“Entre o Everest e a Caverna de Platão: reflexões para quem não precisa ser o melhor” – Por Mauro Oliveira

Mauro Oliveira é PhD em Informática por Sorbonne. Foto: Arquivo Pessoal

Com o título “Entre o Everest e a Caverna de Platão: reflexões para quem não precisa ser o melhor”, eis mais um artigo de Mauro Oliveira, professor do IFCE e PhD em Informática por Sorboenne university.

(Dedicado a ALGUÉM que nunca precisou ser o melhor)

Confira:

Você aí, já alcançou o pódio hoje? Não? “Pois trate de tentar!”, berram os coachs da positividade tóxica, sempre prontos a transformar a angústia alheia em êxtase no Instagram. E se você só ficou com a medalha de bronze? Ah, paciência… sempre tem um tapinha nas costas seguido de um “quase”, ou, pior: “o importante é competir”, né não? (rsrs).

Na última quarta-feira, apaguei da agenda com minha inseparável Faber-Castell um compromisso desses com a profundidade de um copo de Geleia Mocotó Colombo … vazio. E fui, de corpo, alma e Malbec, ao Dose de Letras, um sarau cultural de alto calibre existencial, idealizado pelas Dras. Carine Saboia e Giedra Alfredo, eruditas do nosso universo interior (EITA… rsrs).

O livro da vez era “Viver é melhor sem ter que ser o melhor”, do psiquiatra e professor da USP Daniel Martins de Barros, que nos deixa psicodelicamente baratinados com uma pergunta elegantemente subversiva: precisamos mesmo ser sempre os melhores?

Inspirado nos ideais do Arcadismo — movimento que, num passado sem Wi-Fi, exaltava a simplicidade — o autor nos convida a revisitar expressões como carpe diem (curtir o agora), aurea mediocritas (a gloriosa mediania) e inutilia truncat (corte fora o que só atrapalha). Tudo isso para lembrar que a busca desenfreada pela excelência pode nos afastar do que realmente importa: compaixão, equilíbrio, cooperação.

A discussão rolou elegante e acaloradamente, como um “vin au verre au comptoir”. Cada fala era um castelo de ideias erguido e redesenhado com cuidado a cada momento, como se ninguém, ali, quisesse ser o melhor (“de Vera”). Tivemos, por alguns instantes, aquela rara serenidade de sermos melhores do que nós mesmos ontem.

Até que alguém pensou alto:

“Claro que dá pra ser feliz sem ser o melhor… a maioria é burra mesmo!”

Silêncio. Gargalhadas. Filosofia em estado bruto. Porque se a maioria fosse tão brilhante, talvez não estivéssemos assando o planeta em nome do progresso, nem permitindo que crianças morressem de sede no Quênia ou de fome em Gaza. É a tal da “maioria silenciosa”, que de tão silenciosa, às vezes esquece até de pensar.

Feliz (como nos tempos em que o Fortaleza disputava a Libertadores) por ter feito bom uso da minha quarta-feira, segui surpreso nesta jornada “transcendintelectual’ (transcendência com troca de ideias sem frescura…) que o grupo me proporcionava. Nesta nave do “Dose de Letras”, era inevitável a pergunta ao espelho, essa fiel alma gêmea que raramente mente (rsrs): E eu, só sou feliz se for o melhor?

Meu espelho reagiu me lembrando ALGUÉM que há décadas me inspira, que tem sido o melhor entre seus pares, sem precisar ser o melhor como meta, como promessa, como obsessão.

ALGUÉM que nunca correu para o pódio, mas para o encontro. Caminhou no Everest por amor ao trajeto, e não pela selfie no topo.

ALGUÉM que buscou a sua melhor versão sem fazer da vida uma olimpíada, e sim um legado.

Essa quarta de Dose de Letras sem algoritmo explícito (tipo IA generativa… rsrs) me permitiu revisitar o legado deste ALGUÉM. Um legado celebrado por muitos, … até por quem não acredita, ou por quem acredita mas talvez não o compreende, talvez o compreende mas não o pratica.

Esse ALGUÉM permaneceu em minha cucuruta enquanto a máxima de “ser o melhor” ricocheteava em minhas redes neurais (ainda naturais, antes de implantarem um chip no meu kengo… rsrs).

Esse ALGUÉM me acalmou quando entrou na minha Caverna de Platão com cheiro de cafuné da Dona Gelita. Ao deixá-lo trazer notícias de um “mundo lá fora” — ainda acorrentado às minhas vaidades — tive uma certeza:

a felicidade não se disputa, se descobre quando a gente se encontra.

Muito grato, meu professor, meu deputado, meu secretário de CT&I, meu amigo *Ariosto Holanda*, guru tecnológico e moral de uma geração.

Obrigado, *Ariosto*, por nos ensinar que viver é, antes de tudo, uma arte que se pratica fora do pódio.

*Mauro Oliveira,

Professor do IFCE e PhD em Informática por Sorbonne University.

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