Com o título “O Brasil presta porque tem democracia”, eis artigo desta quarta-feira de Suzete Nocrarto, jornalista e mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal deo Ceará.
Confira:
Escrever é uma atividade medonha e as palavras, como diz Rosa Montero, são rebeldes, fugidias e não gostam de ser domesticadas. Em uma sociedade em convulsão e o Brasil de hoje vivendo numa encruzilhada, entre reafirmar sua democracia ou ceder às chantagens de golpistas em nome da pacificação, tenho procurado fazer da escrita um exercício de serenidade. Não por medo, mas por cansaço das discussões que parecem mais trincheiras do que diálogo.
Foi por isso que recusei a sugestão de um amigo para me posicionar sobre o julgamento da trama golpista. Ela veio logo após o voto vexatório, contraditório e inconsistente do ministro Luiz Fux, que defendeu a absolvição de Jair Bolsonaro e outros militares pela tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Eu não queria mergulhar nessa lama.
Mas, no dia seguinte, ao ouvir a ministra Cármen Lúcia, me senti impelida a enfrentar as palavras. Não pretendo aqui analisar a decisão do STF e o posicionamento de cada ministro da 1ª Turma – tarefa que deixo aos colegas jornalistas, advogados, juristas e articulistas melhor preparados. Quero falar sobre a potência da única voz feminina no Supremo Tribunal Federal. Sua fala não representou apenas um voto, mas a memória, a história de país. Foi um respiro.
Em vários trechos da manifestação da ministra, meu coração se encheu e escorreu pelos olhos. Como não se emocionar com aquela mulher elegante, culta, respeitosa no trato, defendendo a nossa democracia e soberania, ao reafirmar, de forma didática, a normalidade do julgamento: “o que há de inédito nesta ação penal é que nela pulsa o Brasil que me dói”.
Para Cármen Lúcia (a quem trato com uma proximidade respeitosa), o julgamento não era apenas sobre réus e sentenças, mas sobre o encontro da Nação com seu passado, presente e futuro. E tem razão. A democracia só se sustenta quando somos capazes de manter os olhos atentos ao presente, sem esquecer o passado, renovando as esperanças todos os dias.
Naquele histórico 27 de setembro de 2025, houve um instante especialmente simbólico. Ao conceder parte ao ministro Flávio Dino, ela advertiu que fosse breve, recordando, com firmeza cortante, que “nós, mulheres, ficamos dois mil anos caladas e nós queremos ter o direito de falar”. Que grandeza de espírito. Como cidadã, mulher, jornalista e brasileira, guardo o sentimento de ter sido representada naquela sala do STF. Em um país que por séculos silenciou suas mulheres, ver a ministra se afirmando em espaço de poder é também um ato de reparação histórica.
A sua clareza deu sentido àquele momento. Para além da condenação dos golpistas, presenciamos uma afirmação de futuro, um lembrete de que, apesar de todas as investidas da extrema-direita e de parte do Centrão, a democracia brasileira resiste e pulsa. Como ela bem falou: “o Brasil só vale a pena porque estamos ainda conseguindo resguardar o Estado Democrático de Direito”. Que nunca nos falte coragem para defender que o povo continue sendo a fonte legítima de poder.
Viva a Democracia!
*Suzete Nocrato
Jornalista e mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará.
Uma resposta
Naquele histórico 27 de setembro de 2025…..
Somente daqui a 10 dias.