Com o título “Fortaleza não está à venda”, eis artigo de Ivan Batista, presidente da Federação de Bairros e Favelas de Fortaleza. Ele critica a aprovação, pela Câmara Municipal, da revisão do Plano Diretor.
Confira:
A Federação de Entidades de Bairros e Favelas de Fortaleza (FBFF) manifesta sua profunda indignação diante da forma autoritária e irresponsável com que a Câmara Municipal de Fortaleza rasgou o processo democrático de construção do Plano Diretor Participativo. O que vivemos nas últimas semanas não foi apenas um atropelo técnico: foi uma traição à cidade e ao seu povo.
Durante meses, comunidades, especialistas, gestores públicos, movimentos sociais, universidades, conselhos e representantes de diversos setores participaram de reuniões, oficinas e audiências públicas com o compromisso de pensar uma Fortaleza mais justa, sustentável e organizada. Esse esforço coletivo foi simplesmente ignorado. Em seu lugar, prevaleceu a lógica dos negócios, da pressa, da votação às escuras e de desprezo absoluto pelo pacto democrático que deveria orientar o planejamento urbano.
O Plano Diretor é o instrumento mais importante da política urbana. Não é uma peça burocrática: é o que define como Fortaleza vai crescer, para quem a cidade vai servir e como cada território será protegido, ocupado e valorizado. E é justamente nesse ponto que ocorreu a maior violência: o zoneamento urbano – que deveria garantir Zonas Especiais de Interesse Social, Zonas de Proteção Ambiental, Zonas de Interesse Cultural e áreas destinadas à habitação de interesse social digna – foi desfigurado para atender a interesses privados..
Não queremos paralisar Fortaleza. Não somos contra grandes investimentos. O que exigimos é que desenvolvimento não seja sinônimo de desigualdade, expulsão, destruição ambiental e privilégio de poucos. Toda grande obra privada depende de aprovação pública para existir. E se a cidade concede essa autorização, o povo trabalhador – verdadeiro mantenedor da vida urbana – tem direito ao bônus do desenvolvimento, aos espaços públicos qualificados, à moradia bem localizada, aos parques, às áreas verdes, à proteção das dunas, dos manguezais e de toda o nosso patrimônio ambiental. Queremos desenvolvimento, principalmente, para quem constrói a cidade.
Perguntamos à Câmara Municipal de Fortaleza:
Onde está a Outorga Onerosa do Direito de Construir, que deveria garantir retorno social quando o mercado obtém lucro extraordinário?
Onde está o limite para a verticalização predatória na orla marítima?
Onde estão as ZEIS que protegem as comunidades populares?
Onde estão as zonas de interesse ambiental, cultural e habitacional que foram exigidas nas audiências públicas?
Onde está o povo trabalhador de Fortaleza nesse plano mutilado?
Onde está o banco de terras da quarta capital do país?
Diante dessa afronta, anunciamos que não permaneceremos calados. A democracia urbana foi ferida e, por isso, há medidas necessárias para restaurá-la. Entre elas:
A proposição de Ações Diretas de Inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça;
Ações Civis Públicas para contestar a ausência de participação popular;
Mandados de Segurança Coletivos para anular o processo legislativo violado;
Requerimentos ao Ministério Público e à Defensoria Pública;
Denúncias a organismos nacionais e internacionais defensores do direito à cidade, da moradia e do meio ambiente.
A cidade não pode ser governada ao sabor do lucro. Ela pertence ao povo que a constrói todos os dias, especialmente ao povo trabalhador que mantém esta urbe viva, pulsante e possível.
Reafirmamos: lutaremos nas ruas, nas comunidades, nas instituições e nos tribunais. O Plano Diretor mutilado não representa Fortaleza. Representa apenas a pressa e os privilégios de poucos. A cidade que queremos é justa, inclusiva, plural, democrática, moderna, inovadora e ambiental e historicamente responsável.
Fortaleza é a nossa casa. A casa de todo o seu povo.
*Ivan Batista
Presidente da Federação de Entidades de Bairros e Favelas de Fortaleza (FBFF)