Com o título “O tempo em mim abraça o futuro”, eis título desta crônica de Suzete Nocrato, jornalista e mestre em Comunicação Social pela Universidade Federal do Ceará. “Na maturidade, descobri a alegria de partilhar caminhos, vivências e aprendizados com queridas amigas, reunidas em dois grupos distintos — diferentes em histórias, mas unidas por algo essencial: somos todas mulheres 60+”, expõe a articulista.
Confira:
O nascimento da minha neta abriu um espaço de silêncio dentro de mim, onde a introspecção e a saudade me abraçam com ternura. Vasculho os diversos álbuns de fotografias que guardam histórias da família. Talvez buscando a jovem sem marcas das lutas travadas, o olhar firme e determinado, os cabelos desalinhados e sedosos. Nas memórias do coração, revivo os sonhos, encantamentos, destemor, beleza, amor.
Vivi minha juventude com a alma aberta, em plenitude. Entre o meu — sempre meu — Saboeiro, a vibrante Fortaleza e tantos outros destinos que cruzaram meu caminho, nas viagens através dos livros e no caminhar por destinos turísticos e longínquos vilarejos. Viajo movida por uma paixão antiga, que nasceu ainda na infância. Foi um presente generoso da vida, permitido e cultivado pelos meus pais, que me abriram as portas do mundo.
Na maturidade, descobri a alegria de partilhar caminhos, vivências e aprendizados com queridas amigas, reunidas em dois grupos distintos — diferentes em histórias, mas unidas por algo essencial: somos todas mulheres 60+.
A condição de bordar memórias através de minha neta e, fazer o meu colo um porto, não me reduz — me amplia. Sou inteira no agora, vivendo o tempo que em mim abraça o futuro. Sou vibrante, ativa e com muita energia para queimar — e sem pressa de desacelerar.
Minhas amigas, dos dois grupos, também seguem neste compasso. Algumas estão aposentadas, mas continuam envolvidas em mil projetos pessoais e profissionais. Outras ainda trabalham e não cogitam parar. Há avós como eu. Uma delas, com o coração já se preparando para ser bisavó. Outras ainda sonhando com essa dia que há de chegar. Três delas vestem, com ternura e coragem, o papel silencioso de tia-mãe.
Estamos em tantos lugares, sem ordem exata. Somos movidas pela força do amor, do desejo de aprender, da curiosidade que não adormece. Somos, apenas… somos — e isso basta. Somos a escolha diária de viver enquanto estamos vivas. Somos poesia e presença, medo e coragem, o ser e o ter. Cada uma a seu tempo, descobrindo, redescobrindo, amando e sendo amada, desejando e desejada.
Às vezes, confesso, o corpo reclama — sinaliza pausas. Parece cansado de correr atrás de algo que outros tentam agarrar. Esse corpo, já tantas vezes visto, só quer ser desvisto — livre de exigências, pressões, padrões.
Nos encontros, sempre fazemos questão de registrar o instante. Em um deles, ao olhar a foto recém-tirada, um amiga riu e disse:
— “Estamos bem”.
E eu respondi, sem pensar:
— “Parecemos mulheres de 40…”. Pensei: livres e carregando uma paz que a juventude
ainda busca.
E, assim, seguimos com marcas no rosto que contam histórias, com olhos que ainda brilham de curiosidade e o coração disposto a recomeçar. Não somos mulheres que pararam no tempo. Desafiamos o tempo. Que vivem com prazer, que se reinventam, que não se encaixam em estereótipos.
Somos inteiras, presentes, e plenamente vivas. Com experiências que não pesam — inspiram. Nossas experiências não são muros, mas pontes.
*Suzete Nocrato
Jornalista e Mestra em Comunicação pela Universidade Federal do Ceará.
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A Susete mantém sua mente sã que reflete na sua criatividade poética e vida plena.