Com o título “O exemplo de Giuseppe Garibaldi”, eis artigo de Djalma Pinto, jurista, escritor e ex-procurador-geral do Estado. “Quantas pessoas, que exerceram ou exercem o poder por delegação dos seus contemporâneos, serão lembradas por essa virtude sublime do respeito ao dinheiro do povo?”, desafia o articulista.
Confira:
Poucos governantes percebem que o essencial não é apenas chegar ao comando do poder político. Relevante mesmo é, após exercê-lo, deixar para a posteridade um legado de dignidade e decência que se projete ao longo do tempo, encantando as gerações, estimulando os jovens pelo exemplo a ser seguido.
No livro Notas de Inverno sobre Impressões de Verão, publicado em 1863, Dostoiévski retratou uma qualidade de Garibaldi, que impressionara os franceses, os italianos e todos os europeus. Sua exaltada virtude foi demonstrada, após entrar ele triunfante em Nápoles e encabeçar, em 1860, um governo revolucionário provisório, respeitando os valores encontrados. Seu grande feito foi asssim imortalizado pelo festejado escritor russo:
“ele dispôs por algum tempo, em Nápoles, do poder mais ilimitado e incontrolado. Teve então nas mãos uma quantia de vinte milhões, dos fundos do Estado! Não dava contas a ninguém de toda essa quantia! Podia tomar e esconder quanto quisesse e ninguém lhe teria dito nada! Mas ele não tirou nada e entregou ao governo o dinheiro contado até o derradeiro sou (moeda francesa da época). É quase inconcebível”.
Quantas pessoas, que exerceram ou exercem o poder por delegação dos seus contemporâneos, serão lembradas por essa virtude sublime do respeito ao dinheiro do povo?
A vasta maioria dos governantes, por circunstâncias diversas, parece não ter constrangimento algum em ver o seu nome lançado nos lixões da história, por desvios de verbas da educação, da saúde, das estradas ou de qualquer rubrica em que seja possível desviá-las.
A cultura desastrosa da corrupção é fonte geradora do inevitável empobrecimento do povo. A predisposição dos homens públicos de qualquer nação em priorizar o seu próprio interesse, em detrimento da supremacia do interesse público, resulta de um déficit absurdo de cidadania, que deve ser colocado na conta das escolas e das famílias.
Muitos dos que investem contra o dinheiro público estudaram nos “melhores”colégios e faculdades de suas cidades. Não aprenderam, porém, controlar a sua predisposição para assaltar os valores pertencentes ao poder público sob seu comando.
É uma postura doentia, que precisa ser reprimida de forma eficaz. Necessita, outrossim, ser analisada, não apenas pelos estudiosos da Ciência Política, da psicologia social, pelos juristas comprometidos com a própria finalidade do Direito, mas, sobretudo, pelos educadores.
Uma resposta precisa ser dada pela pedagogia, a partir de 2025: como explicar o fato de uma pessoa, após frequentar os melhores colégios e faculdades de sua cidade, não resistir ao primeiro contato com o dinheiro da população sob sua guarda? Valer-se de todas as artimanhas para dele apropriar-se, utilizando-se de laranjas, empresas fictícias, enfim, de toda criatividade para condenar os seus governados ao empobrecimento.
*Djalma Pinto
Jurista, ex-procurador-geral do Estado e autor de diversos livros, entre os quais, “Ética na Política” e “Distorções do Poder”.