Com o título “Mulheres e brinquedos”, eis mais uma história da lavra de Francisco J. Caminha, escritor e ex-deputado estadual. Um papo sobre sexo, preconceitos e.. humm.
Confira:
Quando adentrei naquele avião, fui em busca do meu assento no corredor.
Ao me acomodar, observei uma lindíssima e estonteante mulher sentada no lado da janela. Sua presença fez meu olhar masculino brilhar de atração e, logo mais feliz fiquei, quando ninguém ocupou a poltrona do meio. Apresentava ter um pouco menos de 40 anos. Seus olhos eram levemente esverdeados, cabelos com tons ruivos e uma bem cuidada tez branca. Não detectei marquinhas de sol ao longo do percurso do sutil decote.
Quando a cumprimentei, fui presenteado com um discreto e gentil sorriso. Após algumas trocas de perguntas triviais, ela começou a compartilhar assuntos pessoais de trabalho, sexualidade e decepções amorosas. Houve uma rápida e fugaz conexão entre nós.
Sabe, amigos, conversar intimidades com uma pessoa estranha pode parecer um pouco paradoxal, mas, senti que ela precisava abrir o coração com alguém que não a julgasse nem a rotulasse. A nossa conversa fluiu protegida pelo anonimato. Ela me pareceu objetiva, verdadeira e honesta. Para mim, foi uma experiência prazerosa.
Quando perguntei se ela, atualmente, tinha algum tipo de relacionamento, fui surpreendido com a resposta:
– Moro sozinha, sou independente financeiramente e minha companhia é o Jack, meu labrador.
– E você não sente falta de ter um homen quando surge a necessidade de …..?
– Não preciso de homem para ter orgasmos. Prefiro meus brinquedos.
Pensei comigo… sou de uma geração que desconhecia esses acessórios do prazer e parece que as mulheres, hoje em dia, estão mesmo se utilizando desses recursos para se desfazer das ansiedades e não precisar de parceiro.
Aí lembrei-me quando estava servindo na Assembleia Legislativa como parlamentar. Havia uma vendedora que, de vez em quando, reunia assessoras e servidoras para apresentar um rol de novidades. Soube depois que tinha umas bolinhas que explodem, velas comestíveis e aromatizadas, plugs, anéis e, agora, aparelhos que vibram e atendem comandos de voz.
No meu tempo de adolescente no Colégio Naval, esse assunto era inexistente, nem mesmo se falava em preservativo. A gonorreia era tão comum que a gente dava o codinome de gripe e se curava com algumas injeções de Benzetacil ou Garamicina.
Quando fui casar, na Igreja Católica, foi exigido que fizéssemos um curso de noivos. Eu me lembro que o palestrante fez uma careta de rejeição quando disse que o uso de camisinhas no sexo era repugnante e a igreja não aprovava.
Esse assunto é tão delicado que tem aqui em Fortaleza em rede de farmácias denominada “Dose Certa” e lá não vende preservativos, porque os donos são católicos carismáticos. Não quero entrar na questão religiosa do que é sagrado ou profano até porque não cabe aqui. Só sei que as relações de gêneros assumem uma pauta política que divide a sociedade em progressistas e conservadores. Posso ser santo ou profano e não estou nem aí para o que pensam de bem ou de mal de mim. Hoje me considero um homem livre e feliz, principalmente depois que cortei os grilhões da religiosidade em minha vida.
Mas, na verdade, ninguém fala comigo desses assuntos narrados acima abertamente, a não ser aquela jovem senhora que compartilhou, em três horas de voo entre São Paulo e Fortaleza, sua vida privada de aventuras e desventuras sexuais, que não me cabe aqui dizer o que ouvi.
Quando o avião finalmente aterrissou, ela me pareceu leve e feliz como se tivesse saído de uma sessão terapêutica curativa. Eu guardo os segredos dela e ela um pouquinho dos meus. E nunca mais a vi. Ficou só nos vestígios da memória o que imaginei com ela.
*Francisco J. Caminha
Escritor e ex-deputado estadual.