“O Dia de Todos os Santos foi declarado dia santo de guarda, ou seja, data em que os fiéis são convidados a participar da Santa Missa e a suspender trabalhos servis, dedicando o tempo à oração e à contemplação do exemplo dos santos”, aponta o jornalista e poeta Barros Alves
Confira:
Ontem, a Igreja Católica celebrou em todas as paróquias do planeta, a Festa de Todos os Santos, lembrança litúrgica anualmente rememorada em 1º de novembro, no Calendário Gregoriano. Trata-se de uma das solenidades mais antigas e importantes do calendário católico. Tem como objetivo honrar todos os santos e santas, conhecidos ou anônimos, que alcançaram a glória do Céu e participam da comunhão dos santos.
A devoção aos santos remonta aos primeiros séculos do cristianismo, quando as comunidades celebravam a memória dos mártires, homens e mulheres que deram a vida pela fé. Com o passar do tempo, o número de mártires cresceu tanto que se tornou impossível dedicar um dia específico a cada um. Surgiu, então, a ideia de uma festa comum para todos os santos.
Acredita-se que o primeiro registro dessa celebração tenha ocorrido em Antioquia, no século IV. No entanto, foi em Roma que a festa ganhou caráter universal. O Papa Bonifácio IV, por volta de 609 ou 610 a.D, consagrou o antigo Panteão romano, um templo dedicado a todos os deuses, à Virgem Maria e a todos os mártires, instituindo o dia 13 de maio como data da comemoração.
Mais tarde, no século IX, o Papa Gregório IV transferiu a festa para o 1º de novembro, provavelmente para coincidir com antigas celebrações agrícolas europeias, transformando-as num louvor cristão à colheita espiritual dos santos. A partir daí, o dia passou a ser observado por toda a Igreja do Ocidente.
O Dia de Todos os Santos foi declarado dia santo de guarda, ou seja, data em que os fiéis são convidados a participar da Santa Missa e a suspender trabalhos servis, dedicando o tempo à oração e à contemplação do exemplo dos santos. O Papa Urbano IV e, mais tarde, Papa Sixto IV, reforçaram a importância da solenidade e incentivaram a veneração conjunta dos santos como expressão da unidade do Corpo Místico de Cristo.
O Concílio Vaticano II (1962–1965), ao falar da vocação universal à santidade na constituição “Lumen Gentium”, reafirmou o sentido profundo desta festa: todos os batizados são chamados à santidade, não apenas alguns escolhidos.
Celebrar Todos os Santos é celebrar a vitória da graça de Deus na vida humana. É um convite à esperança, pois mostra que a santidade é possível em todas as condições de vida. Como afirmou São João Paulo II, “a solenidade de Todos os Santos recorda-nos que a Igreja é essencialmente comunhão de santos, e que cada fiel é chamado a essa comunhão”.
Assim, a festa é, ao mesmo tempo, memória, louvor e compromisso: memória dos que já alcançaram o Céu, louvor a Deus que opera maravilhas em seus servos e compromisso de seguir o mesmo caminho de amor e fidelidade.
Portanto, importa afirmar que a Festa de Todos os Santos une a Igreja da Terra, a do Céu e a do Purgatório num só cântico de glória, reafirmando a comunhão dos santos e o chamado universal à santidade que atravessa os séculos e permanece atual em cada geração cristã.
A celebração de Todos os Santos antecede a que honra a memória dos Fiéis Defuntos, celebrada pela Igreja Católica no dia 2 de novembro, e constitui uma das expressões mais belas da fé cristã na comunhão dos santos e na esperança da ressurreição. Popularmente conhecida como Dia de Finados, esta data convida os fiéis a rezarem por todos os que já partiram desta vida, especialmente pelas almas do purgatório.
A prática de rezar pelos mortos remonta aos primeiros séculos do cristianismo e tem raízes bíblicas, como no livro dos Macabeus (2Mc 12,44-46), onde se afirma que “é um santo e salutar pensamento rezar pelos mortos, para que sejam livres de seus pecados”. Os cristãos primitivos celebravam a Eucaristia sobre os túmulos dos mártires, pedindo a Deus que os recebesse em Sua glória e intercedessem pelos vivos.
A instituição de uma data específica para a comemoração de todos os fiéis defuntos deve-se ao abade São Odilon de Cluny (†1049), que, no ano 998, ordenou que em todos os mosteiros beneditinos ligados a Cluny se celebrasse, no dia seguinte à Festa de Todos os Santos, uma missa e orações pelos mortos. Essa prática se difundiu rapidamente por toda a cristandade, sendo adotada em Roma por volta do século XIII.
O Dia de Finados não é um dia santo de guarda no sentido canônico, ou seja, não é de preceito obrigatório, mas a Igreja sempre incentivou fortemente sua observância devota. A tradição de visitar os cemitérios, acender velas e rezar pelos falecidos expressa a fé no poder da oração e dos sufrágios em favor das almas do purgatório.
O Papa Leão XIII (século XIX) escreveu sobre a necessidade de rezar pelos mortos, lembrando que “a caridade cristã não se limita à terra, mas se estende ao além-túmulo”. Já o Papa Bento XV, em 1915, concedeu aos sacerdotes o privilégio de celebrar três missas no Dia de Finados: uma pela intenção de todos os fiéis defuntos, outra pelo Papa e outra conforme a intenção do celebrante, privilégio que permanece até hoje.
Mais recentemente, o Papa João Paulo II e o Papa Francisco destacaram o caráter de esperança da celebração. João Paulo II afirmava que “rezar pelos defuntos é reconhecer que o amor é mais forte que a morte”, enquanto Francisco recorda que “a memória dos mortos renova em nós a certeza de que ninguém está perdido para para sempre.”
A celebração dos Fiéis Defuntos está profundamente ligada à fé na ressurreição de Cristo. Ao rezar pelos mortos, os fiéis testemunham que a morte não é o fim, mas uma passagem para a vida eterna. A Igreja, unida em oração, intercede para que as almas em purificação sejam acolhidas na visão beatífica de Deus.
Além disso, a data ensina que a vida deve ser vivida na perspectiva da eternidade. O Catecismo da Igreja Católica (n. 1032) reafirma que “desde os primeiros tempos, a Igreja honra a memória dos defuntos e oferece sufrágios em seu favor, sobretudo o sacrifício eucarístico”. O Dia de Finados é, portanto, uma celebração de fé, caridade e esperança. Ao lembrar e rezar pelos falecidos, a Igreja reafirma a comunhão que une os vivos e os mortos em Cristo, e proclama a certeza de que “se morremos com Ele, com Ele viveremos” (2Tm 2,11). É um convite a contemplar o mistério da vida eterna e a viver cada dia com o olhar voltado para Deus, Senhor da vida e da morte.
Barros Alves é jornalista e poeta