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“Mísseis, Dados e o “Peba Plus”: Crônica de uma Colonização Invisível” – Por Mauro Oliveira

Mauro Oliveira é PhD em Informática por Sorbonne. Foto: Arquivo Pessoal

Com o título “Mísseis, Dados e o “Peba Plus”: Crônica de uma Colonização Invisível”, eis artigo de Mauro Oliveira, professor do IFCE, PhD em Informática por Sorbonne University e ex-secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações. “Seguimos ocupados, distraídos e clicando compulsivamente, enquanto a desigualdade — de renda, de oportunidade e de informação — se alastra como um malware rodando em segundo plano”, expõe o articulista.

(Sem interesses de visitar a “Disney do Suassuna”)

Confira:

Uma postagem que recebi neste FDS chuvoso mostra a formidável criatividade brasileira. Nela, um anúncio da TV Iraniana prometia, na última quinta-feira, que o mundo testemunharia algo inesquecível. Em seguida, a cena: “PSG 1 x 0 Botafogo” … rsrs. Afinal, o quarteto fantástico — Palmeiras, Botafogo, Flamengo e Fluminense — quase nos fez esquecer o traumático 7×1 de Franz Beckenbauer, eternamente gravado no nosso canarinho córtex pré-frontal.

Aproveitando a chuva insana (junho de São João com cara de novembro em Londres), fiquei de Malbec com Marcio e Anios, meus amigos de Marte. Entre um chuvisco e outro, assistimos pelo Youtube (R$45,00 mensal, obrigado por perguntar) à “Intelligentsia terráquea” em pavorosa, devidamente criticada no IRACEMA Digital pelo meu amigo Aniceto Rocha. Disse ele:
“A guerra é prova do triste declínio da humanidade… Triste humanidade que não consegue conviver com o diferente…”

Dentre vários vídeos que assistimos na Prime (R$30,00 mensal) em meu “banker familiar” atacado por goteiras esparsas, chamou-nos a atenção a opinião do economista liberal Jeffrey Sachs, aquele mesmo, de Harvard, diretor do Earth Institute na Universidade de Columbia e Conselheiro Especial do Secretário-Geral da ONU, António Guterres.

Professor Sachs não economizou palavras: segundo ele, Benjamin Netanyahu já tenta há 30 anos essa guerra contra o Irã. Primeiro-ministro em outras duas temporadas (1996–1999 e 2009–2021), Benjamim finalmente conseguiu convencer o Donald… não o pato, mas o Trump nitroglicerina, a embarcar numa guerra que, segundo Sachs, “não é dos americanos”.

Enquanto os democratas ensaiam mais um impeachment de Donald — já calejado na temática — e, diga-se de passagem, torcedor de um fracassado “8 de janeiro”, o Dono do (seu) Mundo resolveu colocar o (nosso) mundo em risco ao encurtar suas “duas semanas de ação limitada” (pra inglês ver).

Essa política de “baseado mofado”, sem aval do Congresso americano, só ampliou o descrédito internacional de Donald como líder global — exceto, claro, para aquele velho parceiro sionista (não confundir com semitismo, please) de direita, que segue castigando crianças inocentes da vizinhança com a fome (how about watching independent news?).

A guerra que Benjamin tanto sonhou — e que Donald, com seu indefectível talento para arenga, tratou de abraçar — é mais uma versão requentada da velha barbárie humana, um reload da colonização na dominação pelo medo, pela força e pelo controle de recursos.

Assistindo tudo isso, “ao vivo e a cores”, Marcio e Anios, coitados, não entendem, como a Terra funciona. Fico sem graça, envergonhado (to be honest), quando eles me perguntam por que tem gente catando comida no lixo da Aldeia Aldeota ou morrendo de sede (falei sede mesmo) no Quênia. Explicar a desigualdade planetária pra eles é mais difícil que entender a física quântica com o Gato de Schrödinger — vivo, morto… e injusto ao mesmo tempo.

Como bem aponta o Dr. Marcelo Alcântara, cientista do Elmo que salvou vidas:

“É muito triste, após uma pandemia que passamos, a humanidade se autodestruir por grana e poder…”

Enquanto mísseis cortam os céus do Oriente Médio, por aqui, do lado de cá do Wi-Fi, seguimos marchando em silêncio, como soldados disciplinados nessa outra guerra: a Colonização Digital.

Se antes o jogo era só pelo petróleo, agora também são os dados — CPFs nas farmácias, nas lojas, nos supermercados… A nova corrida do ouro se dá em forma de informações pessoais. As armas agora atendem por nomes como algoritmos, os tanques viraram servidores, e os territórios são medidos em gigabytes de atenção, privacidade… e renda.

Seguimos ocupados, distraídos e clicando compulsivamente, enquanto a desigualdade — de renda, de oportunidade e de informação — se alastra como um malware rodando em segundo plano.

“Causa espécie” (É o novo, Neno Cavalcante!) a Marcio e Anios nossa capacidade criativa de reinventar a colonização. Agora em versão digital: invisível, sorrateira e, claro, altamente lucrativa … mas só “pro lado que é lado”, bem abaixo da linha do Equador … usando o mapa-múndi de “cabeça pra baixo” (cientificamente discutida pelo Secretário Alexandre Cialdini no artigo “o mundo está ao contrário e ninguém reparou” – O POVO, 15/05/2025).

Essa nova colonização não para. Pelo contrário: se sofistica a cada clique. Sorrateira porque ninguém se incomoda, impune porque ninguém reage. Para comprarmos um simples PP (Peba Plus, rsrs), essa rapadura eletrônica de R$ 3 mil, precisamos de 10 sacas de soja, 6 mil laranjas ou 60 kg de carne moída. Tirando impostos e logística, o grosso do dinheiro vai parar nos cofres do outro lado do oceano (não esqueça do mapa-múndi do Cialdini … rsrs). Sorrateira e impunemente pois o Brasil possui mais celulares do que gente e nossos líderes são, em sua maioria, “digitalmente desletrados”.

Para engrossar o caldo das Big Techs e aumentar o furo em nossos bolsos, sobreviver nessa selva digital nos exige, todo mês, patrocinarmos os colonizadores digitais: Office Microsoft (falta uma política de software livre), Netflix (saudade do Cine ART), Prime (cancelar dá mais trabalho que pagar, rsrs), Google (meu HD virou um apêndice da nuvem deles) e, até pouco tempo, ainda mandávamos nossos humildes U$20 para o Sam Altman do ChatGPT (até o dia que o DeepSeeek desmantelou U$1 trilhão na Wallstreet).

A saída para essa nova Colonização Digital? Educação. E com urgência.
As universidades precisam assumir a linha de frente de uma contrarrevolução tecnológica. Um primeiro passo? Que tal parar por uma semana para discutir intensamente os impactos da IA na sociedade e implantar em todos os cursos a Tecnologia de Prompt (o jeitinho certo de dar ordens para a IA entender o que você realmente quer). Algo que o pessoal do Centec já começou a fazer lá no Pirambu Innovation, lá em 2024.

Além disso, a proposta de Letramento Digital que tramita na Assembleia Legislativa do Ceará pode ser outro avanço concreto. Não se trata de ensinar nossos jovens a usarem ainda mais a parafernália estrangeira, mas, como destaca o cientista político Cleyton Monte, integrar o Letramento Digital ao currículo, com base em três pilares: uso estruturado das TICs, inteligência emocional e aplicação ética da IA.

Esse debate precisa sair dos laboratórios, das lives e dos podcasts e ocupar as salas de aula, os plenários e as mesas de decisão. Só assim teremos alguma chance de, quem sabe, surfar — e não apenas boiar — nessa nova onda digital.
Quem sabe, assim, nossos jovens deixem de ser apenas consumidores passivos, passando a ser usuários críticos, criadores e protagonistas dessa era tecnológica.

Mas, para isso, é urgente engajar lideranças empresariais, políticas e educacionais. O que, convenhamos… não tem sido fácil… ou tem?

E se um dia nossos netos perguntarem como foi viver nessa era de Colonização Digital (sorrateira e impunemente), talvez a resposta seja amarga mas com humor resignado:

Foi como assistir a um “PSG 1 x 0 Botafogo”, do lado errado da arquibancada, pagando ingresso caro, tomando chuva e ainda aplaudindo o gol adversário.

Ou, como diria João Grilo e Chicó de Suassuna, aos meus amigos Marcio e Anios:
“sei não, só sei que foi assim!”

*Mauro Oliveira

Professor do IFCE, PhD em Informática por Sorbonne University e ex-secretário de Telecomunicações do Ministério das Comunicações

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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