“Barroso deixa o Supremo com ares de candidato”, aponta o jornalista Paulo Henrique Arantes
Confira:
Luís Roberto Barroso deixa o Supremo Tribunal Federal com uma imagem de dignidade e, até mesmo, de coragem. Presidente da corte constitucional, respondeu com veemência aos ataques desferidos pelos bolsonaristas, por meio de ponderações como esta: “Estamos fazendo uma defesa vigorosa da democracia. E nós desempenhamos esse papel de enfrentar um movimento que considero global, radical e de extrema direita, de ataque às instituições, que circula desinformação e — ainda está sendo investigado — talvez tenha até tentado um golpe”.
O presidente Luís Roberto Barroso nunca deixou Alexandre de Moraes falando sozinho contra os golpistas. Por outro lado, é o ministro que, no passado recente, disse que o STF era “a reserva iluminista da sociedade brasileira”. Na verdade, não é, nunca existiu para tanto, mas certamente lançou algumas lufadas de razão contra obscurantistas.
Este jornalista, em geral, simpatiza com o jurista Barroso, mas, por vezes, considera seus discursos amontoados de platitudes, de máximas politicamente corretas contra as quais só extremistas e negacionistas se rebelam. Sua palestra na Conferência Nacional da OAB, em Belo Horizonte, em novembro de 2023, foi uma mistura de voluntarismo com pieguice. E isso num momento em que o STF, o Congresso e o Executivo se encontravam numa espécie de sinuca institucional.
Seu apelo ao diálogo soou como frouxidão. “A vida é plural. Ninguém tem o monopólio da verdade e do bem. Eu ouço todo mundo e trabalho para a pacificação do país”, disse. E arrematou: “Quem pensa diferente de mim não é meu inimigo, mas meu parceiro na construção de uma sociedade democrática”.
Singelo e puro demais.
Na mesma ocasião, Barroso expôs algo com focinho, orelhas e odor de plataforma eleitoral – uma tal “agenda de consenso”, material típico de pré-candidatos a alguma coisa. Agora que deixa o Supremo, ele irá se filiar a algum partido e disputar eleição? Um iluminista não deve escamotear suas intenções.
A tal “agenda de consenso” de Luís Roberto Barroso enumerava prioridades de um candidato: erradicar a pobreza, retomar o crescimento econômico, priorizar a educação básica, investir em ciência e tecnologia, criar um projeto nacional de segurança pública, cuidar do saneamento básico, retomar nosso protagonismo ambiental.
Em tempo: Barroso também defendeu aquilo que chamou de “imprensa tradicional” – sabe-se que imprensa é essa – contra “as narrativas que cada um inventa”, como se a “imprensa tradicional”, reduzida a duas ou três corporações, não criasse suas narrativas dia sim, outro também. Afagos de um potencial candidato.
Paulo Henrique Arantes é jornalista há quase quatro décadas, autor do livro “Retratos da Destruição: Flashes dos Anos em que Jair Bolsonaro Tentou Acabar com o Brasil”. Editor da newsletter “Noticiário Comentado” (paulohenriquearantes.substack.com)