Eu sei, eu sei, as linguagens artísticas são completamente diferentes, mas, então, porque há tanto tempo existe essa polêmica de comparar a sétima arte à literatura? Eu concordo com o professor e pesquisador de literatura brasileira, Mauro Rosso, quando disse à Revista Cult que o cinema tem procurado na aproximação com a literatura uma forma de legitimar-se. Ainda segundo ele, mesmo que haja diferenças entre a página e a tela, há laços estreitos em forma de ‘mão e contramão’: a página contém palavras que acionam os sentidos e se transformam em imagens na mente do leitor. A tela, por sua vez, abriga imagens em movimento que serão decodificadas pelo espectador por meio de palavras. Entre a literatura e o cinema, há um parentesco originário, um diálogo que se acentuou sobremaneira após a intermediação dos processos tecnológicos.
O fato é que tanto o cinema quanto a literatura sabem contar boas histórias. Prova disso é o nosso queridinho “Ainda Estou Aqui”, que, aliás, inspirou-me a trazer essa polêmica para a coluna. O escritor e produtor cultural, Raymundo Netto, que nunca foge de uma boa discussão, observa que as narrativas realmente não podem (e nem devem) ser as mesmas. A questão, muitas vezes, está relacionada ao nosso sentimento e expectativa pessoal. “Quando você lê um livro que gosta muito, quer viver aquela mesma sensação no cinema. Lembrei-me de Desmundo, que eu li o livro primeiro, e, ao assistir o filme, percebi que mudaram o final, o que foi decepcionante. Já com relação ao longa Ainda Estou Aqui, é um filme impactante. Para mim, a sutileza utilizada para contar a história da família de Rubens Paiva trouxe uma leveza belíssima, pois sabemos que o que Eunice e a filha passaram foi pesadíssimo, portanto, estou na torcida pelo Oscar”, aponta Raymundo Netto.
“O livro não é melhor do que o filme, e nem o filme é melhor do que o livro. Essa é, para mim, a maneira correta de encarar essa pergunta. Isso porque cinema e literatura são artes tão diferentes. O livro apela para a imaginação do leitor, é abstrato. Apesar da descrição do autor, cada um visualiza os personagens e os cenários de um jeito próprio. Já o cinema apela para a materialização de uma visão específica. O cinema que adapta a literatura é o equivalente a pegar a visão abstrata da cabeça de um leitor hipotético – dentre milhares ou milhões de leitores – e desse às palavras que vivem livres, uma corporalidade que parece aprisionadora porque nega todas as outras possibilidades”, explica o crítico de cinema, Márcio Sallem.
O professor de cinema reconhece que esse é o tipo de armadilha que até ele já caiu quando começou na crítica, mas que hoje não entra tanto no mérito. “Claro, há teorias e estudos sobre o processo de adaptação entre mídias, mas para o espectador médio, aquela pessoa no dia a dia e que só quer assistir a um filme, não importa a origem da obra cinematográfica, importa que seja boa. Não importa se é melhor ou pior do que o livro, pois provavelmente será as duas coisas ao mesmo tempo: para um leitor, melhor; para outro, pior. O que define uma boa de uma má adaptação, no fim das contas, é o que separa um filme bom de um filme ruim”, destaca o responsável pelo perfil no Instagram @cinemacomcritica.
O fato é que hoje é dia de muita torcida \0/
E que venha o Oscar pra gente!