“Esse papo de que os velhos não são mais como os de antigamente não chegou aqui. Nem chegará”, aponta a jornalista e publicitária Tuty Osório.
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Faço muitos planos de viagens. Consulto as tarifas, os pacotes, as possibilidades. Há muitos sonhos a caminho. A próxima desejada será em março ou abril, uma peregrinação a Aparecida do Norte para cumprir uma promessa familiar. Também poderia incluir o Santuário de Fátima, em Portugal, mas não sei se vai ser possível. O encontro com a fé é plano certo, e vai virar história verdadeira.
Nesses traçados a cumplicidade é com a minha mãe. No início do quinquagésimo programa de TV a respeito da nomeada terceira idade, não estamos interessadas. Vivemos uma vida de frutas, danças, estudos, ginástica, sol, mar, caminhadas e risadas. Faz tempo. Esse papo de que os velhos não são mais como os de antigamente não chegou aqui. Nem chegará. A reeducação alimentar aqui em casa data dos anos 80 do século passado. Na verdade, vinha de antes. Sempre comemos folhas, peixes, pouquíssima gordura e quase zero sal.
Quando relato estas coisas não pretendo ser arrogante. É só porque seria mesmo muito bom se aparecesse uma novidade. Porque chás, muita água, muita fibra, muito cálcio e muita conversa para manter a mente esperta já são íntimos demais. Minha mãe não considera a velhice a melhor idade por pura falta de hipocrisia. Eu, na porteira dos 60, tendo a concordar. A melhor idade são os 35, no máximo os 40, quando ainda somos jovens e já sabemos de muita coisa.
Evidente que diante da inexorável idade avançada só nos resta abraçar o que há de positivo nisso. Sem retóricas, teorias, frases feitas, modinhas, mitos. Tenho a vantagem de ter uma companheira mais experiente para me inspirar. Com 84 anos, minha mãe corre para abrir a porta ao som da campainha, sobe em banco, arrasta móveis. Usa aplicativos, perde a paciência com a imprecisão da tecnologia e desdenha a maioria dos remédios, aceitando apenas os indispensáveis.
Tomamos juntas o primeiro café do dia, sempre cedo, pois aprendi com ela que o dia rende quando a gente madruga. Concordamos que passou muito rápido. Ainda ontem eu buscava a sua mão no escuro para não temer o mundo. Hoje seguimos com as mesmas mãos dadas, em direção ao futuro que os bisnetos dela nos provam que existe de verdade.
Tuty Osório é jornalista, publicitária, especialista em pesquisa qualitativa e escritora. Lançou em 2022, QUANDO FEVEREIRO CHEGOU (contos); em 2023, MEMÓRIAS SENTIMENTAIS DE MARIA AGUDA (10 crônicas, um conto e um ponto) e SÔNIA VALÉRIA A CABULOSA (quadrinhos com desenhos de Manu Coelho); todos em ebook, disponíveis, em breve, na PLATAFORMA FORA DE SÉRIE PERCURSOS CULTURAIS.