meses, com a prisão domiciliar, Bolsonaro foi desaparecendo do noticiário nacional, perdendo centralidade política. As notícias que restavam se limitavam às visitas autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes, geralmente de governadores em busca de apoio para 2026. Bolsonaro, por sua vez, evitava declarar qualquer apoio: tentava prolongar a aura de líder indispensável em um movimento que termina o ano sem um sucessor claro.
A reviravolta ocorre quando o próprio Flávio Bolsonaro, na última sexta-feira (21/11), grava e divulga um vídeo convocando a vigília. Em tom messiânico, mistura versículos bíblicos com incitações ao confronto contra a Justiça e o Estado Democrático de Direito. A partir disso, após pedido da Polícia Federal e parecer favorável do PGR, Alexandre de Moraes determina a prisão preventiva do ex-presidente, que é levado para a Superintendência da Polícia Federal, em Brasília. O episódio recoloca Bolsonaro nas manchetes, recupera momentaneamente o espaço político que vinha perdendo e reacende o proselitismo que já dava sinais de esgotamento.
Ao ser levado para a carceragem da Polícia Federal, ele tenta retomar a velha narrativa de perseguido político, justamente a lenda que alimenta seu núcleo mais radical. Se essa estratégia funcionará, só o tempo dirá. Mas tudo indica que o poder de mobilização bolsonarista está se exaurindo, desgastado pelo cansaço, pelo excesso de escândalos e pela falta de novos protagonistas.
Como dizia meu saudoso amigo Carlos Chagas: vamos aguardar.
Florestan Fernandes Júnior é jornalista, escritor e Diretor de Redação do Brasil 247
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Não podemos descartar nenhuma alternativa, inclusive a que imputa aos atos testar a reação das autoridades à quebra da tornozeleira, com a finalidade de medir o tempo. Além do mais, está provado que eles não estão dispostos a respeitar nenhuma regra ou norma institucional que imponha limites à família. Enfim. Não são seres sociais.