Com o título “Lições de uma bruxa”, eis mais um conto da lavra de Totonho Laprovitera, arquiteto urbanista, escritor e artista plástico.
“Ensinaram a ter medo das bruxas e não de quem as queimava vivas.” (Swami Raddhi Jyotirmay)
Confira:
Certa vez, em um evento cultural em Fortaleza, uma jovem fez um sinal em Libras, aproximou-se e me cumprimentou com um sorriso. Disse ter sido minha aluna em um curso preparatório para o exame de habilidades específicas do vestibular de Arquitetura e Urbanismo da UFC. Contou que havia passado nessa etapa, mas não no restante do concurso. Pois é – por conta do amigo Tales Sá Cavalcante, já fui professor de cursinho.
Antes que eu perguntasse se havia insistido no sonho de ser arquiteta, ela se adiantou e contou ter encontrado sua verdadeira vocação – e que hoje era bruxa. Disse isso com a maior autoestima. Formada por uma escola de magia e bruxaria, se não me engano em São Paulo, parecia inteiramente à vontade naquele papel que, para mim, ainda soava envolto em mistério.
Meio sem jeito, admiti minha ignorância. Ela, tranquila, explicou que as bruxas estudam o poder da natureza – as ervas, as plantas, os cristais e os quatro elementos – buscando harmonia com os ciclos da terra e do tempo. Contou também que se dedicam à filosofia, à religiosidade, à história da bruxaria, à astrologia e às artes do encantamento.
Enquanto falava, uma brisa leve passou entre nós, como se participasse da conversa. Ela sorriu e disse que as bruxas acreditam na cura pela natureza e pelos animais, e na igualdade entre homens e mulheres. As Deusas, explicou, representam o princípio feminino; os Deuses, o masculino.
Despediu-se com gentileza e seguiu pelo jardim do lugar, com sua veste negra e fina esvoaçando ao vento. Por um instante, fiquei ali, vendo-a se afastar e pensando no quanto ainda sabemos pouco sobre os caminhos que as pessoas escolhem seguir.
Mais tarde, lembrei de filmes e jogos em que magos, bruxos e feiticeiros são apresentados como se fossem a mesma coisa – e não são. Talvez por isso a imagem popular da bruxa ainda carregue aquele estereótipo cruel: a mulher velha, feia e má, de riso áspero e nariz pontudo. Mas também não é assim.
Descobri que não há um único modo de reconhecer bruxas. Antes, caçadas por sinais banais – verrugas, marcas de nascença ou a ausência de dor em picadas –hoje, a bruxaria é uma forma de viver em harmonia, espiritualidade e cura.
Com minha ex-aluna, aprendi que a verdadeira magia da vida talvez esteja nisso – em compreender e acolher as verdades que não se impõem, mas chegam de mansinho e tocam a alma.
*Totonho Laprovítera
Arquiteto urbanista, escritor e artista plástico.