Com o título “Impaciência com a paralisia moral”, eis artigo de Suzete Nocrato, jornalista e Mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará. “Esperar me destrói. Talvez, por não ter internalizado o ensinamento do pacifista Jossei Toda, de que a felicidade nem sempre está longe de nós. Ou desprezar o alerta do filósofo Marquês de Maricá, de que a impaciência, quando não rodeia os nossos males, os agrava”, expõe a articulista.
Confira:
Após anos de busca do conhecimento, chego à terrível conclusão: sou impaciente. Quero tudo para agora. O tempo é hoje, preparando o amanhã. Quero viver intensamente cada momento — a dor, alegria, o prazer, a maternidade, o jornalismo, os amigos, os amores.
Esperar me destrói. Talvez, por não ter internalizado o ensinamento do pacifista Jossei Toda, de que a felicidade nem sempre está longe de nós. Ou desprezar o alerta do filósofo Marquês de Maricá, de que a impaciência, quando não rodeia os nossos males, os agrava.
Ariana com ascendência em Capricórnio, brigo com a incapacidade de suportar a espera. A vida tenta ensinar, mas teimo em não aprender. O grave é que, racionalmente, concordo com o apóstolo dos gentios, de que há tempo de ceifar se não desfalecermos. Mas, esperar é cansativo, consome energias e, às vezes, infelicita.
Teria razão Immanuel Kant ao afirmar que “a paciência é a fortaleza do débil e a impaciência, a debilidade do forte”? Por ora, escolho sentir o amor sem reservas e a impaciência sem culpa, ignorando os limites propostos por São Jerônimo.
Assumir essa inquietude é a forma mais honesta de reconhecer meu descontentamento diante de uma estrutura social que naturaliza a desigualdade e legitima genocídios — como o que atualmente se desenrola em Gaza, transformada em um campo de extermínio, sustentado pela indiferença e omissão das nações ditas civilizadas, que permitem, ou ao menos toleram, que aquele povo milenar seja lenta e cruelmente dizimado, pela fome e pelas bombas de Israel.
A paciência, nesse contexto, já não me parece virtude. Transformou-se conivência. Afinal, quantas tragédias ainda serão necessárias para que a humanidade reaja aos desvarios de tirados, fascistas, autoritários e facínoras? Quantas chantagens por parte de potências econômicas e nucleares ainda serão toleradas em nome de interesses que ignoram o sofrimento humano e a soberania de povos que apenas desejam viver em paz? Assistimos à normalização de guerras fratricidas, travadas unicamente pelo prazer da dominação e pela vaidade do poder, como se fossem inevitáveis.
Ora, não há como aceitar a passividade de uma sociedade corrompida, que perdeu o dom maravilhoso de se emocionar com o sorriso do inocente, o choro do abandono, a alegria do levantar-se. É difícil ser paciente diante da falsificação dos sentimentos, das redes sociais que conectam fake news, da maldade espetacularizada pelos meios de comunicação, que exploram o sofrimento de famílias fragilizadas pela tragédia que lhes bateu à porta.
Sou profundamente impaciente com os que abandonam o papel de pai ou mãe para assumir o de carrascos de crianças abandonadas, amordaçadas, espancadas…. Com aqueles que, destituídas de empatia e laços sociais, se orgulham de perpetuar o racismo, a xenofobia, a homofobia, o etarismo, a misoginia, o sexismo, a gordofobia — e tantas formas de violência disfarçadas de tradição, crença ou normalidade.
A impaciência, portanto, pode ser não uma falha, mas um grito. Um clamor necessário diante da paralisia moral do nosso tempo.
Quero para hoje a concretização dos sonhos. Amanhã, novas fantasias, outras pequenas conquistas, derrotas, ganhos e perdas. Quem eles venham — sem demora.
*Suzete Nocrato
Jornalista e Mestra em Comunicação pela Universidade Federal do Ceará.