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“O grande entrave social” – Por Dalton Rosado

Dalton Rosado é advogsdo. Foto: Divulgação

Com o título “O grande entrave social”, eis artigo de Dalton Rosado, advogado e escritor. “Costumo raciocinar em termos fora da lógica mercantil capitalista, livre do fetichismo da mercadoria, e é quando descortino ao nosso favor uma quantidade enorme de possibilidades materiais de interações humanas com a natureza e com o uso de toda essa tecnologia e saberes que são ganhos da humanidade, e não do capital”, expõe o articulista.

(“Tempo é dinheiro”, Benjamin Franklin)

Confira:

Costuma-se dizer que “só se faz alguma coisa com dinheiro”. É claro que essa conclusão somente é correta sob a lógica do capitalismo, porque quase todas as iniciativas de ação dependem do capital, ou seja, da mercadoria dinheiro que faz dinheiro.

Mas, paradoxalmente, a mercadoria dinheiro escasseia por conta de que é cada vez mais difícil a sua capacidade de autorreprodução graças ao critério da viabilidade econômica dos empreendimentos dos setores primário, secundário e terciário da economia(capacidade de realização lucros) precarizados pelos conflitos na concorrência de mercado e, assim, restringe-se a capacidade de ação.

É justamente por conta de um critério próprio à relação social estabelecida a partir da produção de mercadorias destinada à compra e venda, ora em depressão por conta de inúmeras contradições de forma e conteúdo que está sendo travada a produção social. Somente se faz aquilo que se compra e vende, e como há redução da capacidade de compra numa sociedade na qual tudo é mercadoria, ocorre a paralisia da produção ao nível global, ainda que tal produção se intensifique de modo concentrado em algumas regiões, como é o caso da China.

Há, simultaneamente, na economia mundial capitalista, uma conjunção explosiva de fatores próprios à explicitação das suas contradições que em síntese podem ser assim explicados por um fenômeno emblemático, qual seja:

ao mesmo tempo em que se reduz o valor das mercadorias graças ao aumento vertiginoso da produtividade da produção destas pelo uso da alta tecnologia da terceira revolução industrial (microeletrônica/cibernética), que não produz valor;
reduzem-se os salários e o volume global destes e, consequentemente, a massa de extração de mais-valia, de lucros e, por fim, da massa global de valor válido.

Decorrem do fator de base acima identificado uma série de fenômenos que somente podem ser compreendidos na sua gênese se se entender o problema estrutural, senão vejamos os mais flagrantemente perceptíveis:

– o crescente endividamento do capital privado decorre da necessidade de investimento de capital constante (instalações, equipamentos sofisticados e pesquisas) objetivando a redução de custos de produção que consiste na eliminação de capital variável (postos de trabalho abstrato, assalariado), única fonte da produção de valor novo;

– O crescente endividamento do capital estatal decorre do fato de que o Estado não produz valor, mas apenas extrai valor da economia sob a forma de impostos (muita gente entende equivocadamente que o Estado, por emitir moeda e fazer o controle desta, pode produzir valor válido) e como tem a obrigação constitucional de suprir algumas demandas sociais e institucionais que justificam a cobrança de impostos que escasseiam em face da depressão econômica (redução de valor válido, advindo da produção de mercadorias), esse endividamento caminha para a insolvência do pagamento dos juros e do principal;

– Já circula na economia mundial uma quantidade enorme de valores meramente escriturais sob a forma de padrões monetários (principalmente do dólar, moeda fiduciária) sem correspondência com a produção de mercadorias, seja por conta de capital fictício bancário cujos conteúdos são tão vazios quanto uma bolha de ar, e que num futuro não muito distante explodirá; seja pela emissão de títulos públicos que jamais serão resgatados; ou seja pelo volume de moeda sem lastro emitidas pelos Bancos Centrais dos Estados Unidos (dólar) e União Europeia (Euro);

– Continua a irracionalidade da emissão de gás carbônico na atmosfera pelo capital privado que submete os governos num conluio genocida, e que aquece a temperatura do Planeta ameaçando a sua/nossa vida animal e vegetal, cientificamente comprovada, bem como pelos fenômenos climáticos cada vez mais agressivos;

– Permanência das guerras por conquistas territoriais e hegemonias políticas, religiosas e étnicas, fruto de um retrógrado, abominável e patético poder governamental submisso ao capital na sua fase terminal, com ameaças de destruições atômicas e poderio bélico comprovado;

– Instalação da barbárie dos crimes organizados do colarinho branco e das facções (nome que se dá atualmente no Brasil às quadrilhas de bandidos assassinos), com incrustações nas instituições do aparelho de Estado; para ficarmos apenas nesses exemplos emblemáticos.

Na vida mercantil, cujo objeto é o vazio sentido da obtenção do lucro como forma de reprodução aumentada do capital, a produção de mercadorias, instrumento de sua viabilização, não tem como prioridade a satisfação das necessidades humanas, mas apenas usa tal necessidade de modo oportunista para coexistir; é por isso que o capital incinera alimentos num país faminto.

Entretanto, as contradições de sua natureza exploradora da vida humana tendem a aparecer. Na atualidade a mais flagrante delas é a tal da “viabilidade econômica” para qualquer iniciativa, seja do ponto de vista empresarial ou social. A pergunta inicial que o capital faz para qualquer empreendimento capitalista é: “o que você quer produzir é viável economicamente, ou seja, dá lucro?”; já no caso da ação social estatal se pergunta: “o Estado pode custear a implementação e sustentação com o dinheiro dos impostos” (cada vez mais comprometidos com rubricas orçamentárias obrigatórias)?

Ora, já não se produz senão aquilo que o mercado sinaliza como capaz de gerar lucros, e poucas mercadorias têm a sua produção num nível de produtividade capaz de gerar lucros, e é aí que a inviabilidade econômica dá ordens desumanas para os humanos travando a produção; é o capitalismo mostrando a sua carantonha de miséria e desigualdade social.

Tudo se processa no altar fratricida da concorrência de mercado que estabelece regras rígidas de produção e comercialização e, assim, somente sob critérios de alta produtividade e com custos baixos (mecanizados ao extremo, inclusive com robotização, programação computadorizada, e outros usos tecnológicos) é que se pode produzir uma gama variada de mercadorias, ou seja, é o mercado e sua lógica desumana a instância na qual se determina o grande entrave social da atualidade.

Costumo raciocinar em termos fora da lógica mercantil capitalista, livre do fetichismo da mercadoria, e é quando descortino ao nosso favor uma quantidade enorme de possibilidades materiais de interações humanas com a natureza e com o uso de toda essa tecnologia e saberes que são ganhos da humanidade, e não do capital.

Pergunta-se: sem a intermediação do dinheiro,

É tecnicamente possível irrigar as terras do Nordeste e enriquecer seu solo trazendo as águas abundantes do Norte do país?

É tecnicamente possível acabar com a fome no mundo produzindo para dar ao invés de produzir para vender?

É tecnicamente possível se produzir equipamentos tecnológicos (tudo que já conhecemos) que nos auxiliem na produção, com menor esforço físico, sem a intermediação do capital?

É tecnicamente possível se criar um ambiente em que os indivíduos sociais não sejam adversários entre si na busca do dinheiro, mas solidários e de modo a que cada semelhante seja apoio do outro?

É possível que o prodigioso saber adquirido pela humanidade nos vários ramos das ciências (medicina (biologia terapêutica) e engenharia (agronômica, mecânica, civil, da computação, comunicação, etc.) seja usado em benefício da humanidade sem a intermediação do dinheiro?

Se as respostas a estas indagações e outras de iguais sentidos forem afirmativas podemos acreditar que a vida tem jeito.

*Dalton Rosado

Advogado e escritor. Participou da criação do Partido dos Trabalhadores em Fortaleza (1981), foi co-fundador do Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos (CDPDH), da Arquidiocese de Fortaleza, que tinha como Arcebispo o Cardeal Aloísio Lorscheider, em 1980.

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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