Categorias: Artigo

“O riso criminalizado e a crise da liberdade no Brasil” – Por Valdetário Monteiro

Valdetário Monteiro é advogado

“A liberdade de expressão não existe para garantir o discurso confortável, mas sim para preservar o espaço do dissenso – inclusive o de mau gosto”, aponta o advogado Valdetário Monteiro

Confira:

A recente condenação do humorista Léo Lins a oito anos de prisão, somada a quase R$ 2 milhões em indenizações, por piadas consideradas preconceituosas, não é um mero exagero judicial — é a expressão mais contundente de um fenômeno perigoso: a transição da liberdade para o medo no Brasil contemporâneo.

Sob o pretexto de proteger grupos vulneráveis, o Estado brasileiro tem cedido à tentação de tutelar a linguagem e punir o incômodo. A chamada Lei nº 14.532/2023, ao prever agravamento da pena para ofensas proferidas com “intuito de diversão”, subverte os fundamentos liberais da democracia. Em vez de reconhecer o espaço da arte e da sátira, essa norma transforma o riso em agravante — e o artista, em réu.

Essa é a tragédia institucional: em nome de boas intenções, armam-se mecanismos de censura. A criminalização do discurso irônico, crítico ou provocativo desnatura o papel do Direito Penal, que deve ser o último recurso do Estado — e não seu instrumento para moldar comportamentos morais ou garantir zonas de conforto emocional.

O humor, por definição, lida com ambiguidades, distorções e exageros. Ele incomoda, desafia, subverte. E é precisamente por isso que deve ser protegido. A liberdade de expressão não existe para garantir o discurso confortável, mas sim para preservar o espaço do dissenso – inclusive o de mau gosto. Silenciar esse espaço é transformar o Judiciário em juiz de valores, e não de direitos.

A sentença contra Léo Lins ocorre num cenário mais amplo: censura a livros, intimidação de jornalistas, projetos de controle sobre as redes sociais e interferências do Judiciário sobre a linguagem pública. É um ambiente que sinaliza para o crescimento do Estado paternalista, que infantiliza o cidadão e retira dele a autonomia de julgar ideias por si mesmo.

Como afirmou o filósofo Ronald Dworkin, respeitar a liberdade de expressão é tratar cada indivíduo como agente moral autônomo. Já John Stuart Mill advertia: até a opinião absurda precisa ser ouvida, porque sua existência ajuda a sociedade a amadurecer no confronto de ideias.

Democracias não podem se comportar como teocracias do politicamente correto. Não é com prisões que se combate o preconceito, mas com educação, debate e refutação. O Estado que pune o riso não protege ninguém — apenas projeta sua própria fragilidade institucional.

É tempo de rever essa deriva repressiva. Não há justiça onde o humor é tratado como crime. E onde o riso é proibido, o pensamento também está em risco.

Valdetário Andrade Monteiro é advogado, conselheiro federal da OAB, ex-conselheiro do CNJ e ex-presidente da OAB Ceará

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

Esse website utiliza cookies.

Leia mais