Com o título “Para o Sertão Ser Tão Bom”, eis artigo de João Teles, professor e historiador. Ele coemora as boas chuvas se registram no Ceará
Confira:
Hoje o sertão está todo verdinho. Tem fava, feijão, milho, melancia, mandioca, maxixe… Ou vão chegar logo, logo. O inverno é um refrigério: acalma, acalenta, apascenta. Traz o alimento e a água de que precisa o rurícola, para esquecer que existem “os homens grandes, que moram longe”. Que aliás, pouco aparecem no sertão. E, quando aparecem, é com um peditório de votos danado e com as mãos abanando. Pouco ou nada trazem de bom. Assim vive o homem do campo, agora sob o bálsamo da quadra chuvosa.
Sobre esse território tão importante para as nossas memórias físicas e sentimentais, diz esse poeta:
“Sertão do teiú/Da cobra-serpente/Da lua, do sol/Aquele inclemente/Onde o lavrador/Vai e deita a semente!//Sertão da moçoila/Menina morena/Que sorri e bebe/Na cuia terena/Que namora muito/Na rede, serena!//Sertão do cavalo/Do homem valente/Que pega na ponta/Do touro, temente/Mas leva pra casa/O bicho, contente!”
Esse é o interland, que nutre e inspira compositores, poetas, cantadores, atores, violeiros e escritores, de todo tipo. Que são os menestreis, que cantam nossas belezas. Gente que leva para a música, para o cordel, para os palcos e para os livros, toda nossa riqueza cultural, da base cabocla e interiorana. O rico interior, de gente valente e valorosa continua lá, abandonado ou não. Se os senhores das eleições chagarem com seus palanques, bem; se não, o campo continua produzindo, normalmente.
Aliás, a maior produtividade do sertão acontece sem o azeite oficial, este, sempre distante e de pouca monta, quando aparece. E isso não significa praguejar aqui contra a política partidária. Quer dizer, reconhecer que ela sempre abandona as pessoas, envergonha, decepciona e humilha. Na seca ou no inverno, nosso povo vive a sofrer, como bem retrata a Literatura patativiana. Somos um povo que sofre e sofre muito.
E como disse, no começo deste cavaco, é um povo que tem alegria e entusiasmo, quando o período invernoso avizinha-se, porque é nele que o rio e o açude enchem, as grotas abarrotam-se e a passarada canta feliz, fazendo o homem do sertão, que muitas vezes, só tem a água do pote, viver tempos felizes, mesmo que na boca, só tenha nela os dentes que adquiriu, no odontólogo, como diz na Crônica de Stanislaw Ponte Preta, A Velhinha Contrabandista; mas esta é outra história!
*João Teles de Aguiar
Professor e historiador, integrante do Projeto Confraria de Leitura.