“O revolucionário bebim corredor” – Por Paulo Rogério

Paulo Rogério é jornalista.

Com o título “O revolucionário bebim corredor”, eis artigo de Paulo Rogério, jornalista e desportista. “Na realidade, Isaque nada mais é do que um personagem do Improvável Futebol Clube. Faz parte do grupo que surpreende e dá uma sacudida nos valores que a sociedade vai impondo sem todos se darem conta. Gente que derruba padrões e levanta questionamentos”, expõe o articulista.

Confira:

Um bebim magrelo, daqueles de barriguinha bem saliente, vestindo uma camiseta preta e uma bermuda jeans verde escura. Na cabeça, um boné amarelo com a aba para trás e calçando velhas sandálias havaianas brancas colocou em xeque o badalado mundo das corridas de rua. Isaque – esse o nome do nosso personagem – invadiu uma prova oficial e conseguiu, em poucos metros de asfalto, derrubar teorias de desempenho, biomecânica, nutrição e anatomia.

O que seria somente mais um doidinho embriagado invadindo um evento esportivo, o que não seria novidade, virou um fenômeno da mídia. Não só pelo inusitado fato de correr todo destrambelhado entre os atletas de elite da cidade, graças ao alto teor alcoólico ingerido na noite anterior. Mas também pela façanha deste morador de Garrafão (nome bem sugestivo) do Norte (PA) ter liderado boa parte da prova de 8 km e terminado na frente de muita gente que investe alto em tênis caros, roupas especiais, óculos baixa tempo, cronômetros de última geração, géis, treinos.

Enfim, uma infinidade de badulaques tecnológicos malucos que, de repente, pareceu inútil diante daquela carreira desengonçada. E vencedora. Mesmo sem ser o primeiro colocado. Isaque – nome de personagem bíblico – o que não tem nada a ver, tornou-se exemplo de superação, de que há esperança entre os homens. Sem querer, ele virou herói. E isso porque disse ter corrido somente para acabar com a ressaca. É o Forrest Gump tupiniquim!

Um sobrinho meu participa dessas assessorias esportivas que usam a Beira Mar como sede própria. Três vezes por semana ele está lá no calçadão, bem cedinho. Paga R$ 250 mensais pela “carreira” assistida. Ele e dezenas de outros atletas. Corre do Aterro da Praia de Iracema até o Mucuripe. Vai e volta umas duas vezes. Outro dia saiu atrasado e esqueceu o celular em casa. Foi o suficiente para abortar o treino.

– Como ia saber meu tempo? E vou correr sem música no ouvido? Não dá. Tem que ter o som para correr direito, no ritmo”, disse ele. E foi embora sem treinar. Lamentou-se o resto da semana e culpou a falta no treino pelo resultado ruim na prova de domingo. Ora, o Isaque provou que não precisa nada disso. Não nesse exagero que muita gente adotou como o correto, como o padrãozinho. Um estereótipo levado à público no PDF que viralizou nas redes sociais, revelando as chacotas – via whatsApp – produzidas por um quarteto de especialistas da área contra colegas corredores.

Na realidade, Isaque nada mais é do que um personagem do Improvável Futebol Clube. Faz parte do grupo que surpreende e dá uma sacudida nos valores que a sociedade vai impondo sem todos se darem conta. Gente que derruba padrões e levanta questionamentos. Não com palavras, mas atitudes concretas. Pessoas que não estão nem aí para o que todos pensam. Gente que vai lá e faz. Não são robôs.

Ah, se tivéssemos mais surpresas como essa! O mundo seria menos chato e previsível.

*Paulo Rogério

Jornalista

paulorogerio42@gmail.com

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Uma resposta

  1. E viva os isaques da vida, para curar a ressaca do mundo, chato, triste, porque previsível. Parabéns pelo artigo, Paulo Rogério!

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