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“Os EUA estão perdendo com as tarifas de Trump” – Por Cândido Vaccarezza

Cândido Vaccarezza é médico e ex-deputado federal

“O atual momento abre um espaço imenso para o Brasil, inclusive para identificarmos as nossas insuficiências”, aponta o médico Cândido Vaccarezza

Confira:

Desde 20 de janeiro deste ano, menos de 7 meses de governo Trump, ao lado das confusões criadas com o anúncio do desejo de transformar o Canadá em um Estado americano, a cobiça sobre a Groenlândia, o afã de ampliar, ainda mais, o fluxo de capital do mundo para os EUA e a afirmação da supremacia do “império americano” por sobre os demais países, o presidente americano estabeleceu, a torto e a direito, sobre taxações, sem respeitar nenhuma base econômica ou a práxis do comércio mundial amadurecido nas últimas décadas. (https://www.brasil247.com/blog/trump-anuncia-taxacao-ao-brasil-e-ameaca-o-mundo).

Temos assistido manifestações de todos os matizes no Brasil, desde apoiadores dos EUA, passando pelos que, com medo de Trump, acham que deveríamos ceder, não sabemos o que nem até quando, até os radicais que acham que o Brasil pode e deve enfrentar, de “peito aberto”, os americanos em qualquer situação. Já declarei que de uma maneira geral, a meu ver, o governo federal vem acertando, em que pese um discurso ou outro fora do lugar. Dada a nossa posição na geopolítica mundial, temos de buscar sempre a negociação, manter a nossa autonomia, procurar aliados dentro e fora dos EUA e, em relação a guerra fria já estabelecida, não deveremos nos descolar do ocidente, nem estabelecer alinhamentos automáticos com os EUA ou com a China; não é uma equação fácil. O BRICS, o PIX e a redução paulatina do dólar como moeda de referência para as trocas internacionais são opções irreversíveis, demandarão medidas futuras que certamente desagradarão a quem se desenvolve às custas do subdesenvolvimento de outros países. Tomemos como um simples exemplo a situação da maior operadora de cartões de crédito do mundo, a Visa apresentou seu balanço do terceiro trimestre fiscal em 29/07/25: 10,2 bilhões de dólares de faturamento e 5,3 bilhões de lucro líquido. Em apenas trimestre, mais de 10 bi de faturamento e mais da metade deste valor de lucro líquido para uma bandeira de cartão de crédito, é um desaforo. Isso é possível porque um estabelecimento comercial ao cobrar uma conta, parte vai para o adquirente ou credenciador, o dono da maquininha, este repassa uma fração para o banco que emitiu o cartão e outra para a bandeira Visa. Tudo isto à velocidade da luz e sem nenhum funcionário ou despesa extra, ao apertar o botão da maquininha, em qualquer lugar do mundo, o dinheiro cai na conta dos principais acionistas, BlackRock, Inc; Bank of America Corporation e State Street Global Advisors, Inc; até 2008 era principalmente para o JPMorgan Chase. Imagine o fluxo permanente de transferência de renda de todos os países do mundo para os EUA, somente na operação da bandeira de cartões Visa. Agora imagine que os EUA podem emitir a quantidade de dólares que precisar para financiar a sua dívida, superior a 37 trilhões de dólares, sua emissão de moeda virtual ou física é corresponsabilizada involuntariamente pelos bancos centrais do mundo, pois a moeda para transação comercial internacional é o dólar e os títulos da dívida americana são ativos comprados mundo afora; aqui está uma perna da hegemonia americana, que lhe permite manter, entre outras coisas, as centenas de bases militares no globo terrestre. Portanto, são injustas com o mundo as cobranças econômicas feitas por Trump e a forma como ele tem agido abre espaço para desarranjo comercial internacional, para a corrida armamentista e para a beligerância entre nações, além de desmoralizar os organismos internacionais e prenunciar uma crise profunda internacional. Neste quadro os EUA são os maiores perdedores. Acredito, no entanto, que Trump não terá tempo e nem força para desmantelar o mundo, o sistema de contra-pesos da democracia americana, com as eleições de novembro de 26, a justiça e a pressão interna das grandes corporações dos EUA tratarão de segurar a “fera”. Em relação às tentativas de intervenção na política interna do Brasil, as punições ao ex-presidente Bolsonaro, a regulamentação das big techs e as punições a políticos e magistrados não são assuntos de Trump, cabe ao parlamento, à justiça e ao povo brasileiro decidirem.

Nesta movimentação de Trump contra o Brasil os EUA terão mais problemas e, no médio prazo, Trump perderá. Apesar de toda valentia pré anunciada, sobretaxou somente 50% das exportações brasileiras e nesta semana aceitou o pedido de consulta feito pelo Brasil, apresentado à delegação dos EUA, na semana passada para discutir o tarifaço no âmbito da Organização Mundial de Comércio (OMC).

Eles “piscaram” primeiro e têm suas razões. A poderosa Câmara de Comércio dos EUA (US Chamber of Commerce) alertou a Casa Branca sobre os riscos para os Estados Unidos da taxação em 50% de produtos brasileiros. A inflação para produtos como a carne, café e outros produtos já está fora de controle e, o que é pior para eles, a Índia a China ensaiam aproximações, os BRICS se consolidam a cada anúncio e os países ocidentais, mesmo os grandes europeus, ao mesmo tempo que negociam com Trump, buscam escapar do seu domínio. O Brasil ampliou, nos últimos 15 meses, em 105 novos mercados de 50 países para carne brasileira e o nosso café sofrerá muito pouco com a taxação, pois tem mercado no mundo. Nenhum país poderá em uma década substituir a produção do agro Brasil. Trump, em um dos seus arrojos, disse: a China pode comprar 4 vezes mais soja dos EUA do que faz hoje, visava atingir ao Brasil e a própria China; os produtores de soja americanos, gostaram da ideia, parte dos desinformados do Brasil ficaram receosos… O problema é o advérbio de modo: como? Primeiramente, a China não se arriscaria a ficar dependente da soja americana; em segundo lugar, como os EUA vão quadruplicar a sua venda de soja à China? Só se importarem um volume imenso do Brasil, esta é uma ideia tosca e risível.

É certo que, se perdurar esta situação, vamos sofrer um pouco, pois os EUA são o segundo maior parceiro comercial do Brasil, são o destino de muitos produtos industrializados brasileiros e deles importamos máquinas, tecnologia e combustíveis; porém, ao colocarmos na balança geral, dados recentes indicam que o comércio internacional total do Brasil significa 31% do PIB brasileiro e que as exportações para os EUA representou em 2024 apenas 12% do total exportado por nosso país, o que representa menos de 3% do nosso PIB. Sabemos que o problema não é só econômico, é uma disputa de caráter mundial e o presidente Trump não está interessado em nenhuma ideologia ou democracia, visa atingir a China, que cresce mais do que os EUA e, na sua visão, os têm ameaçado. Não é à toa que Trump, afrontando a Europa, convida Vladimir Putin para uma visita aos EUA, o recebe com aplausos e tapete vermelho e humilha a Ucrânia, que enfrenta uma guerra por procuração europeia em defesa dos territórios invadidos pela Rússia.

O atual momento abre um espaço imenso para o Brasil, inclusive para identificarmos as nossas insuficiências. Se o mundo resolvesse dobrar o comércio com o Brasil não poderíamos atender, pois apesar de termos como crescer rapidamente, diferente dos demais países, apontamos o nosso foco nas últimas décadas para uma agenda retrógrada, descolada dos interesses nacionais. Vejamos o que polariza os debates: mudança climática, sob a ótica do ambientalismo fundamentalista e antinacional, 8 de janeiro, privatizações e por aí vai… A agenda para o Brasil crescer, distribuir renda e ocupar um outro lugar no mundo deveria ser: educação, desenvolvimento e redução da pobreza. O Brasil tem a maior fronteira agrícola do mundo, precisa ser liberada e incentivada, temos condições de gerar energia elétrica em quantidade maior do que qualquer país, petróleo, minerais e as terras raras; precisamos que destravar a exploração dessas riquezas, inclusive na amazônia, protegendo e compensando a floresta, como sabemos fazer mais do que qualquer país. Este é o caminho para viabilizarmos a nossa poupança interna e termos recursos para desenvolvermos um portentoso programa capaz de dotar o Brasil de educação de qualidade, reduzir a pobreza, resolver a infraestrutura com um outro modal de transportes, com gasodutos, oleodutos, estrada de ferro, portos e aeroportos, tecnologia aeroespacial, inteligência artificial, novas tecnologias de produção e demais avanços que o Século XXI nos possibilita.

Tenho dito: O Brasil tem Jeito.

Cândido Vaccarezza é um médico e político formado pela Universidade Federal da Bahia e atualmente mora em São Paulo. Ele tem especializações em ginecologia e obstetrícia, saúde pública e saúde coletiva. Durante a pandemia, foi diretor do Hospital Ignácio P Gouveia, referência para o tratamento de Covid na Zona Leste de São Paulo. Como político, ele participou da luta pela democracia no Brasil na década de 1970 e foi deputado estadual e federal pelo PT. Além disso, ele também foi líder na Câmara do Governo Lula e Dilma e secretário de esporte e cultura em Mauá.

Eliomar de Lima: Sou jornalista (UFC) e radialista nascido em Fortaleza. Trabalhei por 38 anos no jornal O POVO, também na TV Cidade, TV Ceará e TV COM (Hoje TV Diário), além de ter atuado como repórter no O Estado e Tribuna do Ceará. Tenho especialização em Marketing pela UFC e várias comendas como Boticário Ferreira e Antonio Drumond, da Câmara Municipal de Fortaleza; Amigo dos Bombeiros do Ceará; e Amigo da Defensoria Pública do Ceará. Integrei equipe de reportagem premiada Esso pelo caso do Furto ao Banco Central de Fortaleza. Também assinei a Coluna do Aeroporto e a Coluna Vertical do O POVO. Fui ainda repórter da Rádio O POVO/CBN. Atualmente, sou blogueiro (blogdoeliomar.com) e falo diariamente para nove emissoras do Interior do Estado.

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