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“Lição de um tirano”

Djalma Pinto é advogado e especialista em Direito Eleitoral. Foto: Arquivo Pessoal

Com o título “Lição de um tirano”, eis artigo de Djalma Pinto, jurista e ex-procurador-geral do Estado do Ceará.

Confira:

A sociedade brasileira convive, permanentemente, com a expressão “golpe”. Golpe do motoboy, Golpe do Pix, Golpe do boleto falso, Golpe do falso pagamento, Golpe do WhatsApp etc, mas esses golpes, em geral, impactam apenas pessoas individuais e são praticados por indivíduos com vocação estelionatária. O mais nocivo, porém, de todos os golpes é o golpe de Estado. Foi este introduzido no Brasil com as suas patológicas consequências pelo ditador mais longevo de nossa história: Getúlio Vargas, ex-Ministro da Fazenda do Presidente Washigton Luís, no período de 1926-1927, que se tornou seu algoz em 1930. A lição não poderia ser mais perniciosa. Sua nocividade jamais fora devidamente analisada. Introduzida em
1891, a primeira carta republicana sobreviveu até 1930. A Constituição brasileira, com vigência durante o Império, antes da Proclamação da República, foi outorgada por D. Pedro I, em 1824.

Na eleição para Presidente da República de 1930, Getúlio foi derrotado por Júlio Prestes. Encerrada a apuração dos votos, em 21 de maio de 1930, Júlio Prestes obteve 1.091.709 votos a favor, contra 742.794 dados a Vargas. Inconformado com o resultado das urnas, armou seus simpatizantes, arregimentou os
tenentes que, ao longo de década de 1920, tentaram pela força assumir o poder ao qual tiveram acesso com a Proclamação da República. Comandou um golpe, com mortes de inúmeros defensores da ordem jurídica então vigente, para apossar-se do poder. Em outubro de 1930, antes dos revolucionários sob o comando de Getúlio chegarem ao Palácio do Catete, os ministros militares depuseram e prenderam o
Presidente Washington Luíz, no Forte de Copacabana. Uma junta militar assumiu então a presidência, para entregá-la a Vargas, no início de novembro de 1930.

No veículo, que conduziu o então Presidente do Palácio residencial ao local de sua prisão no Forte de Copacabana, encontrava-se o então primeiro-tenente Costa e Silva, que assimilaria a lição de Getúlio para reaplicá-la em 1964, integrando o comando supremo da Revolução que depôs o Presidente João Goulart.

A vocação ditatorial de Getúlio foi exposta, incialmente, na Revolução de 1930 e reiterada em novo golpe para prorrogação de sua ditadura em 1937, quando suprimiu a validade da Constituição de 1934, elaborada para contornar ainsatisfação popular que motivou a Revolução paulista de 1932, exigindo o retorno da normalidade constitucional.

O Brasil conviveu, assim, com um autocrata de 1930 a 1945, prejudicando gravemente a sedimentação do espírito democrático na Nação. Somente foi afastado do poder com o retorno dos pracinhas da FEB, que ajudaram a derrotar os ditadores na Europa no final da Segunda Guerra. A percepção do paradoxo foi
determinante. Se resgataram a liberdade no Velho mundo, os intrépidos soldados não poderiam conviver com uma ditadura em sua pátria.

A despeito de comandar explicitamente essa ruptura, distribuir armas aos revoltosos para tomar o poder pela força, nunca teve sua inelegibilidade decretada. Por isso, pelo voto do povo, foi eleito em 1950, permanecendo na Presidência até 1954, quando se suicidou.

Após submeter-se, por mais de uma década, ao poder ditatorial de Vargas, o país voltou a conviver com nova ruptura institucional em 1964. Restabeleceu a plena normalidade democrática apenas em 1988, com a promulgação da Constituição vigente, cujo art. 205 deu ênfase ao maior antídoto para evitar anomalias dessa natureza: a educação, nele assim reportada: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da
família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”

O preparo para o exercício da cidadania se resume na qualificação das pessoas para a investidura no mandato político; na compreensão da profunda nocividade de quem vivencia a máxima “rouba, mas faz”, na conscientização de que comprar e vender voto é crime gravíssimo punido pelo art. 299 do Código Eleitoral, com reclusão de até quatro anos. Enfim, instruir para a cidadania compreende contribuir para eleições livres, justas e transparentes a fim de que, no final da contagem dos votos, o vencido
cumprimente o vencedor, sem questionamento algum sobre a legitimidade da competição.

*Djalma Pinto

Advogado, autor de diversos livros, entre quais “Pesquisas Eleitorais e a Impressão do Voto” e “Ética na Política e Distorções do Poder”.

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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