“Desde os tempos recuados da Província do Ceará, alguns senhores respeitáveis, das melhores famílias, cuidaram por proteger as frágeis lembranças e os registros esparzis sobre a nossa história”, aponta o cientista político Paulo Elpídio de Menezes Neto. Confira:
O Ceará não é um vazio desprovido de historiadores. Desde os tempos recuados da Província do Ceará, alguns senhores respeitáveis, das melhores famílias, cuidaram por proteger as frágeis lembranças e os registros esparzis sobre a nossa história. Praticamos essas artes improvisadas da crônica histórica muito antes da Écoles des Annales e da Escola de Frankfurt… Sem o mesmo brilho, nem com igual repercussão.
O Barão de Studart com a sua mania, que se mostraria incurável, de colecionador de papéis começou a mexer nos guardados públicos de arquivos em desordem, e a dar ordem e segurança à papelada cartorial e paroquial, amarelecida por falta de consulta e de curiosidade.
Algumas publicações destes esforços teimosos salvaram-se por acaso ou pelos cuidados de gente como Thomaz Pompeu de Souza Brasil e Thomaz Pompeu Sobrinho. Foram ter ao acervo do Instituto do Ceará onde permanecem a salvo dos predadores, a alimentar o veio de busca de pesquisadores por conta própria.
A criação da UFC e de outras universidades que seguiram pela trilha desbravadora da história e da cultura do Ceará, ampliou as oportunidades e os espaços por onde cronistas e os primeiros historiadores com reconhecida e respeitada formação acadêmica instalaram os seus instrumentos de busca e a sua pertinácia de ratos de papéis.
Hoje, além da UFC, cinco universidades, espalhadas pelos ermos de outrora das antigas entradas de penetração da Província, fazem, produzem e ensinam ciência e ampliam os campos de conhecimento, até então recolhidos a desvãos mínimos, com a multiplicação de saberes — sobretudo sobre o Ceará.
A Academia Cearense de Letras, o Instituto do Ceará e essas Casas dos nossos saberes guardados e em ritmo de reprodução significativo constituem repositório insubstituível sobre a história do Ceará.
Na UFC, constituiu-se um grupo de estudos multidisciplinares especializado no 800 brasileiro, aquela parte dos grandes acontecimentos civilizatórios datados dos séculos XVIII e XIX. Estes jovens pesquisadores dedicam-se a alguns momentos decisivos da ocupação territorial do Ceará e sobre eles constroem e sistematizam causas e circunstâncias com as quais buscam entender e explicar a nossa realidade. O grupo integra uma rede de correspondentes, espalhadas por todo o País, em um surpreendente conglomerado de estudiosos da nossa história.
Aprofundei alguns contatos com os pesquisadores desta causa singular, e descobri, entre eles, vocações, a disciplina acadêmica e o talento que honrariam qualquer universidade, se os seus dirigentes tivessem tempo para ocupar-se destas banalidades corriqueiras.
Escrever sobre a UFC? Mas é desta mercadoria intangível que consta a folha corrida intelectual dessas pessoas. Estão ali, fuçando com as próprias mãos e a vontade, textos e documentos e aprendendo a ler o que neles a história depositou — o departamento de História da UFC, o NUDOC, o repositório de teses e dissertações, a Casa Amarela, o Memorial e uma insubstituível bibliografia aberta ao público e às pessoas de boa vontade.
Os ghost-writer da UFC somos nós mesmos, os que ajudaram na construção deste edifício magnífico, obra para sempre lembrada de Antônio Martins Filho.
Paulo Elpídio de Menezes Neto é cientista político, professor, escritor e ex-reitor da UFC