Com o título “Lula encurralado e os reflexos na reeleição de Elmano”, eis artigo de Cleyton Monte, cientista político, professor universitário, pesquisador e presidente do Instituto Centec. “A governabilidade, nesse novo arranjo, tornou-se refém de uma equação instável entre emendas impositivas, fidelidade parlamentar volátil e disputas internas no próprio campo governista”, expõe o articulista.
Confira:
A política brasileira vive um momento delicado, marcado por assimetrias de poder e rearranjos institucionais que desafiam a arquitetura da República. A sucessão de derrotas do governo Lula no Congresso Nacional, em matérias de relevância estratégica, tem exposto mais do que uma fragilidade pontual de articulação: revela o esgarçamento do presidencialismo de coalizão e a
emergência de um semipresidencialismo informal, no qual o Executivo já não governa, mas negocia sua própria sobrevivência. Esse processo não começou agora. Ganhou força com a queda de Dilma Rousseff, avançou com Michel Temer e atingiu seu auge no governo Bolsonaro, quando o Congresso passou a operar com capacidade de chantagem institucional.
A governabilidade, nesse novo arranjo, tornou-se refém de uma equação instável entre emendas impositivas, fidelidade parlamentar volátil e disputas internas no próprio campo governista. Nos últimos meses, o governo Lula sofreu reveses significativos no Parlamento: o Congresso derrubou o veto presidencial e impôs a prorrogação da desoneração da folha de pagamento até 2027; alterou o marco temporal das terras indígenas; impôs derrotas na política de saneamento básico e, mais recentemente, reverteu o decreto do Executivo que aumentava o IOF sobre operações de crédito, em mais uma demonstração de força da base informal conservadora e empresarial. Mas o problema não se resume à Esplanada. O impacto mais profundo dessa crise se manifesta nos
estados.
A crise em Brasília tem congelado a tramitação de projetos estratégicos e travado o fluxo de investimentos federais – especialmente aqueles voltados para infraestrutura, habitação, saúde e segurança. Governadores aliados, como Elmano de Freitas, no Ceará, enfrentam um duplo desafio: por um lado, precisam manter a sintonia política com o Planalto; por outro, veem atrasar ou
esvaziar-se agendas prioritárias de seus governos por conta do bloqueio imposto pela lógica congressual. Dessa forma, quando o Executivo federal é encurralado, essa engrenagem emperra – e com ela, a capacidade de entrega nos estados. Isso abre espaço para narrativas oposicionistas locais que exploram a ineficiência como retórica, mesmo sem apresentar projeto consistente de desenvolvimento.
Se a dança política seguir esse ritmo, a disputa estadual de 2026, portanto, será mais orientada por resultados concretos e capacidade de gestão. A permanência de Elmano no Palácio da Abolição dependerá menos da lealdade ao lulismo e mais da habilidade em sustentar entregas, ressignificar o papel do Estado e ampliar o diálogo com lideranças municipais e sociedade civil. Governar, neste cenário de alianças incertas, será também um ato de resistência institucional.
*Cleyton Monte
Cientista político, professor universitário, pesquisador e presidente do Instituto Centec.